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Quando a floresta vale mais em pé

Iolane Tavares decidiu trabalhar com os sabores da Amazônia numa época em que a moda era consumir produtos importados. Não foi fácil. Mas associando sabor, estética e o imaginário da floresta, a Frutos da Amazônia apostou no respeito ao produtor e ao meio ambiente, e provou que é possível manter um modelo de negócios em que todos ganham: a empresa, a sociedade e a natureza.

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Basta uma espiada rápida no e-commerce da Frutos da Amazônia para os olhos se encherem de cores e a imaginação, de sabor. Entre biscoitos, geleias e bombons de taperebá, graviola e outros recheios brasileiríssimos, é possível enxergar a floresta por outra perspectiva: aquela em que ela vale mais em pé do que no chão. Se hoje essa brasilidade toda está em alta, Iolane Tavares é prova de que nem sempre foi assim. Quando fundou a Frutos na década de 1990, a abertura econômica fez quebrar por aqui a onda dos produtos importados. Entre chocolates suíços e latas de biscoitos finos, bombons de cupuaçu não tinham vez. Mas ela persistiu, ainda bem. Vinte e cinco anos depois, a Frutos da Amazônia continua expandido sua atuação, promovendo também o desenvolvimento sustentável das comunidades ribeirinhas e cooperativas que manejam a floresta sem degradá-la. Confira a seguir a entrevista que Iolane Tavares concedeu a HSM Management.

**1. Você contou que começou fazendo bombons com frutos da Amazônia por hobby. Quando e por que o hobby virou negócio?**

Quando cheguei em São Paulo nos anos 1990, iniciei com amigas uma produção caseira de bombons só como passatempo. Eu sentia saudades dos sabores da minha terra, que é Belém do Pará, e não encontrava no mercado local produtos que utilizassem os ingredientes daquela região. Esse vínculo afetivo e cultural, aliado à oportunidade de explorar essa riqueza de sabores, me levou a criar a Frutos da Amazônia em 1994.

**2. O que levou você a trabalhar diretamente com comunidades de Belém do Pará?**

Sou assistente social e essa minha formação me levou a trabalhar com as populações tradicionais da região, tais como as mulheres que trabalhavam quebrando castanhas nas usinas, e também com comunidades ribeirinhas.

**3. Como foi o início do negócio? As pessoas se mostravam abertas a provarem sabores diferentes?**

O início foi muito difícil, pois ninguém conhecia as frutas da região e, muitas vezes, se recusavam até mesmo a experimentar os produtos. Para completar, o mercado estava voltado para produtos importados por conta da recente abertura a importação. Tive que remar muito contra a maré e também me adaptar. Na época, foquei a produção na linha de biscoitos de castanha-do-pará, pois as barreiras eram muito menores.

**4. Em que momento esse jogo mudou? Na sua percepção, quando e por que os produtos locais passaram a ser valorizados?**

No ano 2000, com as comemorações dos 500 anos da descoberta do Brasil, teve início um movimento de revalorização da nossa cultura, dos nossos valores e, consequentemente, dos produtos que trouxessem essa brasilidade. Em paralelo, ganham força as questões ligadas ao meio ambiente, e os olhares se voltam para a Amazônia.

**5. Por que empreender um negócio com uma relação tão forte com o meio ambiente e apelo sustentável?**

Meu objetivo sempre foi oferecer o verdadeiro sabor da Amazônia, conservando o que há de mais precioso nela: a floresta. Criei uma linha de bombons recheados com açaí, cupuaçu, graviola e taperebá. Além disso, temos biscoitos, geleias e alguns itens sazonais, que buscam associar sabor e estética ao imaginário da floresta Amazônica. Para tornar tudo isso realidade, eu preciso me relacionar com pequenas cooperativas de agricultores, artesãos e ceramistas, a fim de construir uma identidade única para o produto final. Como já mencionei, tenho vínculos afetivos e culturais com a região e acredito que uma das formas de preservação é comendo seus frutos e, dessa maneira, ajudar a manter a floresta em pé. Foi uma escolha natural para mim, pois vivi os problemas que afetam a região.

**6. Quais são os impactos sociais, ambientais e econômicos gerados pela Frutos da Amazônia?**

Apesar de a Frutos da Amazônia ainda ser um pequeno negócio, nosso impacto é positivo na economia dos povos da floresta, pois compramos nossos principais insumos de pequenos agricultores cooperativados, de artesãos ribeirinhos, que confeccionam nossas embalagens, e de ceramistas, que elaboram peças que resgatam a arqueologia da Amazônia. Um modelo de negócio em que todos ganham: a comunidade, a empresa e a natureza.

**7. Você comentou que a Frutos da Amazônia une três pilares: sabor, estética e imaginário da floresta. Como isso se manifesta nos produtos de vocês?**

A Amazônia tem uma variedade de frutas com sabores muito particulares, o que proporciona uma experiência sensorial única. Mas ela vai além dos sabores. A floresta também é uma plantação de símbolos, o que permitiu agregar às embalagens uma comunicação visual que refletisse a estética e os elementos do imaginário da região, das encantarias que povoam o universo profundo da Amazônia, como a lenda do curupira, do pássaro Uirapuru, do boto, entre outros. É por isso que, além de ser gostoso, nosso produto precisa ser belo e carregar na alma a riqueza encontrada em nossa floresta.

**8. Qual o seu sonho para a Frutos da Amazônia? Até onde você acredita que a sua empresa pode chegar?**

Meu sonho é levar a Frutos da Amazônia para outro patamar. O desafio será alavancar o crescimento da empresa sem afetar o propósito que norteia toda a sua história: respeitar a natureza e encantar o paladar. Já fizemos exportações, e em todas as rodadas de negócio e interações nas feiras internacionais fica claro o apelo que o produto e a marca têm para se tornar global. Como dizem: se é para sonhar, vamos sonhar grande!

**9. Quais conselhos você daria para outros empreendedores que desejam atuar em negócios sustentáveis?**

Construir uma cadeia confiável de fornecimento e de relacionamento para que todos ganhem é fundamental, mas tenha claro que isso não é romance. É preciso ter competitividade e dar lucro como qualquer negócio. .

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