#TBT, TBT HSM Management

Ray Kurzweil: ele não se diz futurista, mas prevê o futuro como poucos

Para o inventor, a prática do futurismo é que nos permite ter bom “timing”, justamente o maior fator de sucesso
Adriana Salles Gomes é diretora-editorial de HSM Management.

Compartilhar:

“Se der 30 passos linearmente, você chega ao outro canto da sala. Se der 30 passos exponencialmente, vai parar na África.” Com essas aspas, eu começava, numa HSM Management de dez anos atrás, uma entrevista exclusiva com o inventor e empreendedor Ray Kurzweil sobre a aceleração que então vivíamos e seus efeitos.
Kurzweil ficou inicialmente conhecido por suas previsões “extravagantes”, como a de que o homem acabará se tornando um cyborg (a singularidade) e a de poderemos viver para sempre. Mas boa parte do futuro que ele antecipa, descrito em livros como The Age of Intelligent Machines, A era das máquinas espirituais e A singularidade está próxima, está virando realidade. Esse ex-hippiecriou um sistema de previsão próprio – a lei dos retornos acelerados, que aplica lei de Moore a quase tudo –, e acerta bastante.

Outra característica de Kurzweil é colocar a “skin in the game”. O inventor empreende em cima do que prevê e é cobaia das próprias previsões (vem se alterando biologicamente para evitar a morte por causas naturais). Ele também se expõe ao escrutínio público quando faz uma aposta no site longbets.org sobre o ano em que o computador vai se fazer passar por um ser humano – 2029. Mais uma exposição pública ocorreu quando Kurzweil cofundou a Singularity University, em 2007, passando a compartilhar seus futuros sistematicamente.

## O que kurzweil disse em 2011
– __Trabalho:__ o grosso acabará cabendo às máquinas, e é o lógico a fazer, porque a capacidade delas de armazenar dados e processá-los segundo padrões predefinidos é muito maior que a nossa. Os seres humanos passarão a maior parte do seu tempo de trabalho aprendendo e criando.
– __Países ricos e pobres:__ a revolução tecnológica ocorrerá igualmente nos países em desenvolvimento e desenvolvidos. A característica-chave da tecnologia da informação (TI) é que, no início de seu ciclo de vida, só os mais ricos a usufruem, mas, quando aperfeiçoada, fica quase grátis.
– __Educação distribuída:__ antevejo desenvolvedores de software espalhados por todos os cantos da Terra, porque os próprios gaps educacionais serão reduzidos pela tecnologia.
– __Código aberto:__ creio que nem tudo terá patente, haverá muitas tecnologias de código aberto também, em alimentação, vestuário etc. E o tempo de validade de uma patente talvez seja menor.
– __Energia:__ o custo do watt de energia solar vai cair significativamente mais do que o de carvão e petróleo. Muita coisa mudará nessa área em duas décadas [até 2031].
– __Água:__ temos de sobra; o problema é que a maior parte da água é suja e poluída. Mas, para limpá-la, basta ter energia barata.
– __Alimentos:__ dez mil anos atrás, a revolução foi a agricultura horizontal; agora, nós a verticalizaremos em fábricas computadorizadas. As carnes poderão ser geradas in vitro.
– __Vida:__ se ficássemos à mercê da natureza, morreríamos aos 20 anos de idade, e agora o limite está perto de 80. Se todo esse avanço foi aleatório, imagine o que acontecerá quando entendermos o software da vida e pudermos reprogramá-lo.
– __Medicina:__ um gene que certamente desativaremos é o que dá ordens às células de gordura para que retenham as calorias ingeridas. Já fazemos isso com ratos. Essa tecnologia esticará nossas vidas.
– __Futurismo para empreender:__ o mais importante é prestar atenção a tendências e acontecimentos para ter timing, para saber a hora de agir. A maioria das inovações não fracassa por falha do modelo de negócio e sim pelo timing errado.
– __Velocidade da mudança:__ tudo vai acontecer mais rápido do que se pensa. No século 21, não teremos 100 anos de progresso, mas 20 mil, pelo crescimento exponencial.
– __Diversidade humana:__ não ficarão todos iguais na singularidade. Ao contrário: nós já somos muito semelhantes hoje; ao nos expandirmos além dos limites da arquitetura biológica, vamos nos diferenciar ainda mais uns dos outros.
– __Adaptação:__ nosso principal problema (como humanos) ante o crescimento exponencial é o fato de que nossa intuição é linear. Temos imensa dificuldade de entender e aceitar isso, o que, consequentemente, torna nossa adaptação bem mais complexa.

## O que nós vemos em 2021
“Ele é tão louco quanto parece?”, perguntou a The Economist certa vez. É possível que sim, mas um louco que acerta bastante em suas projeções. Seu índice de acerto de previsões estava em 86% por volta de 2017. Quando os críticos apontam a previsão que deu errado, muitas vezes o erro está no prazo e não na previsão em si. Por exemplo, ele previu que, em 2009, transações seriam feitas entre homens e máquinas. Isso começa a escalar realmente agora, em 2020 e 2021, com o e-commerce, os bots, as plataformas em geral.

A forma como a previsão se confirma também pode ser sutil, ainda que sujeita a interpretações. Por exemplo, Kurzweil previu um movimento neoludista, ou seja, uma rejeição às tecnologias como houve na (primeira) revolução industrial. Ninguém tem destruído seus celulares por aí, mas movimentos como terraplanismo e antivacina não seriam uma reação ludista, contra a ciência e a tecnologia?
Depois daquela entrevista de duas horas, as ideias de Kurzweil se popularizaram muito, até as mais assustadoras. A fusão entre homem e máquina (ele crava em 2045) já é bem mais aceita, bem como sua medicina da imortalidade (em seu livro Transcend, há nove passos para viver para sempre). A dúvida é: o que ocorrerá se a lei de Moore atingir um platô, como tantos preveem?

Compartilhar:

Artigos relacionados

Organização

Saúde psicossocial é inclusão

Quando 84% dos profissionais com deficiência relatam saúde mental afetada no trabalho, a nova NR-1 chega para transformar obrigação legal em oportunidade estratégica. Inclusão real nunca foi tão urgente

Tecnologias exponenciais
No SXSW 2025, a robótica ganhou destaque como tecnologia transformadora, com aplicações que vão da saúde e criatividade à exploração espacial, mas ainda enfrenta desafios de escalabilidade e adaptação ao mundo real.

Renate Fuchs

6 min de leitura
Inovação
No SXSW 2025, Flavio Pripas, General Partner da Staged Ventures, reflete sobre IA como ferramenta para conexões humanas, inovação responsável e um futuro de abundância tecnológica.

Flávio Pripas

5 min de leitura
ESG
Home office + algoritmos = epidemia de solidão? Pesquisa Hibou revela que 57% dos brasileiros produzem mais em times multidisciplinares - no SXSW, Harvard e Deloitte apontam o caminho: reconexão intencional (5-3-1) e curiosidade vulnerável como antídotos para a atrofia social pós-Covid

Ligia Mello

6 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo de incertezas, os conselhos de administração precisam ser estratégicos, transparentes e ágeis, atuando em parceria com CEOs para enfrentar desafios como ESG, governança de dados e dilemas éticos da IA

Sérgio Simões

6 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Os cuidados necessários para o uso de IA vão muito além de dados e cada vez mais iremos precisar entender o real uso destas ferramentas para nos ajudar, e não dificultar nossa vida.

Eduardo Freire

7 min de leitura
Liderança
A Inteligência Artificial está transformando o mercado de trabalho, mas em vez de substituir humanos, deve ser vista como uma aliada que amplia competências e libera tempo para atividades criativas e estratégicas, valorizando a inteligência única do ser humano.

Jussara Dutra

4 min de leitura
Gestão de Pessoas
A história familiar molda silenciosamente as decisões dos líderes, influenciando desde a comunicação até a gestão de conflitos. Reconhecer esses padrões é essencial para criar lideranças mais conscientes e organizações mais saudáveis.

Vanda Lohn

5 min de leitura
Empreendedorismo
Afinal, o SXSW é um evento de quem vai, mas também de quem se permite aprender com ele de qualquer lugar do mundo – e, mais importante, transformar esses insights em ações que realmente façam sentido aqui no Brasil.

Dilma Campos

6 min de leitura
Uncategorized
O futuro das experiências de marca está na fusão entre nostalgia e inovação: 78% dos brasileiros têm memórias afetivas com campanhas (Bombril, Parmalat, Coca-Cola), mas resistem à IA (62% desconfiam) - o desafio é equilibrar personalização tecnológica com emoções coletivas que criam laços duradouros

Dilma Campos

7 min de leitura
Gestão de Pessoas
O aprendizado está mudando, e a forma de reconhecer habilidades também! Micro-credenciais, certificados e badges digitais ajudam a validar competências de forma flexível e alinhada às demandas do mercado. Mas qual a diferença entre eles e como podem impulsionar carreiras e instituições de ensino?

Carolina Ferrés

9 min de leitura