Sustentabilidade

Sete caminhos para a humanidade se reconciliar com o planeta

Para o filósofo Luc Ferry, desenvolvimento sustentável é uma falácia. Há outras formas de salvar o mundo em que vivemos
Colaboradora da __HSM Management__

Compartilhar:

Para Luc Ferry, não faz mais sentido falar de ecologia no singular. Na noite de 19 de setembro, em São Paulo, durante a mais recente edição do evento Fronteiras do Pensamento, o filósofo francês discorreu sobre as sete correntes filosóficas da ecologia política, tema de seu novo livro, publicado na França sob o título *Les Sept Écologies*.

Ainda sem tradução no Brasil, a obra contém análises sobre a evolução do tema ao longo dos últimos 40 anos. “Os movimentos que a reivindicam são múltiplos e opostos entre si”, argumenta.

Um dos filósofos franceses mais lidos da atualidade, ele publicou mais de 70 livros, nos quais traz as questões da filosofia para o cotidiano. Nos últimos anos, Ferry tem se dedicado a pensar nos assuntos que envolvem meio ambiente, por considerar que no mundo atual esse é o tema mais urgente e que desperta mais paixões.

“Ninguém sensato nega o aquecimento global. Sabemos que a poluição dos mares é algo grave. Então, temos que fazer algum movimento no sentido contrário, rumo a uma transição ecológica”, diz. Instigante, interessante, original, Ferry não esconde defender uma dessas sete correntes, o ecomodernismo.

Veja um resumo da exposição de Ferry sobre as sete correntes da ecologia.

## 1 – Catástrofe inevitável
A primeira das correntes estudadas pelo francês é o catastrofismo ou colapsismo, de acordo com o qual o mundo como o conhecemos acabará em 2030, em razão das mudanças climáticas e da deterioração das condições de vida, principalmente da parcela mais pobre da população. Após o cataclisma, restará à humanidade se organizar em microrregiões. Será uma ruptura total com a globalização e com a maneira como somos hoje organizados em termos de política, economia e sociedade.

## 2 – Decrescimento
A segunda é a corrente do decrescimento, que defende que seria desejável que os países parassem de incentivar o crescimento da economia, tendo como meta interromper o lançamento na atmosfera dos gases que causam o efeito estufa e potencializam as mudanças climáticas. Baseada em ganhar menos dinheiro, a corrente tem pouquíssimas chances de prosperar, segundo o próprio filósofo.

“Nenhum dos 193 países-membros da Organização das Nações Unidas (ONU) adotaria o decrescimento como objetivo”, afirma. “Principalmente neste momento de pós-pandemia, todos querem o retorno do crescimento, ou seja, querem vender mais, consumir mais.”

## 3 – Ecofeminismo
A terceira seria o ecofeminismo, que se baseia na premissa de que os mecanismos do planeta foram construídos sobre ideias implantadas principalmente por homens brancos ocidentais. “Em resumo, é uma reação ao macho capitalista opressor”, explica Ferry.

Seria uma espécie de revolução ecológica liderada pelas mulheres, que abrangeria ainda um olhar mais atento sobre a maneira de tratar os animais. A jovem ambientalista sueca Greta Thunberg seria uma representante dessa linha filosófica.

## 4 – Descolonização
Semelhante à anterior, a descolonização prega também a oposição ao opressor. No caso, os colonizados se voltando contra os colonizadores. O francês incluiu um adendo na conferência original para comentar que no Brasil poderíamos encontrar defensores legítimos, em razão do passado atrelado a Portugal, assim como nos Estados Unidos, em sua relação com o Reino Unido.

## 5 – Veganismo
Ainda na mesma linha, segue a corrente vegana, composta por pessoas que não consomem nenhum produto de origem animal ou que tenha sido testado em bichos (ou “indivíduos não-humanos”). Os animais seriam os oprimidos pelo ser humano, que se considera figura primordial no planeta. O filósofo, que chama os veganos de “fundamentalistas verdes”, diz: “Não compartilho dessa visão tão restrita, embora eu ame os animais. Sou apaixonado pelos meus gatos, por exemplo.”

## 6 – Desenvolvimento sustentável
A sexta é a corrente dos reformistas, que acreditam no chamado desenvolvimento sustentável. Luc Ferry desacredita da eficiência das medidas propostas por essa corrente.

Entre os exemplos de ações estão a recomendação feita aos europeus de que se transportem de trem, evitando avião, para trajetos de até 400 quilômetros. Ele questiona ainda as soluções propostas nas conferências da ONU para o clima, como a transição energética, que deixa para trás os combustíveis fósseis. “São soluções pífias, lentas demais, que não provocarão mudanças significativas na velocidade que precisamos”, ressalta.

## 7 – Ecomodernismo
A corrente defendida pessoalmente pelo filósofo é a do “ecomodernismo”. A linha de ação é composta por duas frentes: regeneração e economia circular. “Os governos deveriam tornar a reciclagem obrigatória”, diz Ferry. E às empresas seria dada a oportunidade de cuidar do reflorestamento.

“Somos 8 bilhões de habitantes no planeta hoje, morando em cerca de apenas 10% do espaço disponível. A ideia é usar os demais 90% para fazer ressurgir uma grande biodiversidade, essencial para a manutenção da vida”, diz. “E quem acha que isso vai acarretar custos, está enganado. É barato e possível. Atenção aos empresários: a reciclagem e a economia circular farão vocês ganharem muito mais dinheiro!”

Ferry não descarta a possibilidade de que elementos de duas ou mais correntes possam ser combinados. Ele se alinha à tese apresentada no livro *Planeta Vazio – O Declínio Chocante da População Mundial*, de Lee Tang, que defende que a distopia da superpopulação na Terra não se concretizará. O mundo estaria, na verdade, caminhando para a redução populacional. A crescente urbanização, o alto custo de manter filhos, a tendência das mulheres em ter menos crianças e a perda de influência das religiões explicariam o fenômeno.

Ele delineia como ideal, no entanto, a busca por uma vida plena, mais simples e menos estressante. “Seria ótimo se pudéssemos fazer tudo localmente, com deslocamentos mínimos, de no máximo 15 minutos, a pé ou de bicicleta.” O filósofo argumenta, por fim, que não tenciona fazer “pregação verde”, mas apenas lançar ideias para reflexão. A alternativa ecomodernista teria como objetivo “esboçar um projeto inspirador de reconciliação da humanidade com o planeta.”

### Serviço:
A conferência completa de Luc Ferry será disponibilizada para assinantes do Fronteiras do Pensamento no dia 30 de setembro. [Saiba mais informações sobre programação e ingressos.](https://www.fronteiras.com/)

Compartilhar:

Artigos relacionados

Organização

A difícil arte de premiar sem capitular

Desde Alfred Nobel, o ato de reconhecer os feitos dos seres humanos não é uma tarefa trivial, mas quando bem-feita costuma resultar em ganho reputacional para que premia e para quem é premiado

Liderança
A liderança eficaz exige a superação de modelos ultrapassados e a adoção de um estilo que valorize autonomia, diversidade e tomada de decisão compartilhada. Adaptar-se a essa nova realidade é essencial para impulsionar resultados e construir equipes de alta performance.

Rubens Pimentel

6 min de leitura
Tecnologias exponenciais
O DeepSeek, modelo de inteligência artificial desenvolvido na China, emerge como força disruptiva que desafia o domínio das big techs ocidentais, propondo uma abordagem tecnológica mais acessível, descentralizada e eficiente. Desenvolvido com uma estratégia de baixo custo e alto desempenho, o modelo representa uma revolução que transcende aspectos meramente tecnológicos, impactando dinâmicas geopolíticas e econômicas globais.

Leandro Mattos

0 min de leitura
Empreendedorismo
País do sudeste asiático lidera o ranking educacional PISA, ao passo que o Brasil despencou da 51ª para a 65ª posição entre o início deste milênio e a segunda década, apostando em currículos focados em resolução de problemas, habilidades críticas e pensamento analítico, entre outros; resultado, desde então, tem sido um brutal impacto na produtividade das empresas

Marina Proença

5 min de leitura
Empreendedorismo
A proficiência amplia oportunidades, fortalece a liderança e impulsiona carreiras, como demonstram casos reais de ascensão corporativa. Empresas visionárias que investem no desenvolvimento linguístico de seus talentos garantem vantagem competitiva, pois comunicação eficaz e domínio do inglês são fatores decisivos para inovação, negociação e liderança no cenário global.

Gilberto de Paiva Dias

9 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Com o avanço da inteligência artificial, a produção de vídeos se tornou mais acessível e personalizada, permitindo locuções humanizadas, avatares realistas e edições automatizadas. No entanto, o uso dessas tecnologias exige responsabilidade ética para evitar abusos. Equilibrando inovação e transparência, empresas podem transformar a comunicação e o aprendizado, criando experiências imersivas que inspiram e engajam.

Luiz Alexandre Castanha

4 min de leitura
Empreendedorismo
A inteligência cultural é um diferencial estratégico para líderes globais, permitindo integrar narrativas históricas e práticas locais para impulsionar inovação, colaboração e impacto sustentável.

Angelina Bejgrowicz

7 min de leitura
Empreendedorismo
A intencionalidade não é a solução para tudo, mas é o que transforma escolhas em estratégias e nos permite navegar a vida com mais clareza e propósito.

Isabela Corrêa

6 min de leitura
Liderança
Construir e consolidar um posicionamento executivo é essencial para liderar com clareza, alinhar valores e princípios à gestão e impulsionar o desenvolvimento de carreira. Um posicionamento bem definido orienta decisões, fortalece relações profissionais e contribui para um ambiente de trabalho mais ético, produtivo e sustentável.

Rubens Pimentel

4 min de leitura
Empreendedorismo
Impacto social e sustentabilidade financeira não são opostos – são aliados essenciais para transformar vidas de forma duradoura. Entender essa relação foi o que permitiu ao Aqualuz crescer e beneficiar milhares de pessoas.

Anna Luísa Beserra

5 min de leitura
ESG
Infelizmente a inclusão tem sofrido ataques nas últimas semanas. Por isso, é necessário entender que não é uma tendência, mas uma necessidade estratégica e econômica. Resistir aos retrocessos é garantir um futuro mais justo e sustentável.

Carolina Ignarra

0 min de leitura