Sustentabilidade
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Steve Case: Pé na Estrada em Prol da Inovação

Desde 2014, o cofundador da AOL faz a road trip Rise of the Rest, percorrendo o interior dos Estados Unidos de ônibus em busca de startups. O motivo? Para ele, não é possível inovar para valer sem uma real diversidade

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**Vale a leitura porque…**

… a concentração geográfica de empreendedores inovadores é uma preocupação crescente – e não apenas dos governos.

… empresários e investidores bem-sucedidos dos Estados Unidos estão agindo contra a concentração de empreendedores, acreditando que isso é necessário para o êxito econômico. 

O Brasil ainda se queixa da concentração de investimentos no eixo Rio-São Paulo, mas talvez não saiba que a grama do vizinho não é mais verde nesse quesito: o capital de risco norte-americano está concentrado em apenas três estados – Califórnia, Nova Jersey (por causa de Nova York) e Massachusetts. A diferença entre os países? Enquanto aqui o empresariado espera pelos esforços de descentralização governamentais, lá o setor privado também se mexe. 

Ao menos, o empreendedor Steve Case lidera uma tentativa de alavancar novos ecossistemas de startups com uma série de viagens pelo interior norte-americano batizada de “Rise of the Rest” (ascensão do restante). Isso é feito por meio da empresa de investimentos de Case, a Revolution, sediada em Washington, juntamente com parceiros como Google for Entrepreneurs e Salesforce for Startups. 

Desde seu início, em 2014, o tour já fez paradas em 19 cidades ao longo de mais de 6,4 mil quilômetros e distribuiu cerca de US$ 2 milhões em investimentos. “Há ótimos empreendedores e comunidades de startups promissoras em todo o país, mas suas histórias não foram contadas e, por isso, não havia tanto capital chegando até elas; o capital é atraído para o Vale do Silício, Nova York e Boston”, analisa Case à revista Fast Company. 

Como surgiu a ideia do tour? “Eu era copresidente do National Advisory Council on Innovation and Entrepreneurship, apoiado pelo presidente [Barack] Obama, e de uma iniciativa coletiva chamada Startup America. Trabalhei em um projeto com uma consultoria profissional especializada em empreendedorismo, e tornou-se claro que a melhor maneira de desencadear o aumento de empregos e o crescimento econômico dos EUA era focar as startups do país inteiro.” 

COMO É O TOUR

Na parada em cada cidade, Case e sua equipe se reúnem com empreendedores, investidores, diretores de escolas e políticos para identificar as necessidades locais e promover a formação de um ecossistema de startups que as contemple. 

“Na maioria dos casos, as pessoas com as quais nos relacionamos já estão fazendo coisas úteis; nós só tentamos agrupar tudo em uma trama mais coesa”, diz Case. 

O dia começa, na verdade, com uma apresentação da cultura local. Segue com um passeio pelos centros de inovação da cidade, suas principais empresas de investimento, suas startups, durante o qual essas necessidades são levantadas. E termina com uma competição entre startups, cuja vencedora é premiada com um investimento de US$ 100 mil. 

Dá para sentir o impacto disso, por exemplo, na Filadélfia. A gestora municipal de investimento empreendedor, Archna Sahay, reconhece que o apoio do Rise of the Rest deixou a comunidade especialmente animada, apesar de a cidade estar longe de ser “coitadinha” nesse campo. 

A Filadélfia abriga uma das únicas parcerias público-privadas de fundos de investimento do país, a Startup PHL, tem um dos pouquíssimos departamentos municipais exclusivamente dedicados ao investimento empreendedor e conta com uma comunidade de startups diversificada. Ainda assim, porém, precisa de ajuda. “Já estávamos fazendo coisas maravilhosas antes, mas agora estamos muito felizes por conseguir mostrar isso nacional e globalmente e atrair mais atenção para nossos empreendedores”, diz Sahay.

Em cada parada, Case ainda se dedica a evangelizar os líderes locais, convertendo políticos e empresários ao empreendedorismo. Ele explica, por exemplo, quais os principais indicadores para que as cidades atraiam talento e capital suficiente para fazer com que suas startups cresçam em setores-chave como saúde, educação, transporte, energia e alimentação. Case também aconselha o estabelecimento de parcerias estratégicas que permitam solucionar os problemas de suas comunidades e facilita isso na medida do possível. 

**RUMO À TERCEIRA ONDA DA INTERNET**

O novo livro de Steve Case, A Terceira Onda, ganhará tradução no Brasil em breve, pela HSM. Nele, o autor descreve três ondas da internet: a primeira foi a adoção da rede de computadores; a segunda, a conectividade que veio com as mídias sociais; e a terceira será a tecnologia integrando profundamente nossa vida para solucionar problemas reais – a internet de todas as coisas. 

Case diz que, nessa nova etapa, as startups não nascerão em torno de aplicativos desenvolvidos no dormitório da universidade; tenderão a ser empresas bem maiores, que dependerão muito mais da ajuda do governo. Isso porque a tecnologia da internet das coisas exige investimentos industriais pesados, por ser embutida no mundo físico – em casas e relógios, em alimentos e máquinas – e em sistemas grandes e complexos, como o de saúde e o de educação. 

Ter mais empreendedores com experiências e pontos de vista diversos será particularmente importante na terceira onda, garante Case – bem como será mais importante ter o foco na inclusão social para garantir a sustentabilidade do planeta. “Não se trata só de querer inovar fazendo a coisa certa, e sim do negócio mais sensato.”

**O MOVIMENTO EVOLUI**

O tour de 2016 não é o mesmo de 2014. No início, o projeto era pouco ambicioso. “Quando fizemos a primeira viagem de ônibus, não tínhamos certeza de em que estávamos nos metendo; pensávamos que talvez aquele fosse o único tour”, conta Case. A iniciativa ganhou força mesmo com o potencial observado na estrada. “Já passamos por 19 cidades e queremos percorrer todas as regiões do país. Faremos o que pudermos para dar apoio aos empreendedores e tentar criar mais momentum em cada cidade.” 

Em outubro aconteceu o quinto tour, que passou por cidades como Lincoln e Omaha (Nebraska), Denver (Colorado), Salt Lake City e Provo (Utah), Albuquerque (Novo México) e Phoenix (Arizona). 

Embora as viagens sejam cansativas, Case garante que são prazerosas – seja pela vibe de turnê de rock, pela paisagem, pelos novos relacionamentos ou pelas surpresas. A comitiva não se esquece, por exemplo, da competição de startups de Nova Orleans, feita em cima de um carro alegórico de Carnaval, ou da de Charleston, na Carolina do Sul, em um porta-aviões. 

Na verdade, o círculo já ficou virtuoso, com as cidades anfitriãs se esmerando cada vez mais na recepção do Rise of the Rest. “Cada cidade tenta elevar seu nível para tentar superar a anterior”, conta Case. 

**VISÃO FORA DO EIXO**

O cofundador da AOL nasceu fora do eixo; Case é oriundo de Honolulu, no Havaí, de onde saiu para estudar. Como logo aprendeu, nunca poderia voltar para sua terra natal se quisesse fazer a diferença, e essa foi uma de suas grandes motivações para criar o projeto Rise of the Rest e multiplicar polos empreendedores. A experiência lhe deu a convicção de que existe uma multidão de talentos fora dos grandes centros sendo desperdiçados, uma vez que muitas pessoas não se dispõem a se afastar da família e dos amigos para tentar fazer a diferença. 

As distorções que o Rise of the Rest aponta, e combate, não se limitam à falta de diversidade geográfica, contudo; elas abrangem todo tipo de diversidade, como mostram as estatísticas: 

• 78% dos investimentos de capital de risco vão para Califórnia, Nova York e o corredor entre Massachusetts e Washington.

• Desse total, menos de 3% se destinam a empreendedoras do sexo feminino.

• Apenas 1% (entre os 78%) é reservado a empresas geridas por negros.

O programa também não se preocupa apenas com a diversificação geográfica. Cerca de 50% dos recursos já distribuídos se destinaram a mulheres e afro-americanos.

**ALÉM DO ÔNIBUS**

Case e sua esposa, Jean, também são investidores da Village Capital, que promove o empreendedorismo. Lançada em 2009, a organização identifica, prepara e financia empreendedores que trabalham para solucionar desafios globais, tendo um fundo venture capital (VC) de US$ 17,7 milhões. Em 2015, fez uma grande inovação: a VilCap Communities US, um modelo experimental de fundo VC, que treina investidores para que financiem e acelerem empreendedores em suas comunidades (especialmente as que estão fora do eixo). 

“Temos em nossa sociedade uma quantia de dinheiro enorme destinada a um grupo de pessoas muito pequeno. E o pior é que estas investem em um número ainda menor de pessoas e em soluções que pouco impacto têm sobre a sociedade como um todo”, afirma Ross Baird, CEO e fundador da Village Capital e parceiro de Case. 

“O que percebemos é que pessoas com ideias boas e pragmáticas geralmente não têm muita oportunidade. Estamos tentando dar isso a elas; as regras de posse da inovação precisam mudar”, resume Case. 

Ao pregar a descentralização das startups e afirmar que não serão mais tão pequenas, Steve Case parece querer desafiar três premissas-chave do empreendedorismo inovador atual: a organização em clusters, a escalabilidade e a mentalidade global. Será? 

**Clusters.** O empreendedor-investidor não é contra clusters como o Vale do Silício, ao contrário: a descentralização que ele prega visa multiplicar o número de polos existentes. 

**Escalabilidade.** Para Case, os negócios das startups precisam ser escaláveis, sim; ele só rejeita o objetivo se tornar um unicórnio. Muito mais importante é resolver problemas significativos. 

**Mente global.** Quando Case sugere às startups que olhem mais para os problemas da comunidade local, ele está pensando que perto do problema deve haver alguém já estudando sua solução. No entanto, a solução pode – e deve – valer para vários lugares do mundo. 

**Você aplica quando…**

… repensa a estratégia de seu negócio, encontrando um modo de empreender e inovar para resolver problemas locais, que merecem soluções locais.

… atua setorialmente em conjunto com outras empresas para alavancar o empreendedorismo inovador em mercados locais.

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