Contar histórias é, de certa forma, algo que as pessoas aprendem intuitivamente. Desde crianças, todos nós aprendemos a construir narrativas, seja com nossos ancestrais, com professores, amigos, livros, filmes, séries etc. Todos, em algum momento, compartilhamos histórias na mesa do bar ou na hora do café.
Em Sapiens, um de seus maiores best-sellers, o historiador Yuval Harari argumenta que a cooperação em grande escala é uma das mais importantes especialidades humanas, e que só foi possível porque humanos acreditam em histórias e as compartilham. E acontece algo igualzinho no mundo do trabalho e das empresas.
No entanto, apesar de o impacto dos bons contadores de histórias estar plenamente documentado, ainda há muitas pessoas com dificuldades em aplicar o storytelling em situações de trabalho. Por que isso acontece?
O foco corporativo sempre foi dominado por números e gráficos, pelo uso de conceitos abstratos, e é cada vez mais data-driven. Dizem que essas coisas fazem com que alguns dos instintos mais naturais dos seres humanos sejam bloqueados – e parece ser exatamente o caso com o storytelling.
Em outras palavras, as mesmas pessoas que são perfeitamente capazes de contar histórias em vários contextos, travam completamente quando estão no escritório, em uma sala de reunião ou mesmo em frente à câmera em uma apresentação remota. Muitas vezes, o problema é as pessoas acreditarem que precisam contar algo absolutamente inédito, jamais ouvido por ninguém. Resultado? Elas dizem “essa coisa de storytelling não é para mim; não tenho nenhuma história boa para contar”.
Depois de muitos anos ministrando cursos de storytelling e mentorando executivos de praticamente todas as indústrias, sabemos que essa é uma das dores mais comuns no mundo corporativo. Muitas pessoas se encantam com o storytelling, entendem seu valor como ferramenta, mas, contra todas as evidências, ainda acham que não se aplica a suas realidades. Há espaço de sobra no mundo do trabalho para impactar pessoas por meio de histórias.
Talvez um dos aprendizados mais em falta seja o seguinte: seu objetivo não é criar uma estrutura narrativa jamais vista na história da humanidade. As estruturas básicas das histórias se repetem há muitos anos, o que muda são os detalhes, as circunstâncias, as personagens, os cenários.
> Muitas vezes, o problema é as pessoas acreditarem que precisam contar algo absolutamente inédito, jamais ouvido por ninguém. Resultado? Elas dizem “essa coisa de storytelling não é para mim”
Este é o foco do jornalista e escritor inglês Christopher Booker no livro The Seven Basic Plots: Why we tell stories (em tradução livre, Os Sete Enredos Básicos: Por que contamos histórias), fruto de uma extensa pesquisa sobre os diferentes tipos de histórias que se repetem nas culturas humanas. Pessoas normais, com vidas comuns e carreiras corporativas, podem encontrar, sim, boas narrativas dentro dessas condições. Veja só:
__Vencendo o monstro – Como conseguir o sucesso quando todas as probabilidades estão contra.__
__Exemplo:__ Davi versus Golias.
A cultura brasileira adora histórias de “azarões”, pessoas que alcançam o sucesso mesmo quando não seria esperado. Sabe aquele projeto no qual sua equipe parecia menor que o tamanho das adversidades? O melhor é que elas valorizam seu esforço e o resultado.
__Vencer na vida – como conquistar aquilo que deseja mesmo tendo uma origem humilde.__
__Exemplo:__ Cinderela.
Talvez não seja o caso de todo mundo, mas certamente é o de muitos. Em um mundo que valoriza cada vez mais diversidade e inclusão, histórias assim são cada vez mais bem-vistas e até necessárias. Se encararmos a empresa como um personagem, muitas começaram em garagens e se tornaram impérios.
__A busca – __enfrentar uma série de desafios para conquistar um prêmio, geralmente acompanhado por um grupo.
__Exemplo:__ O Senhor dos Anéis.
Esse é o tipo de narrativa mais interessante para team building.
__Partida e retorno – como viajar para um lugar desconhecido e encontrar o caminho de volta para casa.__
__Exemplo:__ Alice no País das Maravilhas.
Explorar novas culturas, novos mercados, lançamentos da empresa em outro país ou numa nova região.
__Comédia – há uma grande confusão antes que tudo dê certo.
__Exemplo:____ Se beber, não case!
Tirar boas lições de momentos ruins, e é bom lembrar: não existe projeto sem erros e problemas. O que importa é como você os soluciona.
__Tragédia – personagem essencialmente bom cai em tentações que levam a sua queda.
__Exemplo:____ Breaking Bad.
Histórias da concorrência, histórias de empresas que deixaram de entender as mudanças, “pararam no tempo” e perderam relevância.
__Renascimento – personagem falho encontra um caminho de redenção.__
__Exemplo:__ Professor Snape (sub-história de Harry Potter).
Histórias de vulnerabilidade, em que uma falha ou um erro inicial é superado através do aprendizado e da experiência.