Diversidade

Terceirização da responsabilidade de diversidade e inclusão nas empresas

Este é um dos vilões invisíveis que impedem ou atrapalham o sucesso das ações de D&I nas corporações
Fundadora e CEO da Blend Edu, startup que já tem em seu portfólio empresas como 3M, TIM, Reserva, Movile, Grupo Fleury, TechnipFMC, Prumo Logística, brMalls etc. Thalita também está presente na lista da Forbes Under 30 de 2019, como uma dos 6 jovens destaques na categoria Terceiro Setor e Empreendedorismo Social.

Compartilhar:

Uma [pesquisa da PwC](https://www.pwc.com.br/pt/estudos/preocupacoes-ceos/mais-temas/2020/pesquisa-global-de-diversidade-e-inclusao.html) mostrou que as empresas estão investindo de forma sem precedentes em programas de diversidade e inclusão (D&I): 76% das participantes dizem que o tema é um valor ou uma prioridade. No entanto, apenas 5% das organizações afirmam ter pleno sucesso em seus programas de D&I.

Por que existe esse enorme gap entre discurso e os resultados obtidos em diversidade? Por qual motivo estamos falhando na efetividade dos programas?

Ao longo da minha jornada apoiando mais de 70 grandes empresas a colocarem a diversidade em prática, fui coletando insumos e análises para responder essa provocação. Inclusive, cheguei a escrever sobre os [cinco motivos por que as estratégias de diversidade falham](https://www.revistahsm.com.br/post/5-motivos-por-que-as-estrategias-de-diversidade-falham) na minha primeira coluna aqui no site da __HSM Management__.

No entanto, a cada dia que passa, percebo a necessidade de falarmos sobre os grandes vilões invisíveis para o avanço da diversidade nas organizações brasileiras. No artigo de hoje, vou abordar um deles:__ a terceirização da responsabilidade de D&I__.

## Afinal, diversidade é responsabilidade de quem?
Antes de falar sobre esse grande obstáculo, acho importante entendermos onde o tema de D&I normalmente se encaixa nas estruturas organizacionais.

Na [pesquisa de benchmarking](https://conteudo.blend-edu.com/relatorio-benchmarking-diversidade-2020?material_baixado_hidden=benchmarking_2020), realizada pela Blend Edu em 2020 com 45 empresas brasileiras – dentre as quais Natura, Carrefour, QuintoAndar, Resultados Digitais (ligada à RD Station), Easynvest, Prudential, Tim e Ambev –, notamos que cerca de 63% delas afirmaram que o principal objetivo do programa de D&I é engajar colaboradores na criação de uma cultura inclusiva.

Se – como já dizia Peter Drucker – a cultura come a estratégia no café da manhã, seria de se imaginar que a construção de uma cultura pautada em inclusão está na agenda das lideranças do Brasil e do mundo.

Uma pesquisa recente da [Conference Board](https://files.constantcontact.com/ff18da33701/9f112366-808b-4de4-b342-60b0f843784a.pdf) ouviu 1.520 executivos, incluindo 740 CEOs, mostrando as principais prioridades internas de suas empresas, que foram ordenadas abaixo:

1. Atração e retenção dos melhores talentos
2. Criar novos modelos de negócios devido a tecnologias disruptivas
3. Criar uma cultura mais inovadora
4. Desenvolver líderes da próxima geração
5. Redução de custos
6. Análise de dados / colaboração de dados
7. Volatilidade no fluxo de caixa
8. Melhor alinhamento da remuneração e incentivos com a estratégia de negócios
9. Gerenciar fusões e aquisições
10. Construir uma cultura mais inclusiva
11. Um sistema de avaliação de desempenho mais eficaz para os funcionários
12. Inflação salarial
13. Redistribuir o trabalho entre humanos e máquinas
14. Diversidade da força de trabalho
15. Privacidade de dados
16. Implementar remuneração igual por trabalho igual
17. Regulamentos trabalhistas
18. Outros
19. Fornecer benefícios de saúde aos funcionários

Apesar dos itens 10 e 14 (listados anteriormente) mostrarem uma consciência sobre a relevância do tema, a pesquisa da PwC citada no início deste artigo mostra que 79% do engajamento da liderança em D&I permanece nos níveis básico ou emergente.

Então, o que está acontecendo?

## O ciclo vicioso da terceirização da responsabilidade em D&I
Passei a perceber que existe um padrão tóxico no ambiente corporativo, que passei a chamar de ciclo vicioso da terceirização da responsabilidade em diversidade e inclusão.

Mas, afinal, como ele se estrutura?

### 1. Tomada de consciência da liderança
Basicamente, o ciclo começa com a alta liderança da organização percebendo que sua cultura não é inclusiva e que seu C-level possui baixa representatividade. Essa tomada de consciência pode acontecer por diferentes fatores, seja pelas lideranças possuírem diversidade como um valor pessoal, seja pela cobrança de investidores e stakeholders ou movida por uma gestão de crise.

### 2. Terceirização da responsabilidade para o RH
Independentemente do gatilho para a tomada de consciência, é comum que a liderança opte por delegar a responsabilidade de construção de valores, comportamentos e artefatos que potencializam a inclusão para a área de recursos humanos. Na própria pesquisa de benchmarking realizada pela Blend Edu, percebe-se que o RH costuma ser o principal responsável pela temática na maioria das organizações.

E é natural que a liderança conte com áreas-chave na organização para estruturar, implementar e medir suas iniciativas. No entanto, a raiz do problema está no fato da liderança – diante do desconhecimento no assunto – entrar na zona de conforto, transferindo completamente esse papel para profissionais de recursos humanos. Ou seja, não é um movimento de corresponsabilização, mas sim uma terceirização completa dessa responsabilidade.

### 3. Terceirização da responsabilidade para grupos de afinidade
Ao receber o mandato de fazer a gestão da diversidade, é comum que o RH se sinta desorientado pela falta de referências, metodologias e cursos de qualidade no cenário brasileiro.

Diversidade é um tema novo, em constante evolução e que ainda está ganhando maturidade dentro das escolas de gestão e universidades.

Sem saber por onde começar, o RH acaba encontrando um atalho: estruturar [grupos de afinidade](https://www.blend-edu.com/como-iniciar-um-grupo-de-afinidade-ou-diversidade-na-sua-organizacao/) (ou coletivos de diversidade), delegando para eles a responsabilidade de realizar mudanças estruturais (sem orçamento, estrutura ou apoio institucional).

Infelizmente, é comum que esse movimento seja feito de forma desestruturada: sem pensar em governança, sem definir papéis e responsabilidade e sem delimitar os diferentes níveis de autonomia, o que normalmente é evitado quando se usa uma [metodologia estruturada](https://conteudo.blend-edu.com/canvas_grupos_afinidade?material_baixado_hidden=canvas_grupos_afinidade). Desta forma, esses grupos – formados por colaboradores de grupos minorizados que se voluntariam para apoiar os esforços de D&I durante algumas horas no mês – acabam com uma bomba-relógio na mão.

Além de representar um certo comodismo, a terceirização da responsabilidade de D&I para os grupos de afinidade acaba sendo algo extremamente injusto, pois ela acaba transferindo a responsabilidade da resolução dos problemas estruturais para as pessoas que mais são afetadas por eles. O “oprimido” precisa resolver problemas criados pelo “opressor” (falando simbolicamente).

O melhor caminho seria trazer essas pessoas à mesa, ouvindo suas dores, necessidades e demandas, sem sobrecarregá-las com um mandato que dificilmente será cumprido sem o devido apoio interno.

Caminhos possíveis para quem trabalha com diversidade
Esse ciclo vicioso é um problema complexo e multifacetado e que dificilmente encontrará soluções simplistas.

Eu acredito profundamente que todas as consultorias e especialistas de diversidade deveriam estar refletindo profundamente sobre como direcionar as empresas à ação, sem criar uma relação de dependência.

Com isso em mente, eu tenho tomado algumas decisões que podem ajudar as pessoas que atuam com diversidade a ganhar autonomia no longo prazo:

– Em 2021, a Blend Edu lançou o __movimento #DiversidadeEmPrática__, convidando profissionais a compartilhar nas redes sociais as iniciativas por ambientes corporativos mais inclusivos usando a hashtag #DiversidadeEmPrática. Assim, esperamos criar uma rede de inspiração e exemplos positivos para todos, todas e todes.
– Algumas das boas práticas mapeadas por meio da hashtag deram (e dão) origem à episódios do nosso [podcast #DiversidadeEmPrática](https://open.spotify.com/show/2Qf6rHBtLGMrVZVLtSzyww?si=74ed1e9e257e44ac).
– Criamos uma comunidade empresarial, a [Diversidade SA](https://www.blend-edu.com/diversidade-sa). Nela, reunimos as pessoas responsáveis pelo tema de D&I e integrantes de grupos de afinidade, construindo um ambiente de aprendizagem contínua (acesso à cursos, lives, cases, biblioteca, etc.), fórum de discussão e benchmarking.
– Abrimos publicamente e gratuitamente a nossa __metodologia de gestão da diversidade__, com ferramentas e materiais disponíveis em um [toolkit de diversidade](https://www.blend-edu.com/toolkit-diversidade/).

## Caminhos possíveis para as organizações que se deparam com o ciclo vicioso
Se você está lendo esse meu artigo e percebendo que a sua empresa enfrenta esse ciclo vicioso, também compartilho algumas sugestões:

– Leve a pauta de diversidade para reuniões periódicas do conselho de administração, fazendo com que esse tema ganhe prioridade estratégica;
– Crie indicadores e metas de diversidade que impactem a remuneração variável de executivos e executivas em diferentes níveis;
– Reconheça as lideranças inclusivas que existem dentro da sua organização;
– Inclua ações estruturadas de desenvolvimento e sensibilização da sua liderança no tema de diversidade em sua universidade corporativa;
– Fomente a educação contínua sobre diversidade com todos os colaboradores;
– Construa ações afirmativas, que acelerem os avanços de diversidade;
– Ofereça ferramentas para delimitar a identidade, estrutura e experiência dos grupos de afinidade.

Outros caminhos e ações possíveis podem ser encontradas na metodologia dos [8 objetivos e 21 compromissos](https://conteudo.blend-edu.com/metodologia-8objetivos-21compromissos?material_baixado_hidden=metodologia-8-objetivos-21-compromissos), desenvolvidos pela Blend Edu para orientar a atuação das empresas brasileiras.

Já passou da hora de encararmos nossas sombras de frente para criar ações verdadeiramente efetivas para fazer a pauta de diversidade decolar.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Calendário

Não, o ano ainda não acabou!

Em meio à letargia de fim de ano, um chamado à consciência: os últimos dias de 2024 são uma oportunidade valiosa de ressignificar trajetórias e construir propósito.

Empreendedorismo
Um guia para a liderança se antecipar às consequências não intencionais de suas decisões

Lilian Cruz e Andréa Dietrich

4 min de leitura
ESG
Entre nós e o futuro desejado, está a habilidade de tecer cada nó de um intricado tapete que une regeneração, adaptação e compromisso climático — uma jornada que vai de Baku a Belém, com a Amazônia como palco central de um novo sistema econômico sustentável.

Bruna Rezende

5 min de leitura
ESG
Crescimento de reclamações à ANS reflete crise na saúde suplementar, impulsionada por reajustes abusivos e falta de transparência nos planos de saúde. Empresas enfrentam desafios para equilibrar custos e atender colaboradores. Soluções como auditorias, BI e humanização do atendimento surgem como alternativas para melhorar a experiência dos beneficiários e promover sustentabilidade no setor.
4 min de leitura
Finanças
Brasil enfrenta aumento de fraudes telefônicas, levando Anatel a adotar medidas rigorosas para proteger consumidores e empresas, enquanto organizações investem em tecnologia para garantir segurança, transparência e uma comunicação mais eficiente e personalizada.

Fábio Toledo

4 min de leitura
Finanças
A recente vitória de Donald Trump nos EUA reaviva o debate sobre o protecionismo, colocando em risco o acesso do Brasil ao segundo maior destino de suas exportações. Porém, o país ainda não está preparado para enfrentar esse cenário. Sua grande vulnerabilidade está na dependência de um número restrito de mercados e produtos primários, com pouca diversificação e investimentos em inovação.

Rui Rocha

0 min de leitura
Finanças
O Revenue Operations (RevOps) está em franca expansão global, com estimativa de que 75% das empresas o adotarão até 2025. No Brasil, empresas líderes, como a 8D Hubify, já ultrapassaram as expectativas, mais que dobrando o faturamento e triplicando o lucro ao integrar marketing, vendas e sucesso do cliente. A Inteligência Artificial é peça-chave nessa transformação, automatizando interações para maior personalização e eficiência.

Fábio Duran

3 min de leitura
Empreendedorismo
Trazer os homens para a discussão, investir em ações mais intencionais e implementar a licença-paternidade estendida obrigatória são boas possibilidades.

Renata Baccarat

4 min de leitura
Uncategorized
Apesar de ser uma ferramenta essencial para o desenvolvimento de colaboradores, o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) vem sendo negligenciado por empresas no Brasil. Pesquisa da Mereo mostra que apenas 60% das companhias avaliadas possuem PDIs cadastrados, com queda no engajamento de 2022 para 2023.

Ivan Cruz

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A inteligência artificial (IA) está revolucionando o mundo dos negócios, mas seu avanço rápido exige uma discussão sobre regulamentação. Enquanto a Europa avança com regras para garantir benefícios éticos, os EUA priorizam a liberdade econômica. No Brasil, startups e empresas se mobilizam para aproveitar as vantagens competitivas da IA, mas aguardam um marco legal claro.

Edmee Moreira

4 min de leitura
ESG
A gestão de riscos psicossociais ganha espaço nos conselhos, impulsionada por perdas estimadas em US$ 3 trilhões ao ano. No Brasil, a atualização da NR1 exige que empresas avaliem e gerenciem sistematicamente esses riscos. Essa mudança reflete o reconhecimento de que funcionários saudáveis são mais produtivos, com estudos mostrando retornos de até R$ 4 para cada R$ 1 investido

Ana Carolina Peuker

4 min de leitura