Muito se fala em transformação digital, mas poucos sabem o que realmente significa na prática. Embora o termo inclua “digital”, existem diferentes níveis de compreensão e nem todas as empresas que afirmam direcionar esforços para impulsionar inovações e garantir competitividade estão fazendo da forma mais adequada. Neste artigo, falarei um pouco sobre como as regras do jogo mudaram e qual é o novo bê-a-bá para as empresas se destacarem nesse universo.
Para pavimentar mais esse assunto, trago aqui um dado que comprova como a transformação digital vai guiar ainda mais o mercado nos próximos anos: os gastos globais desta área devem alcançar a marca de US$ 3,9 trilhões até 2027, de acordo com dados do Statista. Outro número importante, que mostra o grande potencial desse setor, é que organizações com um diretor digital engajado têm 1.6 vezes mais chances de alcançar uma evolução digital bem-sucedida, conforme destaca a consultoria McKinsey.
O conceito de transformação digital para ampliar a percepção de todos pode ser dividido em três fases: a primeira, chamada de digitização, em que as empresas migram do analógico para o digital; a digitalização, onde a tecnologia é utilizada para otimizar processos e melhorar a experiência do cliente; e, por fim, a transformação digital propriamente dita. Essa última ocorre quando as organizações já estão totalmente imersas no digital, utilizando a tecnologia como parte integrante, como base do seu modelo de negócio ou até mesmo criando novos negócios digitais.
Independente da fase em que cada empresa se encontra é essencial lidar com o elo fundamental que garante a evolução contínua: pessoas.
Inovação demanda tempo e gente
Atuo há mais de dez anos com estratégia corporativa, conectando-a gradualmente com os macrotemas de inovação e transformação digital. Percebo que as empresas buscam um equilíbrio de curto, médio e longo prazo para aplicá-los na prática, e muitas delas ainda projetam suas visões em um lapso de tempo entre cinco e dez anos. No entanto, garantir previsibilidade de resultados nesse ciclo de tempo, em um mundo cada vez mais dinâmico, pode gerar grandes frustrações. Isso demanda uma estratégia ambidestra, em que, apesar de buscarmos resultados de longo prazo, as empresas devem começar a agir desde já, ou seja, focar no agora e manter uma estratégia flexível o suficiente para se adaptar às mudanças, conforme o comportamento do mercado também muda.
Porém, a realidade de boa parte das organizações é que a alta gestão deseja resultados de curto prazo, especialmente quando o tema é inovação. Esse ainda é um desafio para a maioria, pois é necessário estabelecer um ambiente propício, onde a experimentação é valorizada, o potencial das pessoas é explorado, e, como já dizia Steve Jobs: “É preciso aceitar o erro como parte integrante do aprendizado”.
Ou seja, trabalhar uma cultura de inovação contínua demanda criar espaço para que ela aconteça de verdade. Em outras palavras, é preciso dedicar tempo, algo que se tornou ainda mais valioso, pois envolve modelagem comportamental, desenvolvimento de uma nova mentalidade, garantia de que exista a governança adequada dos processos, e ainda não perder de vista os objetivos do negócio. Haja equilíbrio.
E com a transformação digital não é diferente. Quando se espera um resultado imediato, pode ocorrer um choque organizacional profundo se esses aspectos não forem considerados. As empresas fazem planos estratégicos perenes para o longo prazo, porém inovação e transformação digital frequentemente precisam entregar resultados de curto prazo. Concorda que o alinhamento entre os tempos e movimentos precisa estar conectado?
Desafios a superar
É aí que aparecem os principais desafios, o maior deles é a maturidade comportamental. Assim, ter aversão ao erro, que é um pilar importante, também é outra dificuldade. E, por incrível que pareça, a falta de clareza do resultado que se busca também é um obstáculo comum. Associado à ausência de comunicação e transparência, uma vez que geralmente uma pequena parcela de gestores sabe o que se quer almejar, excluindo do contexto quem vai colocar a mão na massa no dia a dia.
Por isso, mesmo que a transformação digital exija apoio ferramental, é preciso, antes, trabalhar “gente”. Ao olhar esse panorama, o reflexo é imediato em todas as esferas processuais, elevando inclusive o resultado quantificável. No entanto, para criar mais conexões, é preciso saber lidar com atritos. O que, por sua vez, demanda energia e desgaste, gerando as adversidades já citadas.
Mitigando impactos negativos
Algumas perguntas precisam ser respondidas, antes de implementar novas tecnologias como a Inteligência Artificial, uma das principais tecnologias emergentes do momento, ou qualquer outra ferramenta tecnológica: saber o que se deseja com a transformação digital. O que se quer trabalhar? De que forma? E qual é o alvo a ser alcançado com a união de transformação digital, estratégia e inovação?
Para respondê-las, voltamos ao fator humano, sendo o primeiro passo manter o cliente no centro e entender as suas necessidades. É com base no comportamento do mercado que se direcionam as estratégias.
Além disso, as estratégias precisam acontecer simultaneamente. E, em paralelo, preparar as lideranças para equilibrar comportamento e técnica ao aplicar os três fatores presentes no título desta reflexão.
Somado a isso, nas empresas, comumente as pessoas são engolidas pelas rotinas. E, para inovar, é preciso criar um espaço saudável para discutir todos esses pontos. Tudo isso passa por um modelo de gestão de mudança para conduzir de forma assertiva o processo de transformação digital. O ADKAR é um deles, envolvendo os seguintes pilares: Awareness (Consciência), Desire (Desejo), Knowledge (Conhecimento), Ability (Habilidade) e Reinforcement (Reforço). Quando se quebra algum desses passos, o resultado pode ser diferente do esperado. Às vezes, a resistência à mudança da equipe reside justamente na falha de aplicação de um desses métodos.
Estratégia é só um caminho para viabilizar o sucesso
É essencial, portanto, garantir um equilíbrio entre objetivos financeiros, de mercado e clientes, de processos e de pessoas. Assim, há consistência no que se vai fazer em médio e longo prazo.
No fim das contas, inovação é sobre consistência, não intensidade, quando apoiada em estratégia e transformação digital. Assim, é melhor fazer algo bem feito para se chegar a um efeito desejado, sempre colocando as pessoas e trabalhando seu comportamento na base de tudo. Porque antes de se querer o “novo” em seu negócio, faça o básico. Somente assim será possível alcançar o sucesso.