Artigo

Três inteligências & companhia

O skilling, upskilling e re-skilling do futuro pode ser sintetizado em duas tríades. A principal é inteligência individual, social e artificial. Também pesa o trio coragem-confiança-respeito, que torna o aprendizado possível, como fruto de erros expostos

Compartilhar:

Eu careço de que o bom seja bom e o ruim ruim, que dum lado esteja o preto e do outro o branco, que o feio fique bem apartado do bonito e a alegria longe da tristeza! (…) Este mundo é muito misturado…”

Essa frase do escritor João Guimarães Rosa (1908-1967) traduz muitas das angústias dos profissionais de empresas hoje, já que o mundo corporativo ficou muito misturado de repente, pois tinha as coisas separadas por muros até não muito tempo atrás.

Para lidar com essa surpreendente complexidade, há uma lista de habilidades do futuro como a elaborada pelo Fórum Econômico Mundial, mas __HSM Management__ prefere organizar as necessidades de skilling, upskilling e re-skilling em um conjunto de três habilidades – inteligência individual, inteligência social e inteligência artificial, conceito que vem de um white paper produzido pela TDS.Company. Segundo o paper, assinado por Silvio Meira, André Neves, Rui Belfort, Filipe Calegario e Vinícius Garcia, cada uma dessas formas de inteligência e o modo como elas interagem entre si são a chave para enfrentar os desafios do século.

A inteligência individual, explica o texto, é a capacidade de alguém, movido por curiosidade, ir atrás de aprender, raciocinar, resolver problemas e se adaptar. Mas a inteligência individual não é monolítica, e sim provavelmente uma coleção de capacidades distintas que se complementam para formar o conjunto de habilidades cognitivas de um indivíduo. “Um empreendedor que inicia um negócio pode ter uma visão única (inteligência intrapessoal), ser hábil em convencer os outros a investir em sua ideia (inteligência interpessoal) e ser capaz de analisar tendências de mercado (inteligência lógica).”

Já a inteligência social é a capacidade de resolução de problemas por grupos de pessoas. “Consideremos um time de desenvolvimento de software. Cada membro da equipe tem competências e habilidades especializadas; combinados, eles são capazes de desenvolver software de complexidade e qualidade que nenhum deles seria capaz de criar individualmente. Nesse caso, a inteligência social do time é maior do que a soma das inteligências individuais de seus membros.”

A inteligência artificial é a capacidade de máquinas e sistemas de aprender, raciocinar (mesmo que de forma limitada) e se adaptar. Capaz de analisar grandes volumes de dados, de maneira que os humanos não conseguem, identificar padrões e tendências ocultos e tomar decisões com base nesses insights, a IA deve ser usada pelos humanos para criar insights valiosos para informar estratégias de negócios.

Reconhecer, entender e se preparar, estruturalmente, para usar a tríade das inteligências é essencial para tentar navegar na complexidade do mundo moderno, diz o paper. Como cada inteligência tem suas capacidades e limitações, a interação entre elas é que abre novas possibilidades. A inteligência individual entra como a base da tríade, fonte de criatividade, inovação e liderança; a inteligência social, traduzida em colaboração, cooperação e comunicação eficaz, faz com que as pessoas trabalhem juntas em problemas tão complexos que não seria possível resolver individualmente. E a inteligência artificial que aumenta os humanos individualmente e em grupo vai viabilizar a tomada de decisões realmente bem informada e ágil, ou seja, com maior chance de efetividade.

Uma pequena amostra do aumento individual pela IA é um gestor que, tendo de contratar pessoas, acionou o ChatGPT4 para (1) definir a job description e os ocupantes ideais das vagas, (2) definir as perguntas das entrevistas de emprego e (3) preparar, em conjunto com o Midjourney, uma apresentação em PowerPoint a fim de defender as contratações para a diretoria. Tudo com ajustes humanos, naturalmente.

As três inteligências bastam? Não. Ainda é necessária outra tríade – coragem-confiança-respeito {veja quadro abaixo} e algumas características que aumentam as inteligências individual e social, como as sete descritas por Guimarães Rosa à direita. Importante: uma obra como a de Guimarães Rosa ou qualquer vivência fora dos negócios impulsionam a imaginação, para construirmos o futuro e inovarmos.

Três verbos: falar corajosamente, confiar em pessoas, respeitar
A sugestão é que os profissionais ajam assim, mesmo onde não há segurança psicológica

Você presumiria que as melhores equipes são as que cometem menos erros? Amy Edmondson, professora e pesquisadora da Harvard Business School, presumiu, no início de uma pesquisa sobre desempenho de equipes em ambiente hospitalar. Mas o que os dados lhe mostraram foi que os times com melhores resultados eram os que registravam mais erros, não menos. Por quê? Porque nestes as pessoas estavam dispostas a aprender acima de tudo, com a finalidade expressa de evitar erros futuros. O resultado dessa pesquisa foi o famoso conceito de “segurança psicológica” de Edmondson, uma segurança que, de uma forma simples, Sonia Kang, da Rotman School of Management, ligada à University of Toronto, traduz como “a percepção de que você pode falar corajosamente – expor ideias, dúvidas e preocupações ou pedir ajuda – e ninguém irá constrangê-lo”.

Como comenta Kang, que é professora de comportamento organizacional e gestão de pessoas da Rotman School, existem dois componentes-chave para a segurança psicológica: confiança e respeito. “Confiança é acreditar que alguém irá apoiá-lo e não agirá para prejudicá-lo. E respeito é valorizar a pessoa por quem é.” Mas, se o ambiente não oferece isso, o que fazer? Como equipes de baixa segurança psicológica são bem menos capazes de enfrentar problemas complexos, é importante que as pessoas tomem a iniciativa de falar corajosamente, confiar nas pessoas [o que é diferente de desconfiar dos dados] e respeitá-las por princípio.

7 lições de Guimarães Rosa sobre skills

Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende.

O rio não quer chegar a lugar algum, só quer ser mais profundo.

Quem desconfia fica sábio.

A gente quer passar um rio a nado, e passa, mas vai dar na outra banda é num ponto muito mais embaixo, bem diverso do em que primeiro se pensou.

As pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – elas vão sempre mudando.

Deus é paciência. O contrário é o diabo.

Passarinho que debruça, o voo já está pronto.

Artigo publicado na HSM Management nº 159.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Calendário

Não, o ano ainda não acabou!

Em meio à letargia de fim de ano, um chamado à consciência: os últimos dias de 2024 são uma oportunidade valiosa de ressignificar trajetórias e construir propósito.

Gestão de Pessoas
Conheça o conceito de Inteligência Cultural e compreenda os três pilares que vão te ajudar a trazer clareza e compreensão para sua comunicação interpessoal (e talvez internacional)

Angelina Bejgrowicz

4 min de leitura
Liderança
Entenda como construir um ambiente organizacional que prioriza segurança psicológica, engajamento e o desenvolvimento genuíno das equipes.

Athila Machado

6 min de leitura
Empreendedorismo
Após a pandemia, a Geração Z que ingressa no mercado de trabalho aderiu ao movimento do "quiet quitting", realizando apenas o mínimo necessário em seus empregos por falta de satisfação. Pesquisa da Mckinsey mostra que 25% da Geração Z se sentiram mais ansiosos no trabalho, quase o dobro das gerações anteriores. Ambientes tóxicos, falta de reconhecimento e não se sentirem valorizados são alguns dos principais motivos.

Samir Iásbeck

4 min de leitura
Empreendedorismo
Otimizar processos para gerar empregos de melhor qualidade e remuneração, desenvolver produtos e serviços acessíveis para a população de baixa renda e investir em tecnologias disruptivas que possibilitem a criação de novos modelos de negócios inclusivos são peças-chave nessa remontagem da sociedade no mundo

Hilton Menezes

4 min de leitura
Finanças
Em um mercado cada vez mais competitivo, a inovação se destaca como fator crucial para o crescimento empresarial. Porém, transformar ideias inovadoras em realidade requer compreender as principais fontes de fomento disponíveis no Brasil, como BNDES, FINEP e Embrapii, além de adotar uma abordagem estratégica na elaboração de projetos robustos.

Eline Casalosa

4 min de leitura
Empreendedorismo
A importância de uma cultura organizacional forte para atingir uma transformação de visão e valores reais dentro de uma empresa

Renata Baccarat

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Em meio aos mitos sobre IA no RH, empresas que proíbem seu uso enfrentam um paradoxo: funcionários já utilizam ferramentas como ChatGPT por conta própria. Casos práticos mostram que, quando bem implementada, a tecnologia revoluciona desde o onboarding até a gestão de performance.

Harold Schultz

3 min de leitura
Gestão de Pessoas
Diferente da avaliação anual tradicional, o modelo de feedback contínuo permite um fluxo constante de comunicação entre líderes e colaboradores, fortalecendo o aprendizado, o alinhamento de metas e a resposta rápida a mudanças.

Maria Augusta Orofino

3 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A Inteligência Artificial, impulsionada pelo uso massivo e acessível, avança exponencialmente, destacando-se como uma ferramenta inclusiva e transformadora para o futuro da gestão de pessoas e dos negócios

Marcelo Nóbrega

4 min de leitura
Liderança
Ao promover autonomia e resultados, líderes se fortalecem, reduzindo estresse e superando o paternalismo para desenvolver equipes mais alinhadas, realizadas e eficazes.

Rubens Pimentel

3 min de leitura