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Um poderoso instrumento de RH

No século 21, os processos de expatriação são cada vez mais frequentes e voltados para o desenvolvimento de líderes. entenda como empresas e executivos devem tratar essas questões
Valéria Vironda é profissional de RH há 25 anos. Atualmente é consultora SR na Singular RH Seleção para Diversidade. Fez muitas transferências internacionais. Ana Cláudia Reis é formada em engenharia e ocupou diversas posições na área de tecnologia antes de migrar para management consulting e depois executive search. Hoje é senior partner na Kingsley Gate.

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Há algumas décadas, talvez a primeira coisa que viesse à cabeça das pessoas ao se depararem com a palavra expatriado fosse um sentimento negativo, como se alguém tivesse perdido sua pátria, condenado a viver fora de seu país no exílio, ou algo assim. De algum tempo para cá, no entanto, representa o sonho de muita gente que ambiciona uma experiência no exterior, que pode alavancar sua carreira em seu país de origem ou permitir uma emigração muito mais confortável, já que dá acesso a emprego legal e qualificado logo de cara.

Uma expatriação consiste, basicamente, em uma transferência de um funcionário para outro país em que uma empresa tenha ou pretenda iniciar uma operação. O tempo todo temos brasileiros saindo daqui e estrangeiros chegando para ocupar posições geralmente estratégicas, mas que também surgem para profissionais que estão em uma fase intermediária da carreira. Tudo depende do momento que ambos estejam vivendo, seja o profissional, seja a empresa.

**COMO FUNCIONA?**

Qualquer empresa pode ter expatriados em seus quadros. Ela escolhe o profissional e justifica perante o governo brasileiro a necessidade de trazer essa pessoa. Um visto é emitido, retirado em uma repartição consular, e então é feita a mudança para o Brasil. Uma vez aqui, a pessoa ganha os documentos de identificação e da Receita Federal, além de fazer um contrato de trabalho como qualquer outro. O visto, porém, está vinculado ao contrato de trabalho e, se esse for rompido por qualquer uma das partes, perde a validade e a pessoa terá que deixar o País. Se o profissional importado receber uma oferta de trabalho em outra empresa e decidir aceitar, precisará de um novo visto, patrocinado pelo novo empregador. Cada visto tem duração de dois anos, renovável por mais dois. Há diversos tipos de vistos que permitem exercer atividade remunerada, mas estamos falando de um visto temporário de trabalho, que é o que se aplica à maioria das empresas. 

No caso de ser um brasileiro indo para outro país, o processo é similar, e tanto a duração como a renovação do visto de trabalho são fixadas pela legislação do lugar de destino. 

**RAZÕES PARA RECORRER À EXPATRIAÇÃO**

Há vários motivos para uma empresa lançar mão da expatriação. Eis os mais frequentes:

* Ela não dispõe de um determinado conhecimento em um dado local – o Brasil tem excelentes técnicos na área de pesquisa mineral e a Vale exporta esse conhecimento para várias partes do mundo, em particular para a África. 
* Precisa ter “olhos” da matriz na filial – é comum que o primeiro executivo de uma operação seja expatriado pela matriz, ao menos durante os primeiros anos, até que a empresa se consolide e seja possível contratar alguém local. Outro arranjo frequente é escolher o executivo financeiro, que tem todas as condições de avaliar os resultados e a conformidade da operação. Ter uma pessoa cuja confiabilidade em termos de resultados e engajamento já foi provada é o objetivo principal. A AB InBev está cheia desses exemplos.
* Deseja, ou necessita, desenvolver um profissional – a empresa quer expor um profissional a vivências e práticas que existem em outra região do globo como uma forma de habilitá-lo a novas posições no futuro, seja no país de origem ou em outra localidade. Esses casos são cada vez mais frequentes.
* Tem de resolver um desafio sucessório, que pode ser de dois tipos. Um é quando a empresa perde um profissional e não pode (ou não quer) fazer a reposição local – seja com uma pessoa de seus quadros, seja recrutando no mercado. Outro ocorre quando há mais de um possível sucessor para a mesma posição e não se arrisca a desmotivar nenhum deles.

Com a contínua sofisticação do mercado de trabalho, mesmo em países menos desenvolvidos, os processos de expatriação estão cada dia mais vol­tados para o desenvolvimento pessoal e profis­sional dos executivos. Na prática, a expatriação vem sendo utilizada pelas organizações para proporcionar novas perspectivas de desenvolvimento pessoal e profissional aos profissionais, sendo, dessa forma, uma forma de atração e retenção de talentos.

E quais os motivos dos executivos? 

Para estes, uma expatriação é uma oportuni­dade de desenvolvimento em duplo sentido, tanto profissional como pessoal. As motivações mais comuns vão de acelerar a carreira e vivenciar novas culturas, passando por ampliar a rede de relacionamentos global, aprender um novo idioma, melhorar a capacidade de adaptação e comunicação até conhecer novos países. 

**COMO CANDIDATAR-SE**

Um profissional expatriado tem de ficar atento a alguns pontos para aproveitar ao máximo o seu período fora do país. É importante manter-se no radar de quem decide, ou seja, ter visibilidade com quem toma a decisão e, dessa forma, ser envolvido em projetos ou atividades relevantes para a companhia. Trabalhar a adaptabilidade cultural é outro fator relevante em qualquer processo de expatriação, demonstrando capacidade e agilidade para lidar com o novo em todos os sentidos. Além disso, um profissional expatriado deve demonstrar rapidamente ser capaz de contribuir e gerar resultados.

**A ESCOLHA DO DESTINO**

Roma, Londres, Paris e Nova York – esse é o circuito Elizabeth Arden. A expressão vem da diplomacia internacional, que assim apelida as alocações preferidas dos diplomatas. E elas também são as favoritas da maioria dos executivos. Grandes capitais, com muitos recursos e atrativos, são vistas como símbolo de status. 

No entanto, as oportunidades de expatriação estão em toda parte. 

Por exemplo, o mercado financeiro se concentra nas grandes cidades, e é uma indústria que expatria com frequência. Por ser um segmento globalizado há muito tempo, presente em todos os continentes, é um dos que mais movimenta pessoas pelo mundo. Outra facilidade é esse mercado ser regido pelo inglês, que é mais difundido como segunda língua, embora muitos profissionais ainda não tenham a fluência desejável. 

Já uma mineradora terá mais chances de exportar seus profissionais, notadamente os de campo, para a África. A África do Sul é o país mais rico do continente, mas há brasileiros trabalhando também em Angola e Moçambique. Se, por um lado, existe a facilidade de ser uma ex-colônia portuguesa, por outro, são países com muitos problemas de infraestrutura e outros, resultantes de guerra civil e dificuldades econômicas.

O destino de expatriação oferecida pela empresa nem sempre coincidirá com a localidade almejada. O que fazer? É preciso pensar várias vezes antes de recusar uma expatriação. É improvável que a empresa proponha essa mudança sem ter feito uma consulta informal e recebido sinalização positiva por parte do profissional antes. Mas uma recusa sem fundamento dificultará uma futura oferta por parte da empresa, por entender que o profissional só está levando em consideração os próprios interesses. 

**FATORES DE SUCESSO**

Gestores mais jovens, especialmente em início de carreira, costumam ter mais facilidade em um processo de expatriação do que os mais seniores. Afinal, como regra, os mais jovens têm menos vínculos locais, tais como família, cônjuges com uma carreira já estabelecida e filhos.

Digamos o óbvio: quem deseja uma expatriação deve procurar trabalho em uma empresa multinacional, seja esta brasileira ou estrangeira, ou, pelo menos, em uma empresa que esteja se preparando para um processo de internacionalização. Não ter bom conhecimento de um segundo idioma pode ser eliminatório, porque a pessoa precisará chegar ao seu destino pronta para trabalhar, conseguindo interagir com chefes, pares e subordinados. O inglês é a praxe; poucas organizações esperam que o expatriado fale holandês ou, mais recentemente, chinês. Mas, se você vai para Xangai e não fala chinês, a expectativa é que esteja aberto a aprendê-lo ao longo de sua permanência na nova cidade – na medida do possível. 

Não menos importante que o idioma é a disposição de se adaptar aos costumes, ao clima, à comida, aos serviços e a tudo o mais que faz parte da vida em sociedade. Mesmo as mudanças para países ocidentais, teoricamente mais próximos de nós do ponto de vista cultural, podem apresentar pequenos truques de sobrevivência: não é bem-visto pôr a mão nas frutas em uma feira livre na Itália; as portas do metrô de Paris talvez precisem ser abertas manualmente; países árabes podem ter restrições de vestimenta para mulheres; ninguém se oferece para carregar sua sacola no metrô de Nova York; manicures não tiram cutículas em muitos lugares. Esses podem ser fatores importantes ou irrelevantes, mas com certeza afetam a vida de um recém-chegado – e, às vezes, continuam afetando-a tempo depois.

**CUSTOS – QUEM PAGA?**

Ter um expatriado custa muito caro para a empresa, embora a renda dele não cresça na mesma proporção. O formato tradicional de uma expatriação pressupõe, além da remuneração e benefícios regulares compatíveis com o cargo a ser ocupado, verbas adicionais para aluguel, passagens aéreas para o país de origem uma vez por ano, auxílio-edu­cação e suporte nos custos fiscais, por exemplo. Esse tipo de pacote completo tem sido reservado às posições mais altas, no entanto, ou às que carecem um pouco de atratividade. 

Observa-se um crescimento dos funcionários transferidos para o exterior com o visto patrocinado mas contrato de trabalho local e benefícios locais, no qual o profissional arca com os custos de manutenção seus e de sua família, como escola e moradia. Isso simplifica bastante a gestão e reduz custos para a empresa, permitindo que aumente as oportunidades oferecidas.

Além das questões relacionadas com a adaptação do profissional, as melhores empresas são cuidadosas durante o processo que antecede a expatriação, realizando um planejamento prévio tanto da expatriação quanto da repatriação do executivo e de sua família, cuidando dos aspectos financeiros e de benefícios e, principalmente, criando critérios claros para a seleção dos profissionais que serão expatriados. 

A regra é que, durante a expatriação, o profissional seja desligado do local de origem ou tenha seu contrato de trabalho suspenso. Isso acarreta a suspensão de benefícios e verbas trabalhistas recolhidas por ele e o empregador no país. Mas há que planejar pensão para filhos ou ex-cônjuges e assistência médica para os elegíveis que permanecerem no país.

**O RETORNO**

A empresa é responsável pelo executivo durante a vigência de seu visto e contrato de trabalho. Assim, ela tem a obrigação legal de repatriá-lo, com a família e a mudança (aos curiosos, a mudança é tratada como uma importação temporária) – e ele pode contar com essa segurança. 

Porém, na hora do retorno, para onde voltar?

O executivo expatriado deve ficar especialmente atento aos termos de repatriação combinados, pois esse é o calcanhar de aquiles do processo. Não que a empresa não deseje reter esses executivos – eles custaram caro, afinal, e adquiriram novas competências com a experiência internacional, do conhecimento de outras culturas à ampliação das redes de relacionamentos, passando pela compreensão global do negócio e a cultura da empresa. Serão potenciais disseminadores do conhecimento na volta. O que ocorre é que muitas empresas têm dificuldade de garantir uma vaga futura a seus repatriados.

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