Assunto pessoal

Um real gestor do século 21 sabe fazer negócios ganha-ganha-ganha. Você sabe?

Ainda há muita gente sem entender o mundo interdependente. Mas essa condição está se radicalizando. Vale revisitar – e incorporar – ideias e práticas de capitalismo consciente para fazer seu skilling nessa área
Thomas Eckschmidt é cofundador e CEO da CBJourney, maior rede de consultores capitalistas conscientes no mundo, com 800 profissionais em 16 países. Fundou o movimento Capitalismo Consciente no Brasil e no Peru

Compartilhar:

Em 2009, descobri o movimento do capitalismo consciente nos Estados Unidos ao ler um artigo de John Mackey, cofundador e CEO da rede de varejo Whole Foods. Percebi que eu sempre tinha sido um capitalista consciente, mas estava inconsciente disso.

Foi um divisor de águas para mim. Desde esse momento, passei a reconhecer que decisões precisam contemplar valor para todas as partes interessadas. Percebi que a forma como nos comportamos pode fortalecer ou destruir nosso ecossistema e que nosso jeito de liderar influencia todos ao nosso redor.

Bom, isso tudo para dizer que o mundo dos negócios é como qualquer ecossistema no mundo, principalmente na natureza. Tudo está conectado. Como já dizia o ambientalista John Muir, “pai dos parques nacionais” dos Estados Unidos: “Quando você puxa uma única coisa na natureza, você a encontra conectada ao resto do mundo”.

O segredo de um ecossistema que fortalece o negócio é o engajamento. Como o criamos? Antes, é preciso entender o que são as partes interessadas, essa ideia de stakeholders. Em nossos livros, as definimos como: “Toda entidade, organização ou indivíduo afetado ou interessado em nossa atividade (econômica ou não)”.
A atividade e a presença de uma organização podem trazer muitos impactos, inclusive àqueles com os quais não existe um relacionamento financeiro direto, como as famílias dos funcionários e as comunidades do entorno.

Vivemos em uma era de interdependência radical. Para estabelecer uma boa integração dos stakeholders, precisamos começar por algum lugar. O primeiro passo é identificar todas as partes interessadas de nosso ecossistema. Depois, priorizamos aqueles com quem vamos começar a trabalhar e criar um “mapa de stakeholders” público para que todos, dentro da empresa, entendam a prioridade da organização.

Em seguida, estabelece-se uma estratégia de comunicação. Para defini-la, precisamos entender as expectativas da relação entre empresa e stakeholder. Por exemplo, com funcionários, a estratégia da pesquisa anual de clima organizacional não funciona mais. Procure um canal de comunicação que permita um pulso constante das equipes, como MyHappyForce.

Uma vez estabelecidas as estratégias para cada grupo de stakeholders, você fortalece o engajamento, já que a geração de valor passa a exceder a relação financeira e a proporcionar outros valores: sociais, emocionais, de conhecimento e assim por diante).

Isso nos leva a uma mandala como a criada pela Whole Foods – embora seja um exemplo já antigo (anterior à aquisição da empresa pela Amazon) e bastante conhecido, continua a ser extremamente didático e, assim, extremamente útil. Nessa mandala, os cinco principais stakeholders são: equipes, fornecedores, clientes, investidores e comunidade e meio ambiente.

Quando os funcionários estão felizes, temos equipes motivadas, que buscam melhorar o atendimento e são fonte de grande inovação, o que traz melhores parcerias com fornecedores mais comprometidos, que criam produtos de melhor qualidade e maior valor para os clientes, que estarão mais satisfeitos e gerarão mais vendas e melhores resultados financeiros. Isso traz uma nova motivação para os investidores, que estão mais abertos à cidadania corporativa, o que, por sua vez, vai propiciar um reconhecimento das equipes da empresa, que terão mais satisfação.

![Imagens-22](//images.ctfassets.net/ucp6tw9r5u7d/1u9Mxt4mMLSq14XlZb2Dr7/4232b3ccacf771b62e998d18553038e4/Imagens-22.png)

Essa mandala é um ótimo exemplo de círculo virtuoso de um ecossistema interdependente, que gera um engajamento muito maior do que a abordagem tradicional do século passado.

A forma como lideramos nessa esfera de stakeholders determina como o resto do sistema se engajará conosco. Se trabalhamos de forma exploratória, visando apenas o benefício próprio, certamente isso servirá de aviso a todas as partes interessadas para se comportarem da mesma maneira. Um exemplo: ao pagar fornecedores menores em prazos mais longos, quando eles certamente não têm acesso a linhas de crédito melhores do que as suas, a empresa está operando como se fazia no século passado. Isso é exploração extrativista.

## Ganha-ganha-ganha
O último nível dessa modalidade de criação de engajamento ocorre quando investimos nossos recursos para efetivamente criar um ganha-ganha-ganha (múltiplas dimensões e múltiplos stakeholders a partir de uma mesma transação). Isso é reconhecer nossa interdependência radical. Todo negócio traz consequências, gera impacto. Cabe a nós decidir se nossa pegada vai ser positiva ou negativa.

Então, como criamos transações ganha-ganha-ganha? Essa ideia foi popularizada por Blake Mycoskie, que fundou nos EUA, em 2006, a Toms Shoes. Para cada par de sapatos vendidos, um par era doado para pessoas em necessidade em alguma parte do mundo. Mycoskie foi criticado por causar o fechamento de pequenos negócios locais onde os sapatos eram doados, então o modelo precisou evoluir: as empresas que atuam no 1 a 1 tendem a entregar materiais, e não produto acabado, para que empreendedores locais fomentem o ecossistema de negócios. Mais sustentável no longo prazo do que a filantropia

Conforme entendemos e aprendemos mais, a aplicação da ideia de interdependência radical evolui. É o que exploramos no livro Satisfação das Partes Interessadas, escrito em parceria com Marcos Felipe Magalhães.

Em modelos mais avançados, em que envolvemos nossos consultores capitalistas conscientes certificados, criamos modelos de ganha-ganha-ganha poderosos. Em um projeto recente, um cliente estabeleceu como stakeholder principal as “empresas pares”. Ele passou a comprar treinamentos para os funcionários em parceria com essas empresas. Aproveitou a redução de custo para incluir novas vagas, que foram oferecidas ao sindicato local, mas com a contrapartida de que essas vagas fossem direcionadas apenas a desempregados.

Nesse exemplo, a aquisição de um treinamento envolveu empresas locais, gerou vagas de emprego, criou um pipeline de talentos que identifica potenciais candidatos e fortaleceu a relação com os sindicatos por meio de uma colaboração com associados necessitados. Com isso, uma pessoa desempregada recebeu uma capacitação e ampliou sua empregabilidade.

Outra ferramenta é o Ativador de Negócios Conscientes, que, por meio de quatro perguntas, pode oferecer ideias de ações para avançar na implementação de programa de maior engajamento das partes interessadas. As perguntas são sobre propósito evolutivo da empresa, integração dos stakeholders, cultura responsável e liderança servidora.

Aprofundar os fundamentos da interdependência é uma oportunidade e tanto de você trazer para o século 21 a sua empresa e também a sua carreira de gestor. Você já enxerga sua organização como ecossistema? Apple, Alphabet, Amazon se enxergam assim. Você tem pensamento sistêmico? Domina a comunicação – com todos os stakeholders? Essas habilidades são próprias do gestor do século 21.

__Leia mais: [Estão levando a sério a semana de trabalho de 4 dias](https://www.revistahsm.com.br/post/estao-levando-a-serio-a-semana-de-trabalho-de-4-dias)__

Compartilhar:

Artigos relacionados

Organização

A difícil arte de premiar sem capitular

Desde Alfred Nobel, o ato de reconhecer os feitos dos seres humanos não é uma tarefa trivial, mas quando bem-feita costuma resultar em ganho reputacional para que premia e para quem é premiado

ESG
No mundo corporativo, onde a transparência é imperativa, a Washingmania expõe a desconexão entre discurso e prática. Ser autêntico não é mais uma opção, mas uma necessidade estratégica para líderes que desejam prosperar e construir confiança real.

Marcelo Murilo

8 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo onde as empresas têm mais ferramentas do que nunca para inovar, por que parecem tão frágeis diante da mudança? A resposta pode estar na desconexão entre estratégia, gestão, cultura e inovação — um erro que custa bilhões e mina a capacidade crítica das organizações

Átila Persici

0 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A ascensão da DeepSeek desafia a supremacia dos modelos ocidentais de inteligência artificial, mas seu avanço não representa um triunfo da democratização tecnológica. Embora promova acessibilidade, a IA chinesa segue alinhada aos interesses estratégicos do governo de Pequim, ampliando o debate sobre viés e controle da informação. No cenário global, a disputa entre gigantes como OpenAI, Google e agora a DeepSeek não se trata de ética ou inclusão, mas sim de hegemonia tecnológica. Sem uma governança global eficaz, a IA continuará sendo um instrumento de poder nas mãos de poucos.

Carine Roos

5 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A revolução da Inteligência Artificial está remodelando o mercado de trabalho, impulsionando a necessidade de upskilling e reskilling como estratégias essenciais para a competitividade profissional. Empresas como a SAP já investem pesadamente na requalificação de talentos, enquanto pesquisas indicam que a maioria dos trabalhadores enxerga a IA como uma aliada, não uma ameaça.

Daniel Campos Neto

6 min de leitura
Marketing
Empresas que compreendem essa transformação colhem benefícios significativos, pois os consumidores valorizam tanto a experiência quanto os produtos e serviços oferecidos. A Inteligência Artificial (IA) e a automação desempenham um papel fundamental nesse processo, permitindo a resolução ágil de demandas repetitivas por meio de chatbots e assistentes virtuais, enquanto profissionais se concentram em interações mais complexas e empáticas.

Gustavo Nascimento

4 min de leitura
Empreendedorismo
Pela primeira vez, o LinkedIn ultrapassa o Google e já é o segundo principal canal das empresas brasileiras. E o seu negócio, está pronto para essa nova era da comunicação?

Bruna Lopes de Barros

5 min de leitura
ESG
O etarismo continua sendo um desafio silencioso no ambiente corporativo, afetando tanto profissionais experientes quanto jovens talentos. Mais do que uma questão de idade, essa barreira limita a inovação e prejudica a cultura organizacional. Pesquisas indicam que equipes intergeracionais são mais criativas e produtivas, tornando essencial que empresas invistam na diversidade etária como um ativo estratégico.

Cleide Cavalcante

4 min de leitura
Empreendedorismo
A automação e a inteligência artificial aumentam a eficiência e reduzem a sobrecarga, permitindo que advogados se concentrem em estratégias e no atendimento personalizado. No entanto, competências humanas como julgamento crítico, empatia e ética seguem insubstituíveis.

Cesar Orlando

5 min de leitura
ESG
Em um mundo onde múltiplas gerações coexistem no mercado, a chave para a inovação está na troca entre experiência e renovação. O desafio não é apenas entender as diferenças, mas transformá-las em oportunidades. Ao acolher novas perspectivas e desaprender o que for necessário, criamos ambientes mais criativos, resilientes e preparados para o futuro. Afinal, o sucesso não pertence a uma única geração, mas à soma de todas elas.

Alain S. Levi

6 min de leitura
Carreira
O medo pode paralisar e limitar, mas também pode ser um convite para a ação. No mundo do trabalho, ele se manifesta na insegurança profissional, no receio do fracasso e na resistência à mudança. A liderança tem papel fundamental nesse cenário, influenciando diretamente a motivação e o bem-estar dos profissionais. Encarar os desafios com autoconhecimento, preparação e movimento é a chave para transformar o medo em crescimento. Afinal, viver de verdade é aceitar riscos, aprender com os erros e seguir em frente, com confiança e propósito.

Viviane Ribeiro Gago

4 min de leitura