Assunto pessoal

Uma gestão de recursos humanos para humanos

Se o RH aumentar seu domínio das ciências comportamentais e usar intervenções, ele pode ficar muito mais centrado nas pessoas ao longo de suas atividades
Dilip Soman é titular da cadeira de estratégia da comunicação da Rotman School of Management, de Toronto, Canadá, e diretor do India Innovation Institute, da University of Toronto.

Compartilhar:

O campo da gestão de recursos humanos tem evoluído sem parar, abraçando cada vez mais a ideia de que as pessoas são o recurso-chave das empresas. O próximo passo a ser dado pela área, portanto, será na direção de uma “gestão de recursos humanos para humanos”. Como a ciência comportamental estuda o que é ser um humano, pode ajudar – e muito – os gestores de pessoas no novo desafio.
Esse conhecimento científico pode mudar as ações do RH, ajudando seus gestores a:

__EVITAR ARMADILHAS DAS ENTREVISTAS.__ Existem três formas principais de entrevistas no RH atual: as técnicas (para entender as habilidades); as estruturadas (para determinar se um indivíduo é capaz de navegar em situações específicas); e as não estruturadas, ou livres (para conhecer a personalidade do candidato e avaliar sua adequação à cultura organizacional). As últimas são cada vez mais populares.

As ciências comportamentais oferecem evidências de que a validade das entrevistas livres é limitada. Não só esse tipo pode não ser útil, como também, em algumas situações, pode ser prejudicial, seja por levar os entrevistadores a pré-julgar os candidatos, seja por fazê-los focar a parte simples da conversa e ignorar informações complexas relevantes.

Por outro lado, agora sabemos que há uma heterogeneidade considerável entre as pessoas. Os candidatos a um determinada vaga variam em estilos de aprendizagem, de comunicação etc. Então, como as ciências comportamentais mostram, a ênfase em um modelo de entrevista padrão pode desnecessariamente prejudicar alguns candidatos.

__ALAVANCAR DIVERSIDADE e INCLUSÃO.__ Apesar das declarações de boas intenções, muitas organizações ainda deixam a desejar na alavancagem de D&I. A culpa disso é dos estereótipos – cientificamente, heurísticas que nos permitem processar informações rápido, mas à custa da precisão em geral. Os estereótipos mais comuns são ligados a gênero e origem étnica.

Um achado da ciência comportamental contribui muito para o recrutamento que favorece a diversidade: juntar candidatos nas entrevistas, colocá-los lado a lado. Imagine um candidato vindo de um grupo minorizado, mas com maior competência em matemática, e outro que seja um homem branco cis e hétero, mas com menor competência em matemática. Se eles forem entrevistados em separado, é possível que o estereótipo se imponha. Mas estando juntos, a atenção dos entrevistadores vai se concentrar na competência matemática e facilitar a inclusão do diverso.

__DESENHAR PROGRAMAS DE INCENTIVO.__ Exemplos comuns de programas de incentivo incluem planos de participação nos lucros, prêmios pontuais e reconhecimento por alcançar diferentes níveis de realização. Mas há uma abundância de pesquisas das ciências comportamentais que podem contribuir para um melhor design desses programas.

Um achado é o chamado efeito de enquadramento – a ideia de que a mesma informação apresentada de maneira diferente pode ter efeitos diferentes sobre o comportamento humano. Numa fábrica na China, todos os funcionários tinham uma meta de produtividade para o dia.

Então, lhes foi dado um incentivo: quem superasse a meta receberia um pagamento extra de ¥ 320. A informação foi apresentada aos colaboradores de duas formas. Alguns souberam que, se aumentassem a produtividade, receberiam o dinheiro extra.

Outros receberam a promessa de ¥ 320 extras para atingir o nível de produtividade mais alto, mas foram informados de que, se não conseguissem atingir esse nível, perderiam os ¥ 320.

As pessoas do segundo grupo foram muito mais propensas a mostrar um aumento na produtividade porque a aversão à perda é mais poderosa do que a promessa de ganho, algo que foi descoberto por Daniel Kahneman, vencedor do Prêmio Nobel por seu trabalho de economia comportamental.

__MELHORAR COMUNICAÇÃo E TREINAMENTO.__ A ciência do comportamento oferece uma série de sugestões sobre como a comunicação pode ser melhorada para aumentar a compreensão e facilitar a ação. Em uma demonstração, especialistas mudaram a forma como a comunicação era elaborada para incentivar os funcionários a se beneficiarem de um programa de vacinação contra a gripe.

Cada participante recebia uma mensagem-padrão com a seguinte introdução: “Gostaríamos que você imaginasse que está interessado em proteger sua saúde. O Centro de Controle de Doenças indica que uma vacina contra a gripe reduz significativamente o risco de contrair o vírus. Seu empregador lhe fala sobre um programa hipotético que recomenda que você tome uma vacina contra a gripe neste outono e possivelmente economize US$ 50 em seu custo de contribuição de seguro de saúde quinzenal ou mensal”.

Após essa introdução básica, as mensagens de e-mail variavam, distribuindo-se em três:

(1) Os participantes eram solicitados a marcar uma caixa se planejassem tomar uma vacina contra a gripe no outono.

(2) Deviam marcar uma de duas caixas – “tomarei uma vacina contra a gripe no outono” ou “não tomarei etc.”.

(3) Tinham de escolher entre as seguintes duas opções: “tomarei vacina contra a gripe neste outono para reduzir meu risco de contrair a gripe e economizar US$ 50” ou “não tomarei vacina contra a gripe neste outono, mesmo que isso signifique aumentar meu risco de contrair a gripe – e não quero economizar US$ 50”.

Apenas 40% dos funcionários que leram a primeira mensagem pretendiam tomar a vacina contra a gripe; esse número subiu para cerca de 61% nos que foram chamados a escolher entre tomar ou não uma vacina. E subiu ainda mais, para 75%, quando os benefícios de tomar a vacina antigripal e o custo de não tomá-la foram destacados. Há ainda pesquisas mostrando que enviar lembretes às pessoas aumenta a probabilidade de que concluam qualquer tarefa, como a de tomar vacina.

Quanto a treinamentos, apenas educar as pessoas não garante os melhores resultados. A ciência comportamental já provou em várias pesquisas que a educação deve: ser just-in-time, incorporar a prática e partir de feedbacks. E, para que seja eficaz mesmo, tem de ser complementada por sugestões de ação logo na sequência.

*© Rotman Management
Editado com autorização da Rotman School of Management, ligada à University of Toronto. Todos os direitos reservados.*

__Leia mais: [Um real gestor do século 21 sabe fazer negócios ganha-ganha-ganha. Você sabe?](https://www.revistahsm.com.br/post/um-real-gestor-do-seculo-21-sabe-fazer-negocios-ganha-ganha-ganha-voce-sabe)__

Compartilhar:

Artigos relacionados

Calendário

Não, o ano ainda não acabou!

Em meio à letargia de fim de ano, um chamado à consciência: os últimos dias de 2024 são uma oportunidade valiosa de ressignificar trajetórias e construir propósito.

Uncategorized
Há alguns anos, o modelo de capitalismo praticado no Brasil era saudado como um novo e promissor caminho para o mundo. Com os recentes desdobramentos e a mudança de cenário para a economia mundial, amplia-se a percepção de que o modelo precisa de ajustes que maximizem seus aspectos positivos e minimizem seus riscos

Sérgio Lazzarini

Gestão de Pessoas
Os resultados só chegam a partir das interações e das produções realizadas por pessoas. A estreia da coluna de Karen Monterlei, CEO da Humanecer, chega com provocações intergeracionais e perspectivas tomadas como normais.

Karen Monterlei

Liderança, times e cultura, Cultura organizacional, Gestão de pessoas
Entenda como utilizar a metodologia DISC em quatro pontos e cuidados que você deve tomar no uso deste assessment tão popular nos dias de hoje.

Valéria Pimenta

Inovação
Os Jogos Olímpicos de 2024 acabaram, mas aprendizados do esporte podem ser aplicados à inovação organizacional. Sonhar, planejar, priorizar e ter resiliência para transformar metas em realidade, são pontos que o colunista da HSM Management, Rafael Ferrari, nos traz para alcançar resultados de alto impacto.

Rafael Ferrari

6 min de leitura
Liderança, times e cultura, ESG
Conheça as 4 skills para reforçar sua liderança, a partir das reflexões de Fabiana Ramos, CEO da Pine PR.

Fabiana Ramos

ESG, Empreendedorismo, Transformação Digital
Com a onda de mudanças de datas e festivais sendo cancelados, é hora de repensar se os festivais como conhecemos perdurarão mais tempo ou terão que se reinventar.

Daniela Klaiman

ESG, Inteligência artificial e gestão, Diversidade, Diversidade
Racismo algorítimico deve ser sempre lembrado na medida em que estamos depositando nossa confiança na inteligência artificial. Você já pensou sobre esta necessidade neste futuro próximo?

Dilma Campos

Inovação
A transformação da cultura empresarial para abraçar a inovação pode ser um desafio gigante. Por isso, usar uma estratégia diferente, como conectar a empresa a um hub de inovação, pode ser a chave para desbloquear o potencial criativo e inovador de uma organização.

Juliana Burza

ESG, Diversidade, Diversidade, Liderança, times e cultura, Liderança
Conheça os seis passos necessários para a inserção saudável de indivíduos neuroatípicos em suas empresas, a fim de torná-las também mais sustentáveis.

Marcelo Franco

Lifelong learning
Quais tendências estão sendo vistas e bem recebidas nos novos formatos de aprendizagem nas organizações?

Vanessa Pacheco Amaral