Vivemos uma era de transformações digitais constantes. Tecnologias emergentes evoluem rapidamente, com atualizações quase em tempo real, o que intensifica debates sobre o futuro do trabalho, a automação e os limites da inteligência artificial.
Diante de discursos muitas vezes polarizados, começa a ganhar força uma visão mais equilibrada: a de que a IA não veio para substituir o ser humano, mas para ampliar suas capacidades, funcionando como uma tecnologia que potencializa habilidades humanas (um enabler).
Nesse cenário, já é possível afirmar que estamos adentrando a Quinta Revolução Industrial, ou Indústria 5.0. Ao invés de substituir a Indústria 4.0, este novo paradigma surge como uma camada complementar, focada na colaboração homem-máquina, sustentabilidade e bem-estar coletivo
O pesquisador Shivam Pandey (University of Bergen) define bem esse novo momento: “A Indústria 5.0 constrói sobre os avanços tecnológicos de suas predecessoras com ênfase adicional na colaboração homem-máquina, sustentabilidade e bem-estar social.” O ser humano, nesse contexto, deixa de ser apenas um consumidor e passa a ocupar o centro do processo de inovação.
User Experience como motor de inovação
Essa abordagem se conecta diretamente com os princípios do design centrado no ser humano, essência da disciplina de UX. Ao adotar esse mindset como diretriz estratégica, empresas se tornam mais conscientes em suas decisões, mais assertivas em suas entregas e mais sustentáveis em seus impactos.
No ambiente organizacional, o UX atua como facilitador de diálogo entre tecnologia, negócios e pessoas. Mais do que operacional, o trabalho de UX ganha valor estratégico ao transformar dados e percepções em decisões bem informadas.
Recentemente, implementamos na equipe da GEP um programa de Sponsor Users, inspirado no modelo da IBM. Essa iniciativa conecta usuários-chave diretamente ao time de produto durante todo o ciclo de desenvolvimento.
Esse contato contínuo gera uma riqueza de aprendizados:
● feedbacks detalhados,
● nuances de uso,
● linguagem autêntica,
● prioridades reais do dia a dia.
São elementos que dificilmente surgiriam em métodos puramente quantitativos. A combinação entre dados qualitativos e quantitativos fortalece a construção de soluções mais contextualizadas e eficazes. Além disso, quando quem desenvolve a tecnologia escuta diretamente quem a utilizará, há ganho em empatia e senso de pertencimento (ownership). O resultado é um produto mais próximo da realidade e uma equipe mais engajada com o impacto que gera.
A Nielsen Norman Group reforça esse papel estratégico em uma de suas publicações: “This evolution means that the unique value we bring as UX professionals is shifting decidedly toward strategic thinking and leadership. While AI can execute tasks, it cannot independently understand the complex human and organizational contexts in which our work exists.”
Mesmo em um cenário cada vez mais automatizado, a atuação humana permanece insubstituível, especialmente pela capacidade de compreender contextos e liderar com objetividade.
De soluções técnicas a experiências que fazem sentido
Os ganhos do design centrado no usuário vão além da funcionalidade. O verdadeiro diferencial surge quando as equipes aprendem a interpretar feedbacks com empatia e iterar com foco no propósito. Isso torna a organização mais ágil, colaborativa e resiliente.
No setor de tecnologia — onde escalabilidade e rapidez são essenciais — o UX torna-se ainda mais relevante.
Projetos guiados apenas por viabilidade técnica ou restrições de recurso podem até ser eficientes, mas nem sempre são eficazes. O design centrado nas pessoas garante que o problema certo esteja sendo resolvido, com soluções que fazem sentido para quem realmente importa: o usuário.
Essa abordagem amplia o entendimento dos desafios ao incorporar também os aspectos sociais, emocionais e práticos do uso. Como consequência, reduz riscos, evita retrabalho e impede que produtos “funcionais” cheguem ao mercado sem resolver as dores reais do cliente.
Design como catalisador da transformação digital
O UX oferece um caminho claro para a mudança de cultura: estabelece o ser humano no centro da estratégia e conecta inovação à realidade das pessoas. Não é apenas implementar novas tecnologias, mas antes de tudo, adotar uma nova mentalidade.
Segundo a própria Nielsen Norman Group “User experience is about creating value by focusing on people’s needs, not just business goals.” Na era da Indústria 5.0, essa visão ganha ainda mais relevância: o design centrado no ser humano é, hoje, o caminho mais sólido para uma inovação com impacto real. Se sua organização ainda enxerga o UX apenas como uma etapa de entrega, talvez seja hora de ampliar o olhar.
Incorporar o design como parte da estratégia não é opcional. É essencial para quem busca relevância, agilidade e impacto em um mundo cada vez mais conectado às necessidades humanas.
Referências
- Pandey, S. (2024). Focus of Industry 5.0. University of Bergen. Disponível em: ResearchGate
- IBM Design. (n.d.). Sponsor User Program Overview. Disponível em: IBM Design
- Nielsen Norman Group. (n.d.). User Experience Defined. Disponível em: NN/g
- Nielsen Norman Group. (2024). What Happens to UX Jobs with AI? Disponível em: NN/g
- BEHERA, Bibhu Santosh. Industry 5.0 – The future of industrial automation. International Journal of Management, Technology, and Social Sciences (IJMTS), v. 5, n. 2, p. 71–77, 2020. DOI: 10.5281/zenodo.4311577. Disponível em: ResearchGate.
- EUROPEAN COMMISSION. Industry 5.0: Towards a sustainable, human-centric and resilient European industry. Brussels: Directorate-General for Research and Innovation, 2021. Disponível em: European Commission PDF.