Em meados de 2019, Paul Polman, ex-CEO global da Unilever, pediu aos líderes empresariais globais que fossem suficientemente “heroicos” para ajudar a viabilizar uma economia livre de carbono e a reduzir desigualdades.
Temos novas ameaças virais à espreita, a crise climática bate no pescoço e se prevê todo um conjunto novo de problemas sociais. Dá tempo?
Bem, em 2020, companhias fizeram em cinco meses o que levariam cinco anos fazendo. Como diz Hugo Bethlem, do Instituto Capitalismo Consciente Brasil (ICCB), a Covid-19 pode não ter sido um “game changer”, mas foi um “game accelerator”.
O heroísmo de poucos líderes não bastará, mas uma ação coordenada de mudança, talvez. Já há um MVP para observarmos e não são os EUA; é o Reino Unido. Faz quatro anos que, ainda sob o governo conservador de Theresa May, o regulador local começou a impor a agenda ESG aos investidores institucionais. As exigências aumentam, fundos de pensão e seguradoras se adaptam, empresas seguem o exemplo. E a Europa continental vai atrás.
O que ocorre se o Brasil não for a Europa amanhã, parodiando o velho anúncio? Fica sem dinheiro de longo prazo. Veja como sua empresa pode acelerar a própria agenda ESG e estar pronta para o que vier.
## Mais tecnologia e dados
1 – Não há como agilizar esforços ESG sem ajuda da tecnologia. Só equipes mistas de humanos e máquinas conseguirão coletar e analisar todos os dados de dentro da empresa, cruzá-los com todos os dados de seus stakeholders-
-chave, e recomendar como agir em relação a isso na direção dos 17 ODS. A tecnologia ainda facilita a criação de mecanismos para os stakeholders terem voz na supervisão e na tomada de decisões da empresa, o que é uma premissa ESG.
É fundamental, contudo, ter humanos atentos para evitar vieses do tipo antidiversidade nos algoritmos. Quem faz o alerta é Claudinei Elias, fundador e CEO da empresa de tecnologia e dados para gestão de governança e riscos Bravo GRC.
## Proximidade com as gerações mais jovens
2 – Os mais velhos, como baby-boomers e a geração X, sensibilizam-se relativamente pouco com as letras E, S e G. Os millennials (nascidos de 1980 até o fim dos anos 2000) são mais receptivos ao tema e os representantes da geração Z (de 1995 para cá) tendem a ser os grandes aliados dos líderes na causa da sustentabilidade, quando não os protagonistas do processo. Garantir funcionários, fornecedores e clientes nessa faixa etária é particularmente útil.
Como definiu uma pesquisa Box1824, os Z são “comunaholics”, ou seja, transitam por múltiplas comunidades, fazendo a conversa horizontal de que o ESG tanto precisa. Aliás, eles também são definidos como conversadores, conciliadores e avessos à polarização desmedida dos millennials.
Sendo a primeira geração que nunca viveu sem internet, os Z são hipercognitivos, usando a tecnologia e o conhecimento disponível para antecipar e corrigir problemas (previstos ou não) – o que costuma ser excelente para a atuação em ESG. E o maior encaixe de todos: na visão dos Z, as empresas têm de ser “radicalmente éticas”.
## Foco maior na cadeia de fornecimento
3 – Todos os stakeholders de uma empresa são importantes num esforço ESG, mas, para fazer as coisas andarem mais rápido, é preciso voltar-se para os fornecedores. Por duas razões: (1) são esses os relacionamentos que a maioria das empresas costuma negligenciar mais – é muito comum as contratações serem feitas com base somente no menor preço, por exemplo – e (2) fornecedores estão entre os pontos de maior vulnerabilidade de qualquer negócio, sobretudo na cada vez mais hegemônica arquitetura de ecossistema, em que a empresa se cerca de parceiros e terceirizados.
Reveja logo todos os seus fornecedores e garanta que tenham sido escolhidos, e sejam mantidos, com base na qualidade do serviço (SLA) e não no preço. Assegure que os prazos de pagamento praticados sejam dignos – algumas empresas levam meses para pagar. Construa com eles um modo de trabalhar colaborativo, e não o “eu pago, eu mando”. Lembre: não basta obrigar seu fornecedor a assinar o termo de compliance; tem de participar.
## CURIOSIDADE even over PROPÓSITO; CONVERSA even over CONTROLE
4 – Já falamos bastante neste Dossiê sobre os perfis das pessoas que trabalham num departamento de ESG. Mas há características que sobressaem em relação às demais, segundo especialistas ouvidos por HSM Management. Uma é a curiosidade, que faz uma pessoa correr atrás do aprendizado. Como a área é relativamente nova e está em constante mudança, profissionais curiosos são fundamentais, na visão de Elias. Mais que especialistas. Mais que gente com um propósito pessoal que esteja alinhado com a função. “ESG é muito mais importante do que abraçar árvore”, ele brinca. A outra qualidade de destaque é a capacidade de conversar, na visão de Bethlem, porque em ESG tudo é negociado, dentro e fora da empresa. Por isso, inclusive, a área de controle, com estatísticos nerds, não deve ser a protagonista do ESG.
## De baixo para cima, para um lado e para o outro
5 – Se tem uma lei que rege o mundo corporativo, é a lei da gravidade. O que vem de cima, determinado pela liderança, tem mais chance de ser realizado por todos. Mas algo que acelera a transição ao ESG é haver movimentos também de baixo para cima e lateralmente.
Cuide para que os funcionários sejam evangelizados em ESG – eles e, se possível, suas famílias. Esses colaboradores é que defenderão o ESG perante os colegas de outros departamentos, os stakeholders externos e seus superiores.
## ESG igual a RH E MARKETING
6 – Bethlem, do ICCB, faz uma conta curiosa: se o time de liderança de uma empresa for maior que o número de funcionários das áreas de sustentabilidade, RH e marketing, é um indicativo de que consciência não é o forte do pessoal. Essas três áreas são as que lidam com os principais stakeholders. E há uma lição adjunta a tirar dessa lógica: o departamento do ESG deveria ter status similar ao de RH e marketing – orçamento, reporte, recursos…
## Líderes conscientes e coerentes
7 – Um líder pode “nascer’ consciente ou tornar-se. O ICCB, por exemplo, faz uma certificação de líderes conscientes. Mas não é um curso que se possa comprar; o líder deve ser tornar elegível a ele, percorrendo toda uma jornada. Nem Larry Fink, do BlackRock, escapa da cobrança de coerência. Apesar de ser um defensor do ESG, Fink falha no G de governança, segundo os observadores, ao ocupar os cargos de CEO e chairman da sua empresa; ele acumula poder.