Não é surpresa para ninguém que a natureza imprevisível do ambiente em que os executivos atuam hoje demanda um raciocínio cada vez mais ágil. Diante disso, proponho uma visão nova sobre as diferenças entre o pensamento tradicional, mais linear, e a abordagem “esportiva” que se requer hoje em dia: “surfar”e “mergulhar”.
**SURFAR**
A ideia de surfar está relacionada com o aprendizado que acontece na superfície. Trata-se de dar sentido ao que vemos, com base em dados e fatos, e criar uma série de respostas e ações suficientemente claras. Implica o aprendizado de coisas de fácil compreensão e é instrumental. A jornada é relativamente segura.
**MERGULHAR**
O conceito de mergulhar, por sua vez, exige nos aprofundarmos abaixo da superfície. Trata-se de dar sentido aos dados e, com base em informações, experiências e situações, chegar a nossas próprias conclusões. Implica explorar o desconhecido, o território onde faltam respostas, cujas fronteiras não estão claras. A aventura do conhecimento parece indefinida (e, assim, mais arriscada).
No surfe, o aprendizado se baseia no conceito de que saber “o quê” e “como” nos possibilita resolver problemas. Isso porque controlamos nosso ambiente agindo sobre ele. No ambiente organizacional, esse domínio está relacionado com as atividades do dia a dia, mais transacionais. Quando surfamos, fazemos previsões sobre fatos observáveis (que podem se mostrar corretas ou incorretas), estabelecemos relações de causa e efeito e solucionamos problemas. O porém é que, em um ambiente caracterizado pela incerteza, o pensamento estratégico reduzido a um modelo do tipo “surfar” acaba aprisionando e dificultando a criação de valor.
O mergulho serve como contrapeso à visão reducionista do surfe, uma vez que convida todos a identificar, testar, desafiar, refinar e, possivelmente, alterar os parâmetros de referência. Com frequência, embarcamos em soluções sem examiná-las criticamente, testando ou desafiando seus parâmetros. Adotar avidamente soluções prematuras tende a reforçar os mesmos tipos de pensamento, descartando as opiniões criativas ou divergentes. O aprendizado baseado no mergulhar exige que se expandam ou se mudem os parâmetros de referência. Divergências e oposições podem ser gatilhos especialmente úteis para esse tipo de aprendizado, por provocarem a reflexão crítica, a investigação e o diálogo. O resultado pode ser uma mudança mínima ou, no outro extremo, uma transformação total.
> No ambiente organizacional, os profissionais que se dedicam a pensar a estratégia podem escolher qual dos dois tipos de aprendizado empregar. O nome que se dá a cada um deles não é importante: o que faz diferença é desenvolver as capacidades cognitivas necessárias para explorar as diferentes opções, a fim de apoiar os requisitos da estratégia.
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> Essa contraposição entre surfar e mergulhar ecoa no conceito de “aprendizado transformador”, do sociólogo Jack Mezirow, especialista em educação de jovens e adultos [e também em Paulo Freire].
**O PAPEL DOS PARÂMETROS NA ELABORAÇÃO DA ESTRATÉGIA**
A maneira pela qual estruturamos determinado assunto ou fato define a que estamos dando mais atenção. De todo lugar a que vamos na vida, saímos com um conjunto de parâmetros mentais que influenciam a forma de estruturar nosso pensamento. As organizações também possuem seus parâmetros, que ensinam, reforçam, recompensam e aplicam nas reuniões sobre estratégia, tanto formal como informalmente.
Esses parâmetros são passados adiante por meio de protocolos, políticas corporativas e canais de comunicação e contribuem para a interpretação subjetiva dos acontecimentos. Por exemplo, pode-se olhar uma atividade pelo parâmetro funcional ou enxergar o mesmo problema pela perspectiva econômica, em que todas as decisões são avaliadas de acordo com seu custo e valor financeiro para os negócios. Várias rodadas de perguntas sobre dados, posições e recomendações a respeito dos problemas estratégicos, assim como a escuta atenta, acompanhada de investigações adicionais, podem ser valiosas para identificar e explicitar parâmetros escondidos e pressupostos subjacentes.
**PROBLEMA:** Temos a tendência de reunir dados que se encaixam nos parâmetros existentes ou habituais, o que perpetua as mesmas estruturas de pensamento.
Veja 3 erros que devem ser evitados:
**Erro 1 -** **Restringir o grupo que lida com a estratégia**
Limitar as discussões de estratégias a um pequeno e seleto grupo é uma tentação; é mais fácil reunir cabeças semelhantes e excluir aquelas cujos parâmetros possam ser significativamente diferentes
Um líder, no entanto, tem de resistir à tentação. Você deve identificar as ideias habituais das reuniões de estratégia e buscar outras referências e estruturas de pensamento que podem ser valiosas e têm sido excluídas.
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**Erro 2 – Cercar-se de profissionais leais com pensamentos semelhantes**
É claro que a lealdade tem de ser recompensada. Mas deve ser também desafiada. Se a lealdade a uma pessoa, a um produto, a uma marca ou a uma organização leva ao reforço das mesmas estruturas de pensamento, isso tende a afetar negativamente a discussão da estratégia.
É possível observar esse ponto de vista estreito em muitas situações, especialmente em épocas de urgência e desespero, quando os executivos estão freneticamente em busca de novas estratégias. A lealdade bem-intencionada mas cega sabota o pensamento estratégico.
> A capacidade de surfar e mergulhar ao mesmo tempo diferencia os pensadores estratégicos mais poderosos do restante.
**Erro 3 – Chegar a falsas mudanças de parâmetros**
Isso acontece quando se acredita que uma transformação ocorreu, mas, na verdade, é apenas uma ilusão. Algumas vezes, ficamos tão encantados com a participação em uma reunião sobre estratégia que não prestamos atenção à real variedade de pontos de vista à mesa ou ao grau de envolvimento genuíno.
**Agora, veja algumas sugestões para estimular a mudança de estrutura de pensamento e, como resultado, o aprendizado baseado em mergulhar:**
• Varie a composição dos grupos dedicados às discussões estratégicas para aumentar a exposição a novos parâmetros.
• Mude o local das reuniões para criar um elemento-surpresa.
• Convide pessoas de fora da empresa ou do grupo de discussão estratégica para trazer diálogos e apresentações provocadores.
• Interaja com pessoas comuns, que não são especialistas em seu setor de atividade, e também com acadêmicos, políticos, profissionais de outros campos de atuação, pessoas de diferentes idades, de extremos da pirâmide social e de grupos étnicos e culturais diversos do seu.
• Ao participar de reuniões sobre estratégia, registre os parâmetros representados à medida que os vários pontos de vista são apresentados.
• Observe se falta algum ponto de vista que pode agregar valor à discussão da estratégia.
É impressionante o número de executivos com atuação mundial que desenvolveram ou estão desenvolvendo negócios nos mercados emergentes e não possuem sequer um conhecimento rudimentar (ou mesmo interesse) sobre referências históricas, culturais, sociais, militares ou políticas daquelas regiões.
Eles não apenas são ignorantes em relação a essas referências, como afirmam que elas são irrelevantes e supérfluas. O fato é que incluir dados e pontos de vista diversos nos diálogos sobre estratégia se torna cada vez mais essencial para manter a vantagem competitiva. Ignorar parâmetros que não os próprios faz com que surjam pontos cegos com impacto danoso sobre os negócios no longo prazo.