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A IoT na língua do valor

Não olhe para a internet das coisas com os olhos de um programador ou designer; adote a perpectiva business – de criar valor e de encontrar um modelo de negócio
É consultor especializado em internet das coisas e autor do livro Como usar a internet das coisas para alavancar seus negócios, lançado em 2018, em cujos highlights se baseia este artigo.

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> **Saiba mais sobre Bruce Sinclair**
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> “A internet das coisas é apenas uma evolução da internet.Nada além disso. No entanto, as ramificações da IoT em termos de negócios produzirão efeitos revolucionários e lançarão as bases da “economia de resultados, a outcome economy, em inglês. A compra e a venda de resultados exercerão impactos profundos no seu setor, organização e produtos. Por isso é que a IoT é fonte de tanto entusiasmo e exagero. Bilhões de sensores! Trilhões de dólares! […] E, apesar do sensacionalismo, a internet das coisas é real.”
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> Assim, Bruce Sinclair começa o livro Como usar a internet das coisas para alavancar seus negócios, lançado no segundo semestre de 2018 pela editora Autêntica Business no Brasil. Sinclair começou no negócio de IoT em 2008, como CEO de uma empresa que vendia uma plataforma de capacitação de casas inteligentes para provedores de serviços de internet. Ele começou a carreira como matemático e depois foi programador, mas rapidamente direcionou suas atividades de negócios para marketing, área em que chegou a CEO de empresas dos setores de computação visual e tecnologia da informação.
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> Hoje, Sinclair, que mora na Califórnia, EUA, é editor de um site sobre IoT, o www.iot-inc.com, e oferece consultoria em estratégia para essa tecnologia, além de proferir palestras, cursos e workshops a respeito.

A internet das coisas (IoT, na sigla em inglês) talvez ainda lhe pareça futurista, mas não é. Ela pode ser usada aqui e agora em seu produto e em sua empresa para aumentar seu valor e sua competitividade. Mas, como é algo novo, devemos compreender como ela funciona antes de aplicá-la. 

Em princípio, um produto IoT é um sistema de sistemas. Como a internet das coisas ainda está sendo padronizada, ao desenvolver um produto IoT uma empresa geralmente precisa de um ou dois tipos de parceiros para ajudar suas equipes de engenharia internas a integrar todos os sub-sistemas.

Geralmente, os parceiros são integradores de sistemas e escritórios de design. Ao construir ambientes como edifícios inteligentes, por exemplo, trabalhamos com integradores de sistemas. Ao criar produtos, como secadoras de roupas, trabalhamos com escritórios de design. Mas nossa dependência desses parceiros diminuirá na medida em que a tecnologia IoT amadurecer e se padronizar.

Esses dois prestadores de serviços são novos em IoT, e naturalmente a abordam com base em sua experiência e seu conhecimento. Os integradores  veem a tecnologia de IoT como um “networking stack”, ou “pilha de rede”, o que é, de certa maneira, simplesmente um mapa de protocolos. E o mapeamento de protocolos, desde a origem dos dados dos sensores até o uso dos dados pelo aplicativo, é a maneira absolutamente errada de encarar a tecnologia – pelo menos em termos de negócios, por não ser fonte de valor. 

Os designers perguntam: “Quais são os pontos de contato do usuário final?”, “Qual é a interface de back-end com o cliente?”, “Como customizar o produto para que atenda a ambas as necessidades?”. Eles encaram a tecnologia de IoT como front-end, back-end e uma infraestrutura habilitadora entre ambos. É uma abordagem um pouco mais próxima do valor, mas ainda não é a ideal.

O que eu proponho é uma visão de negócios, que organize a tecnologia de IoT em quatro partes:

> 1. produto definido por software,
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> 2. produto definido por hardware,
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> 3. sistemas externos, e
>
> 4. tecido da rede.

E ainda há, permeando todo o sistema, a cibersegurança de IoT, que precisa ser mais ampla que a segurança de tecnologia da informação (TI), porque protege dados em repouso e em movimento, exigindo conhecimentos de segurança móvel, de rede, de aplicativos, de web e de nuvem, e de sistemas. 

É como uma gestão de riscos nos negócios. 

Todo o valor a mais de um produto IoT decorre da transformação dos dados em informações úteis. Os ingredientes dessas informações são dados – vindos dos sensores dos produtos e de sistemas externos. O que define como os dados são reunidos é o cibermodelo (algoritmo de software que é compartilhado por meio do aplicativo e da análise de dados). Por sua vez, o aplicativo executa o modelo – fornece a lógica do produto, coordena o conjunto de dados e interage com outros aplicativos, serviços e pessoas. E a análise de dados usa esses dados para construir, comparar e resolver o modelo.

O modo de criar valor com IoT é executar o cibermodelo com o aplicativo e “interrogá-lo” com a análise de dados. Essa visão do fim para o começo – em que o valor define a informação necessária e esta define os dados necessários – é a melhor maneira de ver a tecnologia de IoT para negócios. Repetindo, com outras palavras, o trio do valor em IoT é “cibermodelo – aplicativo – análise de dados”.Todas as outras tecnologias envolvidas servirão só para coletar e entregar dados. Se o leitor entender essa perspectiva de valor, o resto será mais fácil. 

Agora, detalhemos as partes:

O produto definido por software é a estrela do espetáculo, pois é o que gera valor. Consiste de vários modelos e de vários aplicativos.Talvez seja útil encará-lo como o gêmeo digital do produto físico – o software que descreve a funcionalidade do produto do ponto de vista de IoT. Pense em um videogame esportivo, em que os jogadores dos dois times são definidos por software. Os cibermodelos representam a personalidade e as habilidades de cada jogador. O aplicativo do jogo controla o I/O (input/output) e executa o modelo em várias situações e ambientes.

O produto definido por software e a análise de dados geram todo o valor em produtos IoT. Assim, eles têm de ser a prioridade do gestor e devem orientar todas as outras escolhas. Eles também dão a dica de quais know-hows internos devem ser cultivados pela empresa – desenvolvimento de software e ciência de dados.

O produto definido por hardware, por sua vez, consiste em sensores, acionadores e sistemas embarcados. Pense no sistema de freios ABS do seu carro: os sensores reconhecem quando o freio é ativado e, se a roda travar, o sistema embarcado coletará os dados dos sensores e os enviará para a rede do freio – aí os acionadores atuarão no sentido contrário, acionando o freio com base nos dados recebidos.

Os sistemas externos são aqueles com os quais o produto IoT se integra pela internet para aumentar suas funcionalidades. Fornecem dados externos para complementar os internos, coletados pelos sensores de produtos. A análise de dados significa, basicamente, responder a perguntas. Ela decifra dados do passado para esclarecer coisas como “o que aconteceu?”. E faz previsões sobre o futuro, para sugerir “o que vai acontecer”. A análise de dados constrói, melhora e resolve modelos, e faz comparações – entre vários modelos, e entre modelos e dados.

Os produtos IoT se integram ainda com sistemas como CRM, ERP e SCM, para trocar dados da empresa e também com outros produtos IoT.

O tecido de rede é o que entrelaça tudo, incluindo as redes de TO (tecnologia de operações) e de TI (tecnologia da informação) e a nuvem, pública ou privada. A rede de TO é a instalada dentro do produto IoT, que recebe e envia dados para os sensores e acionadores, enquanto a rede de TI é externa ao produto IoT. Ela se conecta com a rede de TO, geralmente por meio de ondas de rádio, e a liga à internet, por uma conexão uplink. 

A comunicação é realizada por protocolos na networking stack, que, para IoT, inclui a camada de mídia (como bluetooth, wi-fi e celular), a camada de rede (protocolo de internet e protocolos de TO proprietários) e a camada de aplicativos (como MQTT, CoAP, DDS), pondo os dados coletados em contexto com os metadados para o aplicativo.

Geralmente, a narrativa em torno da internet das coisas é sobre coisas, uma simplificação que nos distrai de seu real sentido.Valor em IoT, como já dissemos, é criado do fim para o começo. A proposta de valor de IoT define a informação necessária, que identifica os dados a serem coletados, que, então, e só então, identifica que tecnologia e que “coisas” são necessárias. Assim, a abordagem começa com o produto definido por software e com a análise de dados, que recebe dados do produto definido por hardware e dos sistemas externos por meio da estrutura da rede.

Só que, antes de definirmos a tecnologia, precisamos primeiro definir o valor que queremos criar. E há quatro modos de criar valor com os dados coletados.

**CRIANDO VALOR**

O primeiro passo da criação de valor com IoT é a modelagem do valor, que descreve o valor incremental qualitativamente (com uma proposta de valor) e quantitativamente (com um cibermodelo). A proposta de valor aborda as contribuições do produto e é codificada, pelo cibermodelo, para ser usada pelo aplicativo e para ser executada pela análise de dados. 

É preciso fazer a modelagem do valor para cada uma das quatro maneiras de criar valor com IoT:

> 1. Tornar os produtos melhores.
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> 2. Operar melhor os produtos.
>
> 3. Dar melhor suporte aos produtos.
>
> 4. Criar melhor os novos produtos..

Tornar os produtos melhores cria valor por meio da inovação. Criar melhor os novos produtos gera valor por meio da invenção. Operar melhor os produtos cria valor por meio do aumento da eficiência operacional. Dar melhor suporte aos produtos cria valor por meio do aumento da utilização do ativo. 

São melhorias na primeira linha do balanço (receita) e na última linha (lucro) que contribuem para melhorar o desempenho financeiro da empresa (lucros e perdas), que é o objetivo final dos negócios.

Como exemplo, vamos nos concentrar no modo de fazer produtos melhores – o que pode acontecer acrescentando-lhes atributos comparáveis aos dos concorrentes, aprimorando a experiência do usuário, eliminando defeitos etc. Vamos fazê-lo da maneira mais eficaz, que é por meio da invenção e da inovação.

Pense em quem coloca uma prótese no quadril. Essa pessoa precisa fazer uma cirurgia para instalá-la e, como passo seguinte, usar uma ferramenta chamada “mandril acetabular” para modificar o diâmetro de um orifício (madrilar) na pelve, a fim de substituir o “soquete” natural da articulação. Isso é perigoso. É uma broca do tipo ralador de queijo que cria o orifício e esse deve encaixar-se exatamente com a junta artificial a ser introduzida. Acontece que o bom encaixe no procedimento é dificultado por uma reação do corpo denominada necrose. As próteses de quadril duram mais de 20 anos em média, e o motivo de 75% dos retornos é o movimento no soquete da junta, provocado por necrose. Podemos usar a IoT para reduzir essa queima de células e, portanto, reduzir a repetição de cirurgias. Então: 

A proposta de valor do mandril acetabular IoT é executar esse procedimento no menor tempo possível e manter a saúde do paciente. 

O cibermodelo, quantificador da proposta de valor, é, basicamente, uma equação, e, como tal, pode ser manipulado e resolvido de diferentes maneiras. Por exemplo, pode estimar a temperatura – que se relaciona com a velocidade de rotação do mandril, com a pressão aplicada no mandril e com a duração do tempo de perfuração do mandril.

O aplicativo, depois de determinado o modelo, precisa ter seus requisitos definidos. Usar o aplicativo para controlar (acionar) o mandril acetabular IoT significa fazer com que, não importa como o cirurgião use a ferramenta, as células ósseas nunca se queimem, mesmo que o mandril tenha que desacelerar, e até parar. Também significa que o aplicativo acelerará o mandril, se possível, para diminuir o tempo de uso da ferramenta, e, assim, reduzir a duração e o custo da cirurgia.

A análise de dados vem em seguida, quando seus requisitos são considerados. Queremos basicamente descobrir a relação causal entre os dados (sobre as variáveis que captamos para um modelo) e os eventos daí decorrentes (efeito). 

Vale observar que pode haver muitos modelos. Nesse caso, um modelo pode referir-se ao prazo para refazer a cirurgia e outro pode tratar da qualidade da saúde depois de certo intervalo de tempo. Em ambos os casos, incluímos ainda dados pessoais e demográficos, como sexo, idade, saúde, localização geográfica e outros, além das variáveis do modelo da ferramenta. 

A análise de dados preditiva pode prever se o paciente precisará de uma segunda cirurgia ou qual será o estado de saúde geral do paciente em cinco anos.

Já a análise de dados diagnóstica determina os parâmetros operacionais ótimos da ferramenta de perfuração. Para otimizar o desenho da lâmina do mandril, relacionamos a densidade das perfurações da lâmina, o tamanho delas, a forma (causa) com o tempo necessário para concluir o procedimento de mandrilagem (efeito), a fim de definir o desenho ótimo da lâmina.

E o valor gerado? Embora esse produto de internet das coisas seja usado offline, ele ainda usa o termo “internet” para criar valor. A inovação pela IoT produz uma nova classe de produtos que melhoram a eficácia da cirurgia e, ao mesmo tempo, diminuem o tempo de cirurgia, o que reduz os custos do médico e do plano de saúde.

![](https://revista-hsm-public.s3.amazonaws.com/uploads/1a06d838-bcf6-47b1-bc66-d54fce2d3a26.jpeg)

**MODELO DE NEGÓCIO**

E como a empresa ganha dinheiro com o valor que cria por meio da IoT? 

IoT B2C. Hoje, o modelo de negócio para o produto de consumo IoT é o mesmo do produto de consumo tradicional – que consiste no ato isolado e consumado da compra do produto. O modelo de negócio de IoT B2C precisa ser mudado, e parece que a mudança virá de pelo menos duas maneiras diferentes: vender dados e vender serviços. Num caso, anunciantes, seguradoras e qualquer empresa que venda algo para os mesmos consumidores de um produto IoT estão ansiosas para ter informações pessoais identificáveis de seu mercado-alvo. No outro, o preço do produto IoT pode ser amortizado no prazo de um contrato de serviço, como parte da compra do produto – algo que já acontece com os smartphones.

IoT B2B. Nessa seara, a IoT possibilitará inovações de modelo de negócio como nunca vimos antes, resultando em milhares de modelos de negócio diferentes. Mas os modelos de negócio realmente valiosos serão, em grande parte, de cinco classes de modelos de negócio, e o natural será as empresas evoluírem de uma ponta desse espectro à outra – percorrer esse continuum será o padrão.

Um extremo do continuum é o produto – a empresa o vende e a monetização se baseia na transação. No outro lado do espectro está o modelo atrelado a resultados. Significa vender um resultado (uma cirurgia bem-sucedida, a distribuição de energia confiável e eficiente, o tempo ativo para as máquinas de mineração); aí a monetização se liga à qualidade da entrega do resultado. 

**ECONOMIA DE RESULTADOS**

Talvez o maior impacto da IoT nos negócios seja o alinhamento mais estreito dos interesses de fornecedores e clientes. Isso já compensa pela maior eficiência na criação de valor, mas suas consequências irão mais longe. É um marco da economia de resultados.

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