Embora a “carreira” seja o sonho de muitos profissionais, você se surpreenderá com as definições dos dicionários: caminho estreito, vereda, trilho. Parece algo limitante, não? A reflexão que fica é: alguém realmente quer (ou pode) ficar preso a um trilho neste mundo fluido e de fantásticas transformações em que vivemos?
Não estou defendendo que não tenhamos um plano de educação, carreira e vida. Pelo contrário, em um mundo de inúmeras e mutantes possibilidades, no mínimo devemos pensar futuros no plural e, consequentemente, vislumbrar “carreiraS”. O Future of Jobs Report 2023, recém-divulgado pelo World Economic Forum, destaca as crescentes transformações nas ocupações, com estimativa de 23% de churn estrutural no mercado de trabalho nos próximos cinco anos, além de apontar as disrupções nas competências exigidas dos profissionais do futuro, com a estimativa média de alteração de 44% delas nos próximos cinco anos.
Estamos migrando da vida sequencial do “estude 20 anos, trabalhe 30 anos e se aposente”, para a vida da coexistência harmoniosa entre lifelong learning, trabalho e bem-estar. Os autores do livro *The 100-year life* já chamavam a atenção para tal transformação e para as quatro a seis carreiras que a geração Z, por exemplo, tende a ter ao longo da vida.
Dado tal cenário, meu convite é para que vislumbremos nossos futuros desejáveis, como sociedade e indivíduos, e, ao trazê-los a valor presente, possamos desenhar e planejar nossos mapas de competências estruturantes e impacto. Alguns headhunters, como por exemplo Joseph Teperman, chegam a usar o termo “anticarreira” para representar tais “projetos” de atuação futura flexível, combinada com propósito, bem-estar, adaptabilidade às circunstâncias e capacidade de aprender ao longo da vida. Letramentos tecnológicos e em megatendências são de grande valia nesse sentido.
Temos que ter claro que o profissional do amanhã é aquele capaz de conectar áreas sinérgicas e identificar oportunidades inexploradas nas interfaces, ou além das fronteiras, dos domínios isolados do saber. Vejam quão multi e transdisciplinares são soluções para veículos autônomos, robótica inteligente, agricultura de precisão, interação humano-máquina na era da inteligência artificial (IA) generativa, entre outros exemplos – são combinados conhecimentos computacionais, das engenharias, da genômica, até da ética e das relações sociais. Ou seja, os maiores mercados das próximas décadas não são plenamente conhecidos, assim como os profissionais. E o mundo atual, incluindo os novos modelos de trabalho e a ubiquidade tecnológica como extensão das potencialidades humanas, é um convite a uma expansão de perspectivas no que se refere à atuação profissional e qualidade de vida.
Não se trata de ser especialista ou generalista. Caso não conheça o termo, vale pesquisar sobre as características do profissional “nexialista”, aquele capaz de mapear os contextos acima comentados, estabelecendo relações entre as transformações do mundo em diferentes áreas, tendências e oportunidades em termos profissionais e de mercados. Junto de uma sólida educação formal e da disciplina para o lifelong learning, esse profissional é capaz de se aprofundar no que se mostrar necessário e desenvolver competências e habilidades únicas que serão fundamentais e desejadas pelos mercados emergentes.
Tudo isso estimula a olharmos para nosso íntimo e fazermos a seguinte reflexão: o que eu tenho, ou preciso ter, de único, que vai ser altamente desejado e impactará as tendências e demandas da humanidade até 2030, 2040 ou 2050? É a partir daí que agiremos no desenho de futuros desejáveis, mapas de competências e permaneceremos relevantes para muito além da IA ou das disrupções exponenciais, com empatia para avançarmos sustentavelmente como sociedade, mas especialmente com brilho nos olhos, curiosidade e coragem para as necessárias e fluidas transformações pessoais. Teremos em mãos uma bússola atemporal para a maximização do binômio desafio-competência, restando calibrá-la por nossa visão de felicidade. Fica o convite a auspiciosos projetos multicarreira.