CONTAGEM REGRESSIVA COM HELENA BERTHO

Conversas como fonte de coragem e transformação

Reconhecida em 2022 como uma das cem pessoas afrodescendentes mais influentes do mundo abaixo dos 40 anos, pelo Mipad - Most Influential People of African Descent, Helena Bertho, diretora global de diversidade e inclusão do Nubank, crê que D&I depende muito de conversas que transformam
Sandra Regina da Silva é colaboradora de HSM Management.

Compartilhar:

### 5 – Se eu te pedisse para listar as lutas que exigem mais coragem no meio corporativo, você listaria o esforço de diversidade e inclusão (D&I). Por quê?
Diversidade é um tema muito aquecido dentro de um contexto específico – o da inovação na perspectiva do negócio. E, como é uma consolidação de discussões que começaram lá atrás, não dá para dizer que seja uma tendência ou moda, o que talvez facilitasse. Diversidade é sobre pessoas, e pessoas não estão na moda; elas existem. A gente precisa endereçar as questões das pessoas sem isso ser tendência ou indo além da inovação. Há necessidade de termos intencionalidade e esforço para endereçar isso da melhor maneira – coragem ajuda, sim.

### 4 – Quais seriam essas questões a endereçar?
Posso citar algumas. Por exemplo, organicamente, se nada for feito, mulheres alcançarão equidade salarial e de posição profissional em relação aos homens em 132 anos, aponta o Global Gender Gap Report 2022 do Fórum Econômico Mundial (WEF). Embora representem quase 30% da população, as mulheres negras ainda são minoria nas empresas de tecnologia do Brasil e ocupam apenas 11% dos cargos no setor, segundo dados compilados em pesquisa da PretaLab. Os efeitos dessa distorção são gritantes: em 2020, segundo o Dieese {Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos}, às mulheres negras foram impostos ganhos 48% menores e quase o dobro da taxa de desemprego na comparação com homens não negros. Então, parte dessas questões passa por acesso a oportunidades.

### 3 – Há uma sensação muito forte de D&I ser mais discurso do que prática. Pergunto: sem coragem para colocar pessoas diferentes na sala, e sem essas pessoas terem coragem de dar ideias diferentes, dá para inovar?
Acho que não. Uma pergunta que devemos fazer é: quem está na sala na hora de tomar as decisões e desenhar o futuro? Se chega numa mesa e está todo mundo concordando, alguma coisa está errada. Não é possível inovar em ambientes sem pluralidade, sem perspectivas distintas, sem diversidade.

De acordo com um novo relatório da Accenture, as empresas americanas deixam de ganhar anualmente US$ 1,05 bilhão por não terem culturas de trabalho inclusivas. Isso é impulsionado pelo custo das altas taxas de rotatividade, baixa produtividade e baixo envolvimento dos colaboradores; e, adiciono, pela perda de oportunidades de negócios pela desconexão com os consumidores.

Algumas pesquisas já mostram que 52% das pessoas negras têm maior tendência a comprar de empresas que mostram pessoas como elas nas propagandas e 74% do público LGBTQIA+ prefere comprar de empresas que apoiam a diversidade, segundo o Opinion Box Consumer Trends 2023.

### 2 – Você consegue ver uma evolução nos processos de atração e retenção de grupos minoritários nas empresas brasileiras?
Há, sim, uma evolução e uma intencionalidade cada vez maior. O que precisamos é acelerar essas mudanças. Afinal, estamos em 2023. D&I é uma jornada, é um processo constante para que consigamos reduzir a cada ano as estimativas orgânicas de equiparação. Vale ressaltar que, além de atrair talentos diversos, também é importante conseguir retê-los, criando um ambiente onde se sintam bem-vindos, pertencentes, seguros.

### 1 – A quem cabe ter a coragem de enfrentar as tradições, na causa de D&I: à empresa, aos líderes do alto escalão, aos integrantes da área de pessoas, aos grupos de baixa representatividade no ambiente de trabalho… Ou é algo tão bom a se fazer que deveria prescindir de coragem?
Todos devem ser responsáveis por levar adiante essa agenda. Cada um em seu papel. Líderes têm a possibilidade e a responsabilidade de apontar a direção e a velocidade e de acelerar esse processo em suas organizações e setores. As áreas de RH são compostas de especialistas que tecnicamente têm a expertise necessária para pensar produtos e soluções. As pessoas que fazem parte dos grupos sub-representados devem dar contribuições – e ser ouvidas e valorizadas. Eu costumo dizer que D&I não é (ou não deveria ser) somente uma área, mas um mindset, que deve estar embarcado na cultura e em todas as áreas de uma organização.

Agora, o racional é forte, tem razão. Precisamos pensar que um time plural e mais diverso tende a ter performance melhor. Precisamos pensar que o impacto social gerado por uma organização mais diversa é maior. Ter diversidade e inclusão é o certo a fazer e é o melhor para os negócios.

__Leia também: [A “assustadora” estrada para a criatividade](https://www.revistahsm.com.br/post/a-assustadora-estrada-para-a-criatividade)__

Artigo publicado na HSM Management nº 160.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Organização

A difícil arte de premiar sem capitular

Desde Alfred Nobel, o ato de reconhecer os feitos dos seres humanos não é uma tarefa trivial, mas quando bem-feita costuma resultar em ganho reputacional para que premia e para quem é premiado

ESG
Adotar o 'Best Before' no Brasil pode reduzir o desperdício de alimentos, mas demanda conscientização e mudanças na cadeia logística para funcionar

Lucas Infante

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
No SXSW 2025, a robótica ganhou destaque como tecnologia transformadora, com aplicações que vão da saúde e criatividade à exploração espacial, mas ainda enfrenta desafios de escalabilidade e adaptação ao mundo real.

Renate Fuchs

6 min de leitura
Inovação
No SXSW 2025, Flavio Pripas, General Partner da Staged Ventures, reflete sobre IA como ferramenta para conexões humanas, inovação responsável e um futuro de abundância tecnológica.

Flávio Pripas

5 min de leitura
ESG
Home office + algoritmos = epidemia de solidão? Pesquisa Hibou revela que 57% dos brasileiros produzem mais em times multidisciplinares - no SXSW, Harvard e Deloitte apontam o caminho: reconexão intencional (5-3-1) e curiosidade vulnerável como antídotos para a atrofia social pós-Covid

Ligia Mello

6 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo de incertezas, os conselhos de administração precisam ser estratégicos, transparentes e ágeis, atuando em parceria com CEOs para enfrentar desafios como ESG, governança de dados e dilemas éticos da IA

Sérgio Simões

6 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Os cuidados necessários para o uso de IA vão muito além de dados e cada vez mais iremos precisar entender o real uso destas ferramentas para nos ajudar, e não dificultar nossa vida.

Eduardo Freire

7 min de leitura
Liderança
A Inteligência Artificial está transformando o mercado de trabalho, mas em vez de substituir humanos, deve ser vista como uma aliada que amplia competências e libera tempo para atividades criativas e estratégicas, valorizando a inteligência única do ser humano.

Jussara Dutra

4 min de leitura
Gestão de Pessoas
A história familiar molda silenciosamente as decisões dos líderes, influenciando desde a comunicação até a gestão de conflitos. Reconhecer esses padrões é essencial para criar lideranças mais conscientes e organizações mais saudáveis.

Vanda Lohn

5 min de leitura
Empreendedorismo
Afinal, o SXSW é um evento de quem vai, mas também de quem se permite aprender com ele de qualquer lugar do mundo – e, mais importante, transformar esses insights em ações que realmente façam sentido aqui no Brasil.

Dilma Campos

6 min de leitura
Uncategorized
O futuro das experiências de marca está na fusão entre nostalgia e inovação: 78% dos brasileiros têm memórias afetivas com campanhas (Bombril, Parmalat, Coca-Cola), mas resistem à IA (62% desconfiam) - o desafio é equilibrar personalização tecnológica com emoções coletivas que criam laços duradouros

Dilma Campos

7 min de leitura