Cultura organizacional

O desafio da governança no agronegócio

Protagonista do crescimento da nossa economia, o agronegócio brasileiro precisa superar o gargalo da governança para garantir a sua perpetuidade. Esse processo leva de cinco a dez anos para acontecer e não pode mais ser postergado
É sócio-proprietário da Cedar Tree Family Business Advisors e da Consilium Family Office Advisros. Graduado em gestão de recursos humanos e mestrado em consulting and coaching for change pela INSEAD Business School, na França, trabalhou por mais de 20 anos como executivo no conglomerado de empresas de sua família. Especialista em governança Familiar e no desenvolvimento da família empresária, cursou diversos programas como parceria para o desenvolvimento do acionista-PDA e desenvolvimento de conselheiros-PDC, pela Fundação Dom Cabral-FDC. É certificado internacionalmente em Family Business advisor pelo Family Firm Institute-FFI, de Boston (USA). É fundador do Fórum Brasileiro da Família Empresária-FBFE.

Compartilhar:

A importância econômica e social do agronegócio brasileiro é inquestionável. Há décadas o setor tem sido protagonista da expansão do Produto Interno Bruto (PIB), gerando renda e milhões de empregos país afora. Graças ao agronegócio, o saldo comercial brasileiro tem sido positivo nos últimos anos e o mundo reconhece no Brasil um grande player.

Em 2020, a participação do setor na fatia do PIB nacional aumentou para 26,6% (24,31% em 2019), segundo dados da [Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea)](https://www.cepea.esalq.usp.br/br/pib-do-agronegocio-brasileiro.aspx), considerando toda a cadeia – produção dentro das fazendas, insumos, agroindústria e serviços.

Pois por trás desse mercado pujante estão empresas familiares. Estima-se que cerca de 90% da produção agrícola e pecuária são provenientes de empresas familiares, o que não significa, claro, que sejam famílias empresárias. De acordo com a lista de bilionários brasileiros publicada em 2021 pela [revista *Forbes*](https://forbes.com.br/forbes-money/2021/09/40-bilionarios-das-cadeias-produtivas-do-agronegocio-brasileiro/), dos 315 integrantes, 40 estão ligados ao agronegócio, o que dá uma ideia da representatividade do family business no agronegócio.

A despeito dos desafios vencidos no front tecnológico e da produtividade – em 30 anos, a produção aumentou 346% enquanto a área plantada com grãos cresceu 74% –, o agronegócio brasileiro ainda precisa vencer outro desafio: o da governança. Ou não vai garantir a perpetuidade dessa competitividade global.

## O segundo maior gargalo
Para o país continuar sendo considerado uma ilha de prosperidade no agronegócio e contribuir para a produção mundial de alimentos, atendendo às necessidades de segurança alimentar, a governança das empresas familiares precisa ser aprimorada. Esse é o caminho para que o family business do agronegócio escape das cruéis estatísticas, que mostram que apenas 3% das empresas familiares vão além da quarta geração.

Governança, o “G” na agenda ESG (sigla em inglês de ambiental, social e governança), é o segundo maior gargalo do agro brasileiro, ficando atrás apenas da infraestrutura. Essas informa vêm do levantamento de 2020 da [Associação Brasileira do Agronegócio (Abag)](https://abag.com.br/).

(Isso não significa que os aspectos relacionados ao meio ambiente e ao social já estejam resolvidos, que fique claro. Há ainda muito o que se avançar nas pautas contempladas pelas duas primeiras letrinhas da pauta ESG. As exigências de boas práticas sustentáveis e sociais, vindas de investidores, parceiros e consumidores, tendem a se intensificar, e as empresas precisam estar organizadas e preparadas para se manterem competitivas também nesse cenário. Mas aqui me concentro em governança.)

## Só 7% têm conselho de família formal
Um [estudo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa)](https://www.embrapa.br/documents/10180/9543845/Vis%C3%A3o+2030+-+o+futuro+da+agricultura+brasileira/2a9a0f27-0ead-991a-8cbf-af8e89d62829?version=1.1), revela que 40% dos produtores rurais deixarão suas atividades até 2030, corroborando a existência do gargalo apontada pela Abag e reforçando a importância de trabalhar o quanto antes o processo de sucessão familiar. Uma transição sucessória bem sucedida, devidamente estruturada e conduzida com transparência, não se faz de uma hora para outra. Demanda tempo – pode demorar de cinco a dez anos –, dedicação e empenho de todas as partes envolvidas no processo.

A pesquisa [“Governança e gestão do patrimônio das famílias do agronegócio”](https://jvalerio.com.br/passagem-de-bastao-no-campo-como-esta-a-sucessao-familiar-no-agronegocio/), da Fundação Dom Cabral e da JValério Gestão e Desenvolvimento, faz recortes importantes sobre isso, que ajudam a entender a importância de se trabalhar a sucessão familiar no agronegócio. Dos 207 gestores de todo o país ouvidos no ano passado, 26% citaram a sucessão familiar como um dos principais desafios para as famílias empresárias do setor.

A pesquisa mostra ainda que mais de 70% das empresas não têm um conselho de família estruturado – apenas 7% o possuem. É um índice baixo, bem menor que o de outras empresas familiares de outros setores da nossa economia.

A prática tem mostrado que postergar o processo de sucessão familiar, tratando do tema apenas na penúltima hora, pode ser mais complexo e traumático. A perenidade dos negócios familiares depende de uma visão proativa de longo prazo que contemple não apenas a governança, mas todos os aspectos ambientais e sociais.

Sem uma gestão com boas práticas nas tomadas de decisão, as empresas familiares, sejam elas do agronegócio ou de qualquer outro ramo de negócio, tendem a sofrer impactos negativos. Para continuar colhendo safras e cifras recordes, esse tão importante setor da economia brasileira precisa de empresas com governança e que incorporem princípios e propósitos de toda a agenda ESG.

Compartilhar:

Artigos relacionados

DNA corporativo: impacto do sistema familiar nos negócios

A história familiar molda silenciosamente as decisões dos líderes, influenciando desde a comunicação até a gestão de conflitos. Reconhecer esses padrões é essencial para criar lideranças mais conscientes e organizações mais saudáveis.

Finanças
Com projeções de US$ 525 bilhões até 2030, a Creator Economy busca superar desafios como dependência de algoritmos e desigualdade na monetização, adotando ferramentas financeiras e estratégias inovadoras.

Paulo Robilloti

6 min de leitura
Tecnologias exponenciais
No SXSW 2025, a robótica ganhou destaque como tecnologia transformadora, com aplicações que vão da saúde e criatividade à exploração espacial, mas ainda enfrenta desafios de escalabilidade e adaptação ao mundo real.

Renate Fuchs

6 min de leitura
Inovação
No SXSW 2025, Flavio Pripas, General Partner da Staged Ventures, reflete sobre IA como ferramenta para conexões humanas, inovação responsável e um futuro de abundância tecnológica.

Flávio Pripas

5 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo de incertezas, os conselhos de administração precisam ser estratégicos, transparentes e ágeis, atuando em parceria com CEOs para enfrentar desafios como ESG, governança de dados e dilemas éticos da IA

Sérgio Simões

6 min de leitura
Liderança
A Inteligência Artificial está transformando o mercado de trabalho, mas em vez de substituir humanos, deve ser vista como uma aliada que amplia competências e libera tempo para atividades criativas e estratégicas, valorizando a inteligência única do ser humano.

Jussara Dutra

4 min de leitura
Gestão de Pessoas
A história familiar molda silenciosamente as decisões dos líderes, influenciando desde a comunicação até a gestão de conflitos. Reconhecer esses padrões é essencial para criar lideranças mais conscientes e organizações mais saudáveis.

Vanda Lohn

5 min de leitura
Empreendedorismo
Afinal, o SXSW é um evento de quem vai, mas também de quem se permite aprender com ele de qualquer lugar do mundo – e, mais importante, transformar esses insights em ações que realmente façam sentido aqui no Brasil.

Dilma Campos

6 min de leitura
Gestão de Pessoas
O aprendizado está mudando, e a forma de reconhecer habilidades também! Micro-credenciais, certificados e badges digitais ajudam a validar competências de forma flexível e alinhada às demandas do mercado. Mas qual a diferença entre eles e como podem impulsionar carreiras e instituições de ensino?

Carolina Ferrés

9 min de leitura
Inovação
O papel do design nem sempre recebe o mérito necessário. Há ainda quem pense que se trata de uma área do conhecimento que é complexa em termos estéticos, mas esse pensamento acaba perdendo a riqueza de detalhes que é compreender as capacidades cognoscíveis que nós possuímos.

Rafael Ferrari

8 min de leitura
Inovação
Depois de quatro dias de evento, Rafael Ferrari, colunista e correspondente nos trouxe suas reflexões sobre o evento. O que esperar dos próximos dias?

Rafael Ferrari

12 min de leitura