Uncategorized

O lado negativo das decisões em grupo

O trabalho em equipe é cada vez mais saudado, mas é preciso evitar as distorções que ele causa
Alfredo Pinto é sócio-diretor no escritório da Bain & Company em São Paulo e possui mais de 15 anos de experiência em consultoria gerencial. É graduado em engenharia mecânica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e possui MBA pela University of California. Escreveu este artigo com exclusividade para HSM Management.

Compartilhar:

Tomar decisões em grupo faz parte da rotina das empresas. 

Resolver problemas, desenvolver novos produtos ou estabelecer normas são exemplos de ações raras vezes tomadas individualmente. Essa interação em geral produz excelentes resultados. Diversos pontos de vista sobre uma mesma questão aumentam a chance de obter soluções completas e eficazes. 

No entanto, há um lado das resoluções em grupo ao qual executivos deveriam prestar atenção: as consequências negativas que as decisões coletivas podem trazer. 

De acordo com pesquisa realizada pela Bain & Company recentemente, existem quatro efeitos nocivos originados das decisões em grupo: polarização, uniformidade, obediência à autoridade e efeito espectador. 

**POLARIZAÇÃO**

Normalmente, a ideia que se tem é que o grupo tende a moderar os pontos de vista e balancear opiniões, mas, muitas vezes, ocorre o contrário, e as pessoas radicalizam as posições. Um estudo que analisou a conduta de juízes federais nos Estados Unidos concluiu que, trabalhando sozinhos, eles tomaram decisões extremas em apenas 30% dos casos. Quando tomaram decisões em grupos de três, esse índice mais do que dobrou, atingindo 65%. Nos negócios, é fácil identificar isso em comitês de investimento, por exemplo: se são compostos por pessoas com visão conservadora e cautelosa, as decisões serão no sentido de afastar qualquer risco. 

**UNIFORMIDADE**

Essa situação ocorre quando as pessoas que compõem o grupo tendem a concordar com o que a maioria decide, sem ponderar se de fato o que está sendo defendido é sua opinião pessoal. Um experimento famoso feito pelo psicólogo Solomon Asch mostrou quão poderoso esse efeito é: ele pediu aos participantes que, individualmente, identificassem linhas do mesmo tamanho, e quase todos acertaram. Ao repetir a experiência dentro de um grupo previamente instruído para escolher a opção errada, quase 75% dos entrevistados concordaram com o grupo. 

**CONFORMIDADE**

Nos negócios, a tendência de seguir a maioria geralmente faz com que as pessoas se calem. A Warner Brothers, por exemplo, investiu US$ 50 milhões na adaptação do best-seller de Tom Wolfe A fogueira das vaidades, e a bilheteria foi um fracasso. No processo de produção, muitos membros da equipe fi zeram ressalvas a respeito da escolha de elenco e de mudanças no roteiro, mas nunca verbalizaram isso para o diretor, Brian De Palma. Por não ouvir essas opiniões, o diretor teve a percepção de que tinha tomado a decisão correta. 

**EFEITO ESPECTADOR**

O medo de expressar opiniões por uma obediência cega aos superiores também é um entrave. Para ter ideia da gravidade dessa situação, é possível tomar como exemplo o pior acidente da história da aviação comercial: a colisão entre aviões da PanAm e da KLM em Tenerife, em 1977. O piloto da KLM não tinha autorização dos controladores de voo para decolar. Mesmo assim, ninguém o impediu quando começou a taxiar o avião pela pista, porque todos tinham confiança na experiência dele. A omissão resultou no choque entre as aeronaves e em mais de 500 mortes. Ao não expressarem suas opiniões, as pessoas caem no chamado “efeito espectador”, ou seja, ficam quietas e não participam das decisões do grupo. No contexto de negócios, uma das consequências nocivas que isso pode ter é a de colaboradores serem instruídos a reportar violações de segurança e não reagirem em situações de perigo, caso os demais ignorem esse tipo de circunstância. 

**PRÁTICAS PREVENTIVAS**

Para neutralizar essas ameaças, boas práticas organizacionais podem ajudar a reduzir os maus efeitos da dinâmica de grupo. O mais importante é designar papéis de decisão e responsabilidades a pessoas específicas. Ao serem publicamente responsáveis por determinada decisão, os colaboradores ficam menos propensos a ceder diante da opinião de grupos. 

Além dessas estratégias, as companhias podem pôr em prática várias outras, tais como: 

**• Ter sempre o “advogado do diabo”.** Ao designar uma pessoa ou equipe para levantar o lado menos popular de um problema, a empresa pode se proteger contra a conformidade dos demais colaboradores.
**• Formar um comitê diverso para tomar decisões importantes.** Pessoas de funções diferentes ou com experiências distintas podem ajudar a proteger contra a conformidade e polarização de grupo.
**• Pedir opiniões com antecedência.** Isso evita a tendência de um grupo tomar posições mais extremas.
**• Estabelecer um fórum para comunicação direta com líderes seniores.** Pessoas que discordam quanto a uma ação e têm medo de dizer isso podem usar canais secundários para comunicar suas preocupações.
**• Fomentar a cultura da responsabilidade.** É preciso encorajar todos a assumir responsabilidade pessoal por decisões em grupo.

Como a experiência da Bain & Co. mostra, ninguém pode acabar de vez com os efeitos negativos da interação em grupo. Mas, com essas precauções, as companhias podem reduzir os riscos e aproveitar o que há de melhor nas boas decisões em equipe. Como consequência, seu desempenho será superior ao das empresas que não se preocupam em resolver essas questões.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Homo confusus no trabalho: Liderança, negociação e comunicação em tempos de incerteza

Em um mundo sem mapas claros, o profissional do século 21 não precisa ter todas as respostas – mas sim coragem para sustentar as perguntas certas.
Neste artigo, exploramos o surgimento do homo confusus, o novo ser humano do trabalho, e como habilidades como liderança, negociação e comunicação intercultural se tornam condições de sobrevivência em tempos de ambiguidade, sobrecarga informacional e transformações profundas nas relações profissionais.

Inovação & estratégia, Marketing & growth
17 de outubro de 2025
No Brasil, quem não regionaliza a inovação está falando com o país certo na língua errada - e perdendo mercado para quem entende o jogo das parcerias.

Rafael Silva - Head de Parcerias e Alianças na Lecom

3 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde, Tecnologia & inteligencia artificial
16 de outubro de 2025
A saúde corporativa está em colapso silencioso - e quem não usar dados para antecipar vai continuar apagando incêndios.

Murilo Wadt - Cofundador e diretor geral da HealthBit

3 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde
15 de outubro de 2025
Cuidar da saúde mental virou pauta urgente - nas empresas, nas escolas, nas nossas casas. Em um mundo acelerado e hiperexposto, desacelerar virou ato de coragem.

Viviane Mansi - Conselheira de empresas, mentora e professora

3 minutos min de leitura
Marketing & growth
14 de outubro de 2025
Se 90% da decisão de compra acontece antes do primeiro contato, por que seu time ainda espera o cliente bater na porta?

Mari Genovez - CEO da Matchez

3 minutos min de leitura
ESG
13 de outubro de 2025
ESG não é tendência nem filantropia - é estratégia de negócios. E quando o impacto social é parte da cultura, empresas crescem junto com a sociedade.

Ana Fontes - Empreendeedora social, fundadora da Rede Mulher Empreendedora (RME) e do Instituto RME

3 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Estratégia
10 de outubro de 2025
Com mais de um século de história, a Drogaria Araujo mostra que longevidade empresarial se constrói com visão estratégica, cultura forte e design como motor de inovação.

Rodrigo Magnago

6 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Liderança
9 de outubro de 2025
Em tempos de alta performance e tecnologia, o verdadeiro diferencial está na empatia: um ativo invisível que transforma vínculos em resultados.

Laís Macedo, Presidente do Future is Now

3 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Bem-estar & saúde, Finanças
8 de outubro de 2025
Aos 40, a estabilidade virou exceção - mas também pode ser o início de um novo roteiro, mais consciente, humano e possível.

Lisia Prado, sócia da House of Feelings

5 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
7 de outubro de 2025
O trabalho flexível deixou de ser tendência - é uma estratégia de RH para atrair talentos, fortalecer a cultura e impulsionar o desempenho em um mundo que já mudou.

Natalia Ubilla, Diretora de RH no iFood Pago e iFood Benefícios

7 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
6 de outubro de 2025
Como a evolução regulatória pode redefinir a gestão de pessoas no Brasil

Tatiana Pimenta, CEO da Vittude

4 minutos min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #169

TECNOLOGIAS MADE IN BRASIL

Não perdemos todos os bondes; saiba onde, como e por que temos grandes oportunidades de sucesso (se soubermos gerenciar)

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #169

TECNOLOGIAS MADE IN BRASIL

Não perdemos todos os bondes; saiba onde, como e por que temos grandes oportunidades de sucesso (se soubermos gerenciar)