Carreira, Cultura organizacional, Gestão de pessoas
3 min de leitura

O RH pode liderar o futuro do trabalho?

A área de gestão de pessoas é uma das mais capacitadas para isso, como mostram suas iniciativas de cuidado. Mas precisam levar em conta quatro tipos de necessidades e assumir ao menos três papéis
Natalia Ubilla é diretora de RH no iFood Pago, tendo ingressado no iFood em 2022. Antes, atuou como head de aquisição de talentos na frete.com, foi líder de aquisição de talentos para a América Latina na GE, especialista sênior em aquisição de talentos na Johnson & Johnson para Latam, entre outras posições ocupadas.

Compartilhar:

Avanços tecnológicos, mudanças comportamentais alimentadas por algoritmos, conflitos geopolíticos e alterações climáticas são algumas das transformações que estão moldando a forma como vivemos e trabalhamos, impactando diretamente o cenário global. 

Entre essas transformações, os avanços na digitalização e o uso crescente da inteligência artificial têm se destacado como fundamentais na rotina dos trabalhadores. Hoje, ouvimos falar de sistemas de IA Generativa que melhoram a eficiência do trabalho e ressignificam funções antigas, criando novas oportunidades de carreira. No Brasil, essas tecnologias estão sendo adotadas em ritmo acelerado, superando até mesmo a média global de implementação, conforme apontado pela pesquisa global realizada pelo Google em parceria com a Ipsos.


Adaptar-se a um ambiente de constante mudança tornou-se uma habilidade essencial, principalmente em um mercado de trabalho que enfrenta desafios cada vez mais complexos.

Em uma palestra que acompanhei durante o evento Impulso, promovido pelo iFood Benefícios, a futurista e especialista em comportamento do consumidor Daniela Klaiman abordou as maiores tendências para os próximos cinco anos. As necessidades, ou “needs” para usar uma expressão dela, irão definir as demandas dos trabalhadores e consumidores, traçando um caminho fundamental para empresas que desejam estar alinhadas com o futuro.

A mobilização das empresas será cada vez mais requisitadas em relação às necessidades abaixo, cada vez mais urgentes devido às mudanças climáticas e outras imprevisibilidades:

  • “Wellness needs”, com foco em saúde e bem-estar.
  • “Connection needs”, que ressaltam a necessidade de conexão, seja entre pessoas ou com ferramentas digitais.
  • “Reality needs”, voltadas para a verificação da procedência de informações, imagens e vídeos.
  • ”Safety needs”, relacionadas à segurança física e material.


Essas “needs” criarão um novo contexto para empreendedores, líderes e, sobretudo, equipes de RH, que assumem papel central na implementação de soluções eficazes para esses desafios no meio corporativo.

O comportamento de cuidar das empresas – e o do iFood

Não é surpresa que algumas empresas já estejam respondendo a essas transformações. A pandemia de covid-19 acelerou investimentos em iniciativas centradas no bem-estar e na flexibilidade, demandas cada vez mais evidentes em um contexto onde a saúde mental se tornou prioridade.

No Brasil, o cenário de saúde mental continua preocupante, demandando atenção contínua de líderes e organizações. Prova disso é a atualização da norma NR-01 que, além dos riscos físicos e ambientais, passou a incluir riscos psicossociais, exigindo que as empresas considerem fatores como estresse excessivo, assédio moral e carga de trabalho desproporcional como fontes de impacto na saúde mental dos colaboradores.

De minha parte, posso comentar como esses casos têm sido abordados no iFood, citando um caso que efetivamente ocorreu. Quando um de nossos colaboradores começou a apresentar questões relacionadas com a sua saúde mental. No primeiro momento, a pessoa conversou com a sua business partner (BP) e foi orientada a se consultar com nosso time de saúde. Para nós, é muito importante mostrar internamente que, ao menor sinal de desgaste, eles devem pedir apoio a um BP, que poderá orientá-lo da melhor forma.

Nessa consulta, o nosso médico afastou a colaboradora por cinco dias para que ela pudesse descansar e entender como estava se sentindo. Também foi um período em que ela buscou ajuda psicológica e passou a ser acompanhada fora da empresa. Em paralelo, o time de saúde manteve contato com a colaboradora para entender como nós enquanto empresa poderíamos ajudar e oferecer o suporte que ela e seus dependentes precisassem.

O período de afastamento dela acabou se estendendo e a nossa equipe multidisciplinar a acompanhou para garantir que ela estava sendo bem assistida. A equipe também deu suporte à liderança, mantendo-a informada ao longo desse período para garantir a melhor recepção no retorno da colaboradora afastada. Importante ressaltar que a equipe manteve detalhes do caso sob sigilo médico.

Além disso, os efeitos das mudanças climáticas trazem à tona questões igualmente urgentes. Apenas em 2024, desastres relacionados à água, como inundações e secas, causaram mais de 8.700 mortes e deixaram cerca de 40 milhões de pessoas desabrigadas ao redor do planeta.

Como é no iFood? Em casos de emergência, a empresa tem um papel de apoio ao seu colaborador. Por exemplo, no desastre do Rio Grande do Sul ocorrido em 2024, o iFood montou toda uma estrutura de apoio aos nossos FoodLovers e familiares. Como empresa, fizemos uma ação de antecipação de recebíveis para os restaurantes da região, sem custo. Além disso, arrecadamos R$ 2,45 milhões em doações por meio de uma campanha realizada no aplicativo, repassando posteriormente o valor para ONGs distribuírem alimentos, produtos de higiene e outros itens essenciais às pessoas afetadas pelas enchentes.

Embora essas iniciativas de resposta a desafios de saúde mental e de mudanças climáticas ainda estejam em fase inicial em muitas empresas, observa-se um crescente movimento para transformá-las em pilares estratégicos da gestão de equipes. O desafio, no entanto, é expandir e consolidar essas práticas, integrando-as às companhias e tendo lideranças multiplicadoras que consigam tomar a frente e liderar nesse contexto.

Os três (novos) papéis do RH

Fica claro que vivemos um cenário complexo. E que nele os times de gestão de pessoas têm a oportunidade e a responsabilidade de liderar a transformação. Hoje, não é mais suficiente apenas reagir às mudanças, é preciso antecipá-las de maneira estratégica. Isso inclui dominar a tecnologia, que, ao invés de ser uma barreira, deve ser vista como uma aliada da gestão de pessoas, promovendo a criação de vínculos mais fortes e soluções mais ágeis.

Nesse cenário, o RH atua, em primeiro lugar, como um “arquiteto” estratégico, assegurando que as necessidades humanas sejam valorizadas e priorizadas, tornando tecnologia e inovação elementos culturais e não um mero ferramental nas organizações. As empresas de sucesso serão aquelas que possuem culturas organizacionais pautadas nos desafios do amanhã, pela colaboração, inovação e uso ético da tecnologia. 

Também é fundamental o papel do RH como desenvolvedor das equipes, capacitando os colaboradores a navegar no mundo digital de modo ético e crítico, identificando desinformação e avaliando a procedência de conteúdos. Isso ainda considerando os dilemas do presente e futuro. No desenvolvimento, em especial, é necessário garantir que a IA se torne parte da cultura e mentalidade da empresa e colaboradores, de maneira saudável para todos. Afinal, não basta criar departamentos exclusivos para inovação; ela deve ser um elemento intrínseco à cultura organizacional.

Por fim, o RH deve assumir um papel de visionário, com a capacidade de se preparar e preparar suas forças de trabalho, garantindo que estejam prontas para enfrentar as necessidades de um futuro que já começa a se materializar. Se fizermos o exercício de olharmos alguns anos à frente, veremos que o papel do RH no futuro corporativo será essencial para a criação de ambientes mais humanos, alinhados às exigências de um mundo cada vez mais dinâmico e de alta performance.

Esse papel de visionário, ou construtor de futuro, exige de nós, profissionais de gestão de pessoas, um trabalho constante, bem como um trabalho constante de todas as lideranças. Sobretudo se queremos um futuro bom, que seja sustentável, ético e empático. Meu conselho quanto a esse papel é irmos adicionando uma “dose de futuro” em cada medida que criamos, cada planejamento e olhar com o time.

ENFIM, COM UMA ABORDAGEM QUE PRIORIZA TANTO a inovação quanto o bem-estar, poderemos nos adaptar e prosperar dentro de um mercado de trabalho – e mundo – em constante transformação.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Zuckerberg e seu império

Leia esta crônica e se conscientize do espaço cada vez maior que as big techs ocupam em nossas vidas

ESG
Construímos um universo de possibilidades. Mas a pergunta é: a vida humana está realmente melhor hoje do que 30 anos atrás? Enquanto brasileiros — e guardiões de um dos maiores biomas preservados do planeta — somos chamados a desafiar as retóricas de crescimento e consumo atuais. Se bem endereçados, tais desafios podem nos representar uma vantagem competitiva e um fôlego para o planeta

Filippe Moura

6 min de leitura
Carreira, Diversidade
Ninguém fala disso, mas muitos profissionais mais velhos estão discriminando a si mesmos com a tecnofobia. Eles precisam compreender que a revolução digital não é exclusividade dos jovens

Ricardo Pessoa

4 min de leitura
ESG
Entenda viagens de incentivo só funcionam quando deixam de ser prêmios e viram experiências únicas

Gian Farinelli

6 min de leitura
Liderança
Transições de liderança tem muito mais relação com a cultura e cultura organizacional do que apenas a referência da pessoa naquela função. Como estão estas questões na sua empresa?

Roberto Nascimento

6 min de leitura
Inovação
Estamos entrando na era da Inteligência Viva: sistemas que aprendem, evoluem e tomam decisões como um organismo autônomo. Eles já estão reescrevendo as regras da logística, da medicina e até da criatividade. A pergunta que nenhuma empresa pode ignorar: como liderar equipes quando metade delas não é feita de pessoas?

Átila Persici

6 min de leitura
Gestão de Pessoas
Mais da metade dos jovens trabalhadores já não acredita no valor de um diploma universitário — e esse é só o começo da revolução que está transformando o mercado de trabalho. Com uma relação pragmática com o emprego, a Geração Z encara o trabalho como negócio, não como projeto de vida, desafiando estruturas hierárquicas e modelos de carreira tradicionais. A pergunta que fica: as empresas estão prontas para se adaptar, ou insistirão em um sistema que não conversa mais com a principal força de trabalho do futuro?

Rubens Pimentel

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
US$ 4,4 trilhões anuais. Esse é o prêmio para empresas que souberem integrar agentes de IA autônomos até 2030 (McKinsey). Mas o verdadeiro desafio não é a tecnologia – é reconstruir processos, culturas e lideranças para uma era onde máquinas tomam decisões.

Vitor Maciel

6 min de leitura
ESG
Um ano depois e a chuva escancara desigualdades e nossa relação com o futuro

Anna Luísa Beserra

6 min de leitura
Empreendedorismo
Liderar na era digital: como a ousadia, a IA e a visão além do status quo estão redefinindo o sucesso empresarial

Bruno Padredi

5 min de leitura
Liderança
Conheça os 4 pilares de uma gestão eficaz propostos pelo Vice-Presidente da BossaBox

João Zanocelo

6 min de leitura