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Intraempreendedorismo

12 min de leitura

O que fazer diferente numa posição C-level após anos trabalhando em startups?

Seis aprendizados da vivência de quatro anos trabalhando no dia a dia de sete startups listados para provocar e refletir acerca do mundo corporativo, do intraempreendedorismo e da inovação

Colunista Alexandre Waclawovsky

Alexandre Waclawovsky

03 de Outubro

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Artigo O que fazer diferente numa posição C-level após anos trabalhando em startups?

Desde 2019 tenho atuado no ecossistema startup num modelo de TaaS (talent as a service), que descrevi na coluna do mês passado. Se você ainda não leu, deixo o convite para descobrir uma modalidade de trabalho que vem crescendo e pode estar no seu futuro profissional ou em um novo modelo de contratação adotado pelas empresas.

Mas, vamos à coluna desse mês, que surgiu após uma conversa recente com o Guilherme Petreche, que é um bom amigo, headhunter e cofundador da Woke. Ao compartilhar que havia completado quatro anos trabalhando no dia a dia de sete startups como CMO, CRO ou partner as a service, ele como bom curioso que é me perguntou: “Wacla, se voltasse ao mundo corporativo, após esses quatro anos trabalhando no dia a dia de startups, o que você faria diferente?”.

Minha resposta foi que esse período em startups de tamanhos, segmentos e culturas diferentes me ofereceram toneladas de aprendizados práticos e reaplicáveis e com impacto nos negócios em qualquer tipo ou tamanho de empresa.

Me percebi, livre das caixinhas e cargos específicos nessa reflexão, já que em startups cargos pouco valem. Nelas, você aplica ou aprende a aplicar uma série de habilidades, de acordo com a necessidade ou o desafio imediato do negócio. Atuei em posições de marketing, trade, vendas, planejamento, recursos humanos, treinamento, produto, customer experience, customer success, entre outras.

Vou dedicar a coluna desse mês a expandir a resposta curta que dei ao Petreche, contando com mais detalhes, os aprendizados e o que faria diferente numa empresa mais estruturada.

Como é bastante coisa, decidi relatar, a seguir, o que faria diferente no dia a dia do trabalho e na coluna do próximo mês, trarei minhas ideias para os negócios e como essa vivência me fez também olhar para o mundo de uma maneira diferente.

Capítulo I – o que aprendi e faria diferente no dia a dia em uma grande empresa?

1 - Entenderia e acolheria melhor diferentes formas de ver, pensar e fazer as coisas

Não sei se você já se deu conta, mas convivemos e/ou lideramos quatro diferentes gerações nas empresas – baby boomers, X, Y e Z. Pessoas nascidas e que cresceram em contextos bem diferentes, com visões, motivações e modelos mentais bem diferentes entre si. E adicione nesse mix uma pandemia inesperada e um retorno com três diferentes formas de se trabalhar – presencial, híbrida e remota – vivemos hoje um caldeirão cultural em fogo alto.

E aqui não faço nenhum juízo de valores ou preferências. Cada geração nasceu e cresceu em um contexto diferente, logo vai trazer questões singulares para sua vida, forma de trabalhar e o mundo onde vive e quer construir.

Porém, esse mix de necessidades e desejos impacta, diretamente, na cultura, na forma de se trabalhar, liderar e conviver com pessoas em qualquer empresa.

Enquanto nas mais estruturadas o mix geracional e de diversidade tende a crescer, nas startups ele já é mais prevalente. Com menos capital financeiro para contratar pessoas mais seniores, elas promovem um investimento mais nos potenciais, do que nas formações, currículos ou experiências prévias.

E isso é incrível! Acredite.

Me surpreendi com a quantidade de talentos que encontrei ou tive a oportunidade de liderar ou contratar. Pessoas que jamais passariam nas peneiras seletivas corporativas, como ainda estão estruturadas.

Uma seleção improvável de talentos, composta por um mix geracional e de diversidade surpreendentes, que me ensinou a ouvir, perguntar, entender e acolher melhor.

Entendi que o papel de um líder é e será menos técnico e mais voltado a ser um(a) grande maestro(a) de uma orquestra com instrumentos, que às vezes ele(a) ainda desconhece ou não domina, mas que precisa entender para assim afinar e conduzir essa sinfonia ao seu melhor desempenho.

A habilidade de ser vulnerável e perguntar mais do que acreditar que sabe como cada pessoa funciona, se motiva e se vê valorizada, é e será, também, cada vez mais chave para o sucesso dos negócios.

Hoje valorizo mais as atitudes de uma pessoa, independente de sua formação, origem, raça, credo, orientação sexual e qualquer outra diversidade ou condição socioeconômica.

Essa característica ou habilidade supera tudo, em tempos em que ter acesso à informação e conhecimento é abundante, logo a atitude de ir atrás e fazer a diferença vai ter um valor cada vez maior.

2 - Valorizaria mais as fortalezas das pessoas

Fui, assim, como outros muitos da geração X “talhado” no desenvolvimento das minhas fraquezas. Não me recordo de nenhuma avaliação anual de desempenho, onde por melhor que tivesse performado, minhas áreas de desenvolvimento não eram o grande foco da conversa. Minhas fortalezas eram esperadas e pouco ressaltadas. Sinto que passei minha vida profissional, quase sempre, “na dívida” das habilidades que precisava melhorar.

Um(a) colaborador(a) poderia ser a pessoa mais criativa da área ou empresa, mas lhe faltasse um olhar mais analítico, lá vinha a recomendação de um curso de finanças, excel avançado, matemática financeira ou até de liderança no programa de desenvolvimento do ano seguinte.

Além do mais, conforme a senioridade da posição, as recomendações ficavam mais sofisticadas também: “faz uma pós em finanças ou você nunca vai crescer na empresa”, ouvi de um gestor certa vez. Eu mesmo recomendei cursos de liderança para pessoas que se sentiam desconfortáveis em liderar. Qual é o sentido de tentar desenvolver o que não é inato? É como tentar ensinar e insistir que um peixe voe ou uma galinha nade.

Quebrei essa barreira que tinha trabalhando nesse mix diverso, junto com uma geração mais jovem, menos preparada, mas bastante talentosa, dedicada e com toneladas de atitude, que vai atrás do que precisa aprender.

Detalhe importante: aprender e fazer mais daquilo que gostamos, faz bem e é contagiante. Sem querer entrar numa discussão sobre propósito, desenvolvi um olhar mais apurado por aquilo que faz cada um(a) vibrar, acordar animado(a) e sentir que contribui na construção de algo maior que si mesmo(a).

Parece óbvio? Acredite, não é!

Observe como os programas de treinamento e desenvolvimento nas empresas, ainda não consideram as singularidades das pessoas, mas sim suas áreas ou cargos.

Voltaria com uma convicção absoluta que a combinação de colocar a pessoa certa, no lugar certo e fazendo a coisa certa é de um poder absurdo para pessoas e negócios, além de gerar um efeito cascata contagiante pela empresa. A potência está nas pessoas e não nos cargos ou crachás, logo reforçar as fortalezas das pessoas é uma grande chave de aumento de contribuição.

Deixo uma provocação antes de avançar: se você fosse 100% livre para fazer o que quisesse, o que você estaria fazendo?

3 - Colocaria mais foco nos desafios e menos nos job descriptions

Fui educado no mundo corporativo, a respeitar o meu “quadradinho”, descrição de função ou job description. Organizar papéis e responsabilidades tem seu valor para evitar conflitos e sobreposições de funções, mas com o aumento da complexidade dos negócios as empresas foram fatiadas de uma maneira complexa, gerando vários pontos cegos e com uma necessidade crescente de fluxos e processos de controle e gestão.

A quantidade de apresentações para dar satisfação do que se faz (ou não foi feito) é insustentável em um mundo tão dinâmico. Em startups o e-mail, por exemplo, é usado apenas para comunicações externas com clientes ou fornecedores e apresentações em power point são feitas apenas quando absolutamente necessárias.

Comunica-se de forma mais direta, reuniões são mais curtas, objetivas e se alguém não precisa estar ali é dispensado(a) sem gerar nenhum desconforto entre as partes (mesmo que seja o fundador ou fundadora), além de acontecer apenas quando são essenciais. Oitenta por cento ou mais dos desafios e conversas do dia a dia entre pessoas e áreas é feito e gerido por ferramentas digitais de comunicação ágeis como Trello, Basecamp, Notion, Slack, entre outras.

Operar em um mundo com escassez de recursos, o que caracteriza, qualquer startup, convida à extinção das descrições de funções, afinal todos ali tem fortalezas e habilidades que podem ser usadas para diferentes desafios e no que é importante para o crescimento dos negócios.

Um exemplo pessoal: em uma empresa tradicional fui chamado atenção por fazer uma entrega, que não estava em meu job description, pois isso havia gerado desconforto com a pessoa que deveria entregar (mas não entregava). Numa startup nessa mesma situação eu seria elogiado pela atitude (olha a palavrinha mágica aí), tanto pela liderança, quanto pela pessoa responsável pela tarefa, afinal estamos todos remando para o mesmo lado e com foco apenas no crescimento do negócio.

O senso de equipe e de todos pelo “crescimento do negócio” prevalece e se faço algo por ou para alguém estou contribuindo e não diminuindo.

Não vou ser “Poliana”, dizendo que sobreposições e conflitos não existem. Sim, eles existem, mas são tratados e resolvidos diretamente entre as partes. O tempo que seria investido (perdido) em políticas e jogos de bastidores é economizado por conversas diretas, resolutivas e o foco volta, imediatamente, aos negócios.

Ter uma organização alinhada no desafio e papéis claros é desafiador, mas possível e potente. Recalibrar como e pelo que as pessoas são reconhecidas e premiadas é o primeiro passo nessa direção.

4 - Colaboração ativa (metodologias ágeis)

Na coluna de julho, ao comentar sobre cinco verdades inconvenientes nos comportamentos corporativos, falei sobre a colaboração, que é mais política em ambientes mais estruturados e mais aberta e genuína em startups.

Antes de trabalhar em startups estudei metodologias ágeis e cheguei a testá-las, mas a política das empresas sempre prevalecia. Em startups, acredite, nem se comenta sobre metodologias ágeis, afinal essa é a forma de se fazer tudo. É o básico, logo não precisa ser explicado ou relembrado. Sprints e squads são a regra do jogo. Quem não sabe, estuda, aprende e aplica. Simples assim.

Reunir as habilidades para resolver um problema sempre prevalece sobre áreas e cargos. Participei de incontáveis reuniões, em que colocávamos o desafio a superar para discussão e em volta da mesa estavam ou eram convocadas apenas as pessoas que possuíam as habilidades para resolvê-lo.

E se você acha que isso gera estresse, acredite, ao contrário, incentiva as pessoas a declararem seus talentos e habilidades, pois sabem que podem ser convocadas para projetos importantes para o negócio. Ser convocado é um reconhecimento. Não ser, significa que tenho outras habilidades e vou participar de outro desafio, além de apoiar meus colegas, pois sei que o reconhecimento é coletivo, mais que individual.

Conversando com pessoas que estão no mundo corporativo, ainda vejo empresas “subvertendo” os conceitos do manifesto ágil para encaixá-lo (ou encaixotá-lo) em suas políticas e “boas práticas” (geralmente que funcionam há dez ou 15 anos). Certa vez, uma CMO declarou estar orgulhosa pelo trabalho de um squad com 50 pessoas na sua empresa.

Oi? Me desculpem a franqueza, mas se você precisa de 50 habilidades diferentes para solucionar um problema a empresa já era, logo a organização aplicou um modelo tradicional de convocar todos politicamente, para ninguém ficar melindrado e mudou o nome da prática de projeto para squad.

Pausa para reflexão: a parte mais difícil de se implementar uma metodologia ágil em sua essência é, acredito, deixar pessoas de fora da mesa de discussão e decisão, por não terem as habilidades necessárias para resolver determinado desafio necessário.

Uma outra barreira é deixar os cargos e posições de fora do grupo de trabalho. Não existe chefe num squad e todos têm um papel claro a desempenhar, tarefas e prazos a cumprir e reportar. A dinâmica desse grupo é organizada e o progresso reportado, logo não há estresse ou descontrole. Pelo contrário.

Acredito que a maior dificuldade na adoção completa do manifesto ágil, está na necessidade do desapego pela liderança de não ter o controle de cada passo e o de delegar o poder das decisões aos que têm uma capacidade técnica melhor.

Não acredito que uma empresa estabelecida possa atuar 100% como uma startup, pelo seu porte e natureza, mas pode sim ser mais ágil, dinâmica e praticar a colaboração ativa que empodera e não frustra as pessoas.

5- Hackearia o sistema em busca de soluções não óbvias

Sim o mundo mudou, mas repare como as empresas seguem com o botão “aversão aos riscos” ativado, copiando e replicando práticas que no passado funcionaram. Minha provocação aqui seria: as características e comportamentos do mundo e cenário dos negócios atual, refletem exatamente às do mundo em que esses modelos e práticas foram criados?

Se a resposta for sim, nada errado em seguir replicando as mesmas fórmulas, mas por vivemos em constante evolução, aprendi e aplicaria uma constante inquietação e curiosidade na busca por novas maneiras de abordar os desafios de negócios, sejam eles os mesmos (ex: vendas caíram) ou diferentes (ex: surgiu uma nova tecnologia).

Note que em ambos os casos, o contexto externo à empresa pode também ter mudado, logo acessar o desafio com inquietação e curiosidade, buscando ângulos e soluções diferentes, pode encurtar caminhos ou criar um músculo de inovação e agilidade necessários aos negócios atualmente.

Não existe fórmula pronta ou mágica. Aprendi a buscar entender os desafios com mais profundidade, antes de sair aplicando metodologias ou soluções conhecidas. Problemas novos demandam novas soluções.

6 - Teria menos apego e mais velocidade no go to market

É prática comum nas empresas o pesquisar e testar à exaustão antes de lançar qualquer produto ou serviço, além de ter uma mentalidade de escala (se o impacto não é grande melhor nem fazer). Ainda bem que o Steve Jobs, Elon Musk, Zhang Yiming (fundador do TikTok) e tantos outros pensavam diferente.

Empresas digitais e startups ensinam que o verdadeiro e maior teste é o mundo real, logo, ao contrário das empresas estabelecidas, que buscam o 100% perfeito para lançar, elas lançam produtos ou serviços quando estão 60 ou 70% prontos para seus clientes mais leais e engajados, que na prática, vão ajudá-las a encontrar falhas e terminar o desenvolvimento através do uso.

Provocação: se as montadoras de automóveis fizessem isso, talvez não houvesse tantos recalls.

Ter um olhar no cliente, não significa apenas entender suas vontades, mas pode ser também o de chamar para o processo de desenvolvimento. Essa é uma maneira de premiar e reconhecer seus clientes leais, além de reduzir custos de testes empíricos, substituindo boa parte deles pelos testes na prática.

Existe um ditado popular que vale sempre ser considerado: feito é melhor que perfeito ou como certa vez ouvi de um colega: “se fizermos isso a empresa corre risco de falir ou tomar um tombo grande? Se a resposta for não e o que está em jogo é apenas reputação, ego ou perdas pequenas, faça.”

Como esses aprendizados e novas propostas ecoaram para você?

No mês que vem volto com mais aprendizados, propostas e provocações.

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Colunista

Colunista Alexandre Waclawovsky

Alexandre Waclawovsky

Alexandre Waclawovsky | Wacla

Alexandre Waclawovsky é fundador e CEO da senior 45!60, aceleradora de startups e atua no modelo de CMO ou partner as a service. Também é autor do livro Invente o seu lado I - A arte de inovar numa época de incertezas

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