Para empresas químicas e de materiais, chegou a hora de fazer a pergunta de US$ 3,5 trilhões:
*Estaremos vivendo os estágios iniciais de uma transformação de petroquímicos intensivos em emissões para um novo paradigma de produção verde, no qual o CO2, o hidrogênio e energias renováveis são usados no lugar de combustíveis fósseis?*
Aqui vamos falar do CO2, mais especificamente da transformação “CO2-
-to-X”, como o mercado global vem convencionando chamar o novo paradigma verde de produção de produtos petroquímicos que aproveita o carbono sequestrado da atmosfera, em vez de combustíveis fósseis. Exemplos são o precursor químico baseado em CO2 da Covestro, o Cardyon, e o método de produção baseado em CO2 da Econic para polióis, usados para criar espumas de poliuretano sustentáveis. A Evonik, em colaboração com diversos parceiros, lançou o projeto PlasCO2, que visa usar o CO2 como matéria-prima na produção de produtos químicos do tipo C4.
A Twelve, startup que trabalha com a Daimler e a P&G para produzir produtos baseados em CO2, anunciou recentemente uma rodada de financiamento da série B no valor de US$ 130 milhões. A Air Company, outra startup, tem vendido vodca e fragrâncias baseadas em CO2, entre outros produtos; ela arrecadou US$ 30 milhões em financiamento da série A. No total, empresas de capital de risco investiram cerca de US$ 700 milhões em startups de transformação e utilização de CO2 em 2022, de acordo com o PitchBook. O investimento tem aumentado a uma taxa anual de 47% desde 2018.
O fato é que, à medida que o ritmo de inovação e de financiamento em produtos químicos baseados em CO2 cresce, grandes empresas, especialmente aquelas com compromissos de redução de carbono ou de zero líquido, precisam se envolver com insumos e processos de produção alternativos.
Uma análise recente do BCG indica que o CO2-to-X é um desfecho convincente e subestimado para a descarbonização do setor químico – setor que produziu aproximadamente 2,5% das emissões globais de carbono em 2022. O CO2-to-X deve ser visto como uma das quatro abordagens complementares que aumentam a captura e o armazenamento de carbono (CCS, na sigla em inglês) e reduzem a intensidade de carbono dos processos de produção química. (As outras três são produtos circulares, materiais derivados de biomassa e materiais biodegradáveis.) E à medida que as economias de escala para o CCS avançam, os benefícios serão obtidos pelas empresas mais bem preparadas com abordagens para agir.
Quase todos os produtos petroquímicos usados hoje podem ser produzidos usando CO2, hidrogênio com baixa emissão de carbono e energias renováveis no lugar de combustíveis fósseis e calor. Essas vias baseadas em CO2 podem desbloquear novas opções de redução de gases de efeito estufa altamente desejáveis para os usuários finais. Por exemplo, a pegada de carbono do etileno produzido com hidrogênio com baixa emissão de carbono e CO2 (de fontes biogênicas ou captura direta do ar) como matéria-prima poderia ser negativa em comparação com 1,3 a 1,8 tonelada de CO2 por tonelada de etileno gerada no craqueamento a gás atual.
Desenvolvidos em escala e a custos razoáveis, os processos de produção baseados em CO2 podem ser um contribuinte importante para uma indústria química com baixo ou nenhum carbono, desde que:
– A maioria do calor do processo seja fornecida por hidrogênio e eletricidade verde.
– Grandes partes dos blocos de construção petroquímicos baseados em síntese de gás sejam produzidas por meio de métodos CO2-to-X em vez de reformar metano a vapor.
– As emissões restantes do processo sejam capturadas, e o carbono, reutilizado.
– Fontes sustentáveis de CO2 (como biogênicas ou captura direta do ar) ou materiais reciclados forneçam o carbono usado como matéria-prima.
Os catalisadores para essas melhorias serão desenvolvimentos tecnológicos tanto incrementais (como otimização de processos) quanto disruptivos (como a descoberta de novos materiais catalíticos), bem como a regulamentações em evolução e a geração generalizada de eletricidade verde e produção de hidrogênio.
As tecnologias de energias renováveis e armazenamento estão avançando rapidamente, e a eletricidade para a indústria pode ser aprimorada ainda mais por tecnologias como reatores nucleares modulares pequenos que a Dow, por exemplo, está buscando. A oferta de hidrogênio verde também precisa aumentar; o BCG estima que a demanda por hidrogênio com baixa emissão de carbono poderia disparar para 350 milhões a 530 milhões de toneladas por ano até 2050.
## Aposta grande, retorno maior
Certamente ser pioneiro nos mercados verdes ainda é uma aposta, mas pode resultar em grandes retornos. Isso porque os players da cadeia de fornecimento em setores como o químico têm operado há muito tempo em mercados comoditizados, competindo principalmente com base em custo e preço.
O CO2 é uma matéria-prima atraente porque é abundante industrialmente e é um gás de efeito estufa problemático. O grande desafio é que os processos CO2-to-X ainda são caros e geralmente consomem grandes quantidades de energia para criar produtos químicos fundamentais, como monóxido de carbono (um ingrediente-chave em uma variedade de produtos químicos industriais) e etilenoglicol (um agente anticongelante e precursor das fibras de poliéster).
No entanto, a economia de uso de CO2 está melhorando, e há vários caminhos à beira da atratividade econômica. O BCG demonstrou que os processos baseados em CO2 podem ter emissões de escopo 2 e 3 menores do que os métodos de base biológica, e seus custos estão se tornando competitivos com o craqueamento a gás (líquidos de subsídios). Mudanças regulatórias esperadas na União Europeia, como o Sistema de Comércio de Emissões e o Mecanismo de Ajuste de Fronteiras de Carbono, podem corroer a rentabilidade dos processos de produção estabelecidos com altas emissões de carbono, criando incentivos adicionais para a mudança.
Muitas empresas se comprometeram com a captura e armazenamento de CO2 como pilar fundamental de seus programas de sustentabilidade, e o CO2-to-X pode ser uma abordagem complementar {veja texto abaixo}. Dada a variedade de tecnologias em desenvolvimento, e o número potencial de produtos baseados em CO2, avaliar os riscos técnicos, econômicos e comerciais não é simples. Ainda há muitas questões em aberto sobre a mitigação do efeito estufa, dependendo da molécula de interesse, sobre a disponibilidade de alternativas circulares e de base biológica e sobre incentivos regulatórios. As empresas precisam comparar as várias vias de transformação de CO2 com outras abordagens de sustentabilidade, como biodegradabilidade e circularidade, tanto do ponto de vista de custo como do da pegada de carbono. As decisões raramente são simples. As cadeias de valor alifáticas e aromáticas exigem uma consideração cuidadosa com base na economia de processo e na maturidade.
DEMANDA CRESCENTE
Um relatório de janeiro de 2023 preparado pelo Fórum Econômico Mundial (WEF) e pelo BCG relatou que a demanda nesta década por alguns materiais verdes, incluindo produtos químicos e plásticos, logo pode superar a oferta. As empresas que tomam a iniciativa e atendem a aplicações para as quais a demanda dos clientes por alternativas verdes é alta já estão obtendo prêmios de preço. Um exemplo de aplicação são as olefinas de baixa emissão de carbono, derivadas de óleo de pirólise. As empresas que esperarem que a demanda se materialize antes de investir podem estar atrasadas, na visão do BCG.
O “X” DA QUESTÃO…
Você vai cada vez mais ouvir falar em tecnologias PtX, abreviação da expressão inglesa “power-to-X”. Essas tecnologias fazem a conversão de energia elétrica renovável em hidrogênio, amônia, o próprio CO2 que pode ser usado como matéria-prima e outras moléculas, bem como combustível sustentável de aviação.
… e as parcerias de CCS que nascem
As atividades de captura de CO2 da atmosfera e armazenamento (CCS, na sigla em inglês) geram novas parcerias de negócios, nas quais o uso do CO2 como matéria-prima é previsto. Air Liquide, Fluxys Belgium e o Porto de Antuérpia-Bruges estão criando o Hub de Exportação de CO2 Antwerp@C, com uma rede de dutos intraportuária de acesso aberto – há investimento da União Europeia. Exxon Mobil e Mitsubishi Heavy Industries também se associaram; a ideia é a Exxon usar a tecnologia de captura da Mitsubishi como parte das soluções CCS industriais ponta a ponta da Exxon.
As empresas precisam fazer três perguntas-chave sobre quando, como e onde implantar tecnologias CO2-to-X:
1. Quais moléculas escolheremos para experimentar primeiro?
2. Como se deve avaliar os desenvolvimentos tecnológicos e as demandas de mercado e energia? Existem desenvolvimentos de curto, médio e longo prazo.
3. Como o mercado se desenvolverá? Dadas as exigências de escala intensiva em capital e a incerteza sobre a disposição dos clientes em pagar um prêmio, há um go-to-market que minimize riscos e acelere prazos?
## Orientação para a alta gestão
Os caminhos para modelos CO2-to-X ambiental e financeiramente sustentáveis variam por região e segmento da indústria. À medida que os custos do CO2 para X diminuem, os líderes de todas as grandes empresas químicas, bem como de outras empresas, devem endereçar as seguintes perguntas:
– Como uma tecnologia CO2-to-X pode alterar as posições competitivas e os pools de lucro em nossos produtos e geografias?
– Nossa organização de P&D tem as capacidades para aproveitar a nova tecnologia?
– Onde nossos ativos ou cadeias de valor criam opções de parceria que podemos explorar?
*© BCG.
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__Leia também: [Nossos futuros precisam ser regenerativos](https://www.revistahsm.com.br/post/nossos-futuros-precisam-ser-regenerativos)__
Artigo publicado na HSM Management nº 160.