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Que ideias vão mudar o mundo? Google X responde

Conheça o Google X, o laboratório B do Google, e entenda o que está movendo essa organização gigantesca daqui até o futuro
A reportagem é de Jon Gertner, colaborador da revista Fast Company.

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Uma das primeiras coisas que chamam a atenção no Google X é o fato de não empregar tipos tradicionais do Vale do Silício. O Google já possui um grande laboratório, o Google Research, que é voltado para a computação e para as tecnologias da internet. O Google X é diferente. A distinção que normalmente se faz é a seguinte: enquanto o Google Research está focado nos bits, o Google X visa os átomos. 

Em outras palavras, a missão do Google X é criar objetos de verdade, que existem no mundo físico. Esse elemento está presente e confere coerência aos quatro principais projetos que até agora emergiram do laboratório: os carros sem motorista, o Google Glass, os balões com Wi-Fi e as lentes de contato que monitoram os níveis de açúcar no sangue pelas lágrimas. 

Em geral, o Google X procura pessoas que querem construir coisas e não se deixam desanimar facilmente. Dentro do laboratório, atualmente com mais de 250 colaboradores, há um grupo variado de profissionais: de escultores e filósofos a ex-guardas-florestais. 

Um dos cientistas já ganhou dois Oscars de efeitos especiais de Hollywood. “A definição clássica de especialista é a de alguém que sabe cada vez mais sobre um número menor de coisas, até que um dia acaba sabendo tudo sobre nada. Pessoas assim podem ser extremamente úteis quando o foco de atuação é bem restrito. Essas não são as pessoas para o Google X. O que queremos, de certa maneira, são aquelas que saibam cada vez menos sobre mais e mais coisas”, define Rich DeVaul, que comanda o Rapid Evaluation Team [equipe de avaliação rápida], conhecido internamente como Rapid Eval. 

**MOMENTO CERTO**

Se há um grande plano por trás do Google X, ele parte da crença de que a combinação, algo conflituosa, de uma variedade de “inteligências” é a melhor aposta para criar produtos que podem resolver algumas das questões mais difíceis da atualidade. Ao mesmo tempo, o Google X é, ele próprio, um experimento, um esforço para reconfigurar a forma como um laboratório de grande empresa deve funcionar. 

Faz isso assumindo riscos inacreditáveis e atuando em ampla gama de áreas da tecnologia, sem hesitar em se perder por caminhos que passam longe do negócio central da companhia-mãe, o Google. Ainda não se sabe se essa é uma estratégia genial ou idiota. Não há modelos históricos nem precedentes para o que essas pessoas estão fazendo. No entanto, faz algum sentido. 

A conjuntura em que o Google opera é inédita na história e talvez não se repita. A empresa é inimaginavelmente rica em talentos e está perto de alcançar seu pico de influência, em um momento em que as redes e o poder da computação e da inteligência artificial estão se aglutinando para dar origem ao que muitos especialistas descrevem como quarta revolução industrial. [Vale lembrar que o Google adquiriu a inglesa DeepMind, de inteligência artificial, este ano.] Nesse contexto, o Google se esforça agora para ampliar seu negócio central para além dos sistemas de busca. Trata-se de ocupar a brecha deixada no mercado, na visão de Astro Teller, diretor do laboratório, que prefere ser chamado de Captain of Moonshots. O conceito de “moonshot” remete à ideia de mirar a Lua ao imaginar possíveis inovações e descreve invenções audaciosas que têm pequena chance de sucesso, mas que podem revolucionar o mundo quando dão certo. 

[Para entender melhor o conceito, vale assistir ao vídeo [**Moonshot Thinking**](http://www.youtube.com/watch?v=0uaquGZKx_0.)] Segundo Teller, as pequenas empresas sentem que não possuem os recursos necessários para investir em inovações com ambição equivalente à viagem à Lua. As grandes organizações consideram que isso criaria ruídos entre os acionistas. Os líderes governamentais acreditam que o setor público não tem dinheiro suficiente para esse tipo de investimento (ou que o Congresso ficaria escandalizado com um erro ou um fracasso típico de inovação). “Todo mundo acha que é responsabilidade do outro”, afirma Teller. Não importa que os moonshots do Google X não sejam puramente altruístas, como o Google gosta de fazer parecer. Embora os carros que dispensam a presença do motorista possam provavelmente salvar vidas, também vão liberar os passageiros para fazer pesquisas na internet e usar o Gmail. Os balões com Wi- -Fi podem incluir bilhões entre os usuários do Google. Ainda assim, porém, é difícil não se encantar por essas e outras ideias em gestação no Google X. Ao ser perguntado por que o Google escolheu investir no Google X em vez de em algo que fosse mais atraente para Wall Street, Teller diz: “Essa é uma falsa questão. Por que é preciso escolher?”. 

**X DA QUESTÃO**

A origem do Google X remonta a 2009, quando os cofundadores do Google, Sergey Brin e Larry Page, criaram o cargo de “diretor de outros”. Esse profissional deveria supervisionar o desenvolvimento de ideias distantes do negócio central do Google. O conceito evoluiu para o Google X em 2010, graças à iniciativa do engenheiro Sebastian Thrun, com o apoio de Brin e Page, para criar o carro sem motorista. A partir daí, o laboratório cresceu em torno desse projeto, com Thrun no comando das atividades. 

Foi ele que escolheu Teller como um de seus diretores, e, quando passou a se dedicar cada vez mais ao desenvolvimento da tecnologia para o carro (e mais tarde a sua startup de educação online, a Udacity), desistiu de coordenar outros projetos. Com isso, Teller assumiu a responsabilidade pelo dia a dia do Google X. Há diferentes explicações para o significado do X no nome desse laboratório. Inicialmente, era apenas uma alternativa enquanto não se chegava a um nome melhor. Hoje, é entendido como a busca por soluções que são dez vezes melhores que qualquer outra. Alguns dos profissionais que trabalham no Google enxergam o X como a representação de uma organização disposta a desenvolver tecnologias que daqui a dez anos vão produzir grande impacto. Isso tudo faz do Google X um caso único. 

Muito de vez em quando, os laboratórios das empresas investem parte de seu orçamento de pesquisa e desenvolvimento (P&D) em projetos de risco, de longo prazo, mas o foco nos resultados trimestrais, assim como a percepção de que pode ser extremamente difícil recuperar um investimento feito em pesquisas remotas, pôs fim a praticamente todos os esforços desse tipo. Atualmente, considera-se bem mais sensato que uma empresa financie pesquisas de curto prazo, ou, se for o caso de olhar mais para o futuro, que compre os direitos de uma ideia embrionária que está sendo gerada em uma universidade ou em um órgão governamental, ou, ainda, que incorpore uma startup inovadora. Teller e Brin não são avessos a fazer isso. 

No entanto, a empresa deles rejeita concentrar-se 100% na sabedoria tradicional dos negócios, preferindo incubar também iniciativas de pesquisa próprias e ajudá-las pacientemente até que amadureçam. Recentemente, quando Page foi chamado a falar sobre os recursos financeiros que estavam sendo investidos em P&D, ele saiu pela tangente. “Minha luta é para que as pessoas gastem dinheiro em pesquisas de longo prazo”, disse, observando que o que tem sido investido é uma soma modesta diante dos lucros do Google. 

**QUASE FICÇÃO**

Em termos gerais, os projetos do Google X compartilham três critérios. Todos devem: atacar um problema que afete milhões de pessoas –ou, ainda melhor, bilhões; basear-se em uma solução radical que tenha pelo menos um componente que se aproxime da ficção científica; e contar com tecnologias que são ou estão perto de se tornar acessíveis. Para DeVaul, porém, há outro princípio, mais unificador, que liga esses três critérios: nenhuma ideia deve ser incremental. Isso pode parecer um clichê, admite o líder do Rapid Eval, só que a rejeição ao incrementalismo não se dá por razões ideológicas, conforme ele argumenta. O motivo é realmente de ordem prática. “É muito difícil fazer qualquer coisa neste mundo. Até sair da cama todo dia de manhã é muito difícil para mim”, afirma. “Mas lidar com um problema dez vezes maior não é dez vezes mais difícil”, explica.

DeVaul insiste que geralmente fazer incursões em grandes problemas é tão fácil quanto “tentar otimizar um processo em 5% ou 2%”, ou até mais fácil. Ele aponta como exemplo o caso dos carros. Se você quer desenvolver um carro que rode 40 quilômetros por litro de combustível, isso vai dar muito trabalho e não resolverá as questões relacionadas com os recursos fósseis ou as emissões de gases do efeito estufa. Mas, se você quer desenvolver um carro que faça 250 quilômetros com um litro de combustível, isso de fato pode resolver esses problemas do planeta, e você necessariamente tem de se libertar das convenções, porque é impossível apenas melhorar um projeto de automóvel já existente a esse ponto. 

Em vez disso, continua DeVaul, você precisa começar de novo, reexaminando o que um carro realmente é. Deve pensar em diferentes tipos de motores e combustíveis, em materiais que alterem o próprio conceito de transporte. E então talvez, só talvez, você chegue a algo que seja interessante para o Google X. 

> **O jeito GOOGLE X**
>
> As ideias radicais que surgem no laboratório precisam sobreviver a um processo de análise rigoroso. acompanhe o caso do Projeto Loon, de balões com Wi-Fi 
>
> **1. Identificação do problema.** O projeto surgiu com uma ideia envolvendo conexões entre equipamentos móveis. Mas, em junho de 2011, Rich DeVaul decidiu mudar o foco para o objetivo de aumentar o acesso à internet em áreas pobres e regiões rurais. 
>
> **2. Desenvolvimento da ideia.** A equipe começou a trabalhar em uma aeronave de comunicação que pudesse ficar parada em um único ponto, porém garantir que ela não se movimentasse era extremamente difícil. Foi aí que DeVaul surgiu com a possibilidade de usar balões, como forma de permitir que uma parte flutuasse, mas tivesse outra, embaixo. 
>
> **3. Teste da solução.** DeVaul adquiriu alguns balões climáticos de US$ 80 cada um e neles instalou transmissores. Ele lançou as “engenhocas” no reservatório de San Luis, a uma hora de distância do Google, e andou com seu carro pela região para testar o sinal. 
>
> **4. Construção dos protótipos.** O projeto Loon se tornou oficial em agosto de 2011, com a contratação de uma equipe para construir vários protótipos. Também foi iniciado o desenvolvimento da antena e chegou-se a levantar uma pequena casa para estudar como a antena poderia ser instalada na residência dos usuários. 
>
> **5. Lançamento do produto.** O Google X contratou o empreendedor Mike Cassidy para transformar o projeto em um negócio. O primeiro passo foi a implementação de um projeto-piloto na Nova Zelândia, onde o Loon funcionou, temporariamente, em junho de 2013. Com o interesse crescente das empresas globais de telecomunicações, a equipe estuda que modelos de negócio poderiam funcionar melhor

**PÉS NO CHÃO**

Nesse cenário futurista, Obi Felten é o membro da equipe que tenta manter todos com os pés no chão. DeVaul se refere a ela como a “pessoa normal” no laboratório, alguém capaz de trazer todos de volta para a Terra, fazendo perguntas simples como: “Isso é legal?”, “Será que alguém comprará isso?”, “Será que alguém vai gostar disso?”. Felten não é engenheira. 

Ela trabalhou na área de marketing para o Google na Europa antes de ir para o Google X. Um de seus principais desafios é o fato de que não há nenhum modelo real de como uma empresa deve levar tecnologias radicais para o mercado. “Se alguém encontrar um modelo, por favor, me conte”, diz ela. 

Felizmente para o Google X, nem tudo precisa evoluir para ser uma fonte de faturamento significativa. “Nosso portfólio tem de dar dinheiro, mas não necessariamente cada produto precisa fazê-lo. Alguns serão melhores do que outros, se a medida for em dólares. Outros podem ter um impacto enorme no mundo, mas não chegar ao mercado de massa”, explica Felten. Ainda este ano, o Google X espera anunciar um novo projeto, ultrassecreto, que provavelmente se encaixa nessa segunda categoria. O que será? Por enquanto, não há pistas. 

O que se percebe é que os profissionais do laboratório estão extremamente curiosos sobre transporte e energia limpa e que um assunto levado muito a sério internamente é o desenvolvimento de métodos de diagnóstico mais eficientes na área da saúde –com maior impacto do que o dos tratamentos médicos. Ao mesmo tempo, é importante ter em mente que o Google X tem uma tarefa de grande envergadura. 

A organização deve fazer os projetos já anunciados avançarem ao menos uma casa este ano. O Loon, dos balões com Wi- -Fi, que ainda não conta com plano de negócios, tem atraído o interesse da maior parte das empresas de telecom do mundo, mas não está tecnicamente pronto para chegar a outro patamar. O Google Glass, mais próximo da comercialização, e os carros sem motorista, mais avançados na etapa de testes, têm atraído um interesse público extraordinário. Mas ainda é impossível dizer se ou quando serão bem- -sucedidos como negócios ou se terão aquele impacto dez vezes maior em dez anos.

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