Neste ano, completo 25 anos de formado em medicina, com residência médica e pós-graduações em radiologia. Assim como na vida pessoal, minha trajetória profissional passou por transformações significativas ao longo dos anos, conduzindo-me de médico radiologista a gestor, inovador e empreendedor em saúde. Essa jornada foi repleta de desafios, aprendizados e oportunidades que moldaram meu percurso rumo a novos horizontes e perspectivas.
Filho, sobrinho e neto de médicos, é fato que o ambiente familiar pesou na escolha pela profissão, embora minhas aptidões fossem maiores para disciplinas como matemática, física e línguas. Na França, onde fiz parte do ensino médio, o aconselhamento da direção da escola foi que optasse pela área de exatas. Outras carreiras, como de cientista político ou diplomata, passaram pela minha cabeça na crise que alguns estudantes de medicina atravessam nos primeiros anos.
A escolha pela área de diagnóstico por imagem levou em conta alguns desses fatores. O maior contato com tecnologia e inovações aguçou a minha curiosidade e fez, inclusive, com que eu tomasse algum gosto por anatomia, matéria que nunca tinha me encantado antes. Durante a residência médica, não só mergulhei no universo das imagens diagnósticas como vi a importância de um conhecimento geral em medicina para a formação de um bom radiologista. Dediquei meus primeiros anos após a residência para estabelecer uma carreira acadêmica, com especializações e pós-graduações, além de investir no meu crescimento profissional e no reconhecimento por pares.
Nos primeiros anos de carreira, a medicina ainda vivia um ambiente pouco digitalizado, sendo a radiologia uma exceção. Éramos uma das poucas áreas que já contava com ferramentas digitais para visualização de imagens, como os sistemas PACS, e algumas inovações começavam a despontar, como novas tecnologias de ressonância magnética e equipamentos de PET/CT, tema do meu pós-doutorado em Nova York.
Com o passar dos anos, comecei a perceber que havia um mundo além dos limites das salas de laudos. Praticamente de modo simultâneo abracei duas novas carreiras: de executivo e de empreendedor em saúde. Percebi a importância de um bom conhecimento de gestão e resolvi ampliar meus conhecimentos realizando um MBA na área. Mais ainda, notei que tecnologias como inteligência artificial e telemedicina estavam emergindo e prometiam revolucionar a forma como a saúde era entregue e gerenciada. Decidi, então, trilhar um caminho menos convencional
## A primeira startup, o primeiro CEO
Aos poucos, fui me dedicando mais a atividades de gestão em saúde e de empreendedorismo. Tornei-me diretor de inovação de uma grande empresa, CEO de outra. Há dez anos, montei minha primeira startup, focada em armazenamento e gestão de imagens médicas na nuvem, e ao longo dos últimos anos fui ampliando minha participação em outras empresas, em ramos diversos como inteligência artificial, tratamento de dor com fotocêuticos e educação médica continuada.
A curva de aprendizado era íngreme, embutindo a necessidade de desenvolver novas habilidades. Era preciso compreender o ecossistema de negócios e dominar conceitos de gestão, liderança e estratégia, além de entender como a inovação e a tecnologia estavam redefinindo o setor de saúde. O caminho também não foi (nunca é) livre de percalços: aversão a mudanças, barreiras culturais, regulamentação complexa e dificuldades de infraestrutura são algumas das dificuldades encontradas por empreendedores no País.
A interação com outros empreendedores em saúde, com a possibilidade de troca de experiências e parcerias, tem sido fundamental para o crescimento na área, superação de obstáculos e desenvolvimento de novas ideias. Além disso, dois hábitos que sempre cultivei são de grande valia para minha carreira empreendedora: a leitura, que me possibilita estar sempre por dentro de novidades, não só no campo da saúde; e a corrida de rua, que pratico há cerca de 20 anos e me traz resiliência, determinação e foco.
Ainda que a transição de médico radiologista para executivo, inovador e empreendedor em saúde tenha sido desafiadora, percebi que minha formação médica foi um diferencial importante nesse processo. O conhecimento clínico e a compreensão das necessidades dos profissionais de saúde e dos pacientes me permitiram desenvolver soluções mais relevantes e eficientes para todos. Fora isso, há a rede de contatos estabelecida ao longo dos anos – ela permite que possa contar com diversos amigos para apoiar na identificação e criação de soluções inovadoras para os desafios enfrentados na área.
Minha jornada como inovador e empreendedor em saúde está apenas no começo. Realmente acredito que a busca constante por conhecimento e inovação (além da capacidade de construir pontes e manter bons relacionamentos) são fundamentais para enfrentar as incertezas e evoluir no cenário em constante mudança da saúde. Empreender e gerenciar em saúde não se trata apenas de criar e manter um negócio, mas de impactar positivamente a vida das pessoas, melhorando a assistência, promovendo a prevenção e tornando o acesso à saúde mais democrático e eficiente.
A transformação é ininterrupta. Para a próxima etapa da jornada, pretendo dedicar a maior parte do meu tempo a iniciativas de inovação, com destaque para soluções que sejam acessíveis a todos e que tenham impacto social, fundamental em um país como o nosso. Que minha trajetória e meu esforço de aprendizado contínuo inspirem outros profissionais a buscar seus propósitos e a trilhar caminhos além dos limites convencionais, promovendo impactos positivos na sociedade e na saúde como um todo. O futuro está em nossas mãos e a inovação tem papel fundamental para desbloquear seu verdadeiro potencial.
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Artigo publicado na HSM Management nº 158.