De acordo com o estudo Twenty-five years of digitization: Ten insights into how to play it right (2019), do McKinsey Global Institute, mais de 50% dos projetos de transformação digital entregam menos lucro do que o planejado.
A maioria das organizações que iniciaram suas jornadas de transformação afirmou que as falhas aconteceram na etapa de escalar os pilotos ou provas de conceito dos projetos. Mas o que as impediu de escalar? E o que as empresas que estão experimentando melhores retornos sobre investimentos digitais estão fazendo de forma diferente das demais?
## Quando o ego é o inimigo
O que tenho encontrado durante minha experiência em consultoria de inovação e jornadas de transformação digital e organizacional é que o ego tem sido o fator de maior interferência no gerenciamento das mudanças. De fato, por muito tempo, os seres humanos ficaram acostumados a terem os fluxos de suas vidas pessoais e profissionais regidos pelo ego – ou seja, aquilo que faz com que as pessoas confiem em si mesmas e valorizem o seu próprio potencial.
No entanto, esse mesmo ego as leva a posturas arrogantes e a perderem a visão sistêmica e colaborativa, elementos essenciais para uma transformação efetiva. Assim, ao tentar resolver questões complexas e criar inovações ou executar mudanças, acabam sempre chegando com aquilo que já conhecem, aplicam tudo o que sabem, e o espaço para a inovação se esvai.
Ainda, muitas organizações têm clareza e colocam o foco nas iniciativas individuais para a transformação (no “o que”), em vez de focar em como o negócio deve mudar. Ficam cegas para a dimensão mais profunda na liderança e na transformação: o alicerce para qualquer movimento de transformação digital é a transformação do indivíduo. Portanto, fazer o caminho inverso e ir do “ego ao eco” pode ser um dos principais motores de mudança organizacional.
A expressão “ego-system to eco-system”, a transição de um sistema centrado no “eu” para um ecossistema focado no “nós”, no bem comum, foi elaborada por Otto Scharmer, professor do MIT e autor do best-seller *Teoria U* (2009).
A teoria U foi concebida para que as pessoas possam acessar sua consciência, seu estado interior, e tem sido aplicada nas organizações contemporâneas como uma metodologia de transformação dos modelos mentais e comportamentais dos seus líderes, impactando nas suas práticas de gestão de mudanças.
## “Open min, open heart, open will”
A essência da teoria U é de que, primeiro, precisamos esvaziar – para, então, encher de novo! A mente aberta, o coração aberto e a vontade aberta são as características para percorrer o U, da teoria de Scharmer.
**Mente aberta:** o primeiro passo, se baseia em ouvir – ouvir ao outro, ouvir a si mesmo e o que a vida os convoca a fazer. Por meio de reflexão e interiorização, buscar a intenção comum.
**Coração aberto:** a fase seguinte é um momento de observação. É necessário suspender a voz do julgamento e buscar identificar nossas relações com o meio em que estamos. Isso exige uma postura de audição e de “eterno aprendiz”.
**Vontade aberta:** na sequência (a etapa “presencing”), as pessoas entram em contato com a fonte do propósito. Esse é o ponto mais fundo do U, o ponto de inflexão, também chamado de “buraco da agulha”. É o momento de internalizar a importância de abandonar o que não é essencial, desconstruir as noções do passado para, então, poder construir o futuro que deseja emergir. É também a hora de colocar em prática, ainda em nível individual, concretizando o que foi visualizado na “descida do U”.
Depois disso, na “subida do U”, começam a surgir as novas possibilidades para o futuro (a etapa “cristalizar”).
**Coração aberto:** aprender fazendo, buscando as aplicações práticas, transformando as ideias em processos. Assim se inicia o caminho para montar modelos para a nova realidade (etapa “prototipar”).
**Mente aberta:** começar a operar um modelo ativo, integrar um novo ecossistema (etapa “decolar/performar”) finaliza o caminho a ser percorrido através da prática.
Segundo Bill O’Brien, que foi CEO da Hanover Insurance e membro fundador do MIT Center for Organizational Learning até seu falecimento em 2002, “o sucesso de uma intervenção depende da condição interna do interventor”. Ter consciência de que nós mesmos somos parte daquele sistema em que estamos promovendo a mudança é, portanto, a primeira e mais importante etapa em um processo de transformação digital.
A aplicação da teoria U pode ser um caminho para esvair-se dos preconceitos e barreiras do ego e encontrar o eco: a formação de times mais produtivos, com um propósito comum e prontos para realizar mudanças efetivas e gerar resultados de impacto nas jornadas de transformação.