Assunto pessoal

Disrupção pessoal: a história de Katie Dudtschak

Ela viveu – e prosperou – como homem nos primeiros 50 anos de sua vida. Foi pai de quatro crianças e é VP do Royal Bank of Canada. Mas, em 2019, assumiu-se como mulher

Compartilhar:

Em 17 de junho de 2019, num ponto da carreira em que liderava 80 mil colaboradores e tinha 15 milhões de clientes no Royal Bank of Canada (RBC), Katie Dudtschak decidiu se assumir como mulher. “Como sou uma executiva sênior com mais de 30 anos de experiência, você pode perguntar: ‘Por que, neste momento de sua vida?’. Levei muitos anos para chegar a um lugar de plena autenticidade e paz com quem eu sou. Hoje, estou em um ponto da vida em que posso dizer honestamente que me amo”, contou ela à Rotman Management, revista da Rotman School, da University of Toronto.

Quando os questionamentos de gênero de Dudtschak apareceram para o mundo, ela já lidava com eles havia décadas, desde a infância. Ela conta que reprimia seus instintos estabelecendo metas para sua vida e se mantendo ocupada, e assim os anos foram se passando. “Isso funcionou muito bem até mais ou menos 2014, quando meus filhos ficaram mais velhos e eu atingi um estágio de maturidade na carreira. Meu trabalho ficou mais fácil, porque eu sabia fazê-lo intuitivamente”, conta ela. “Foi aí que ‘a barragem se rompeu’: meus sentimentos de gênero ficaram mais fortes, porque de repente havia espaço para eles. Eu simplesmente não podia mais ignorá-los.”

Não foi uma transição tranquila, no entanto. “Como muitas pessoas com experiência transgênero, ao entender que minha mente era feminina em um corpo físico que nasceu masculino, acabei em um lugar muito escuro. Cerca de 80% a 90% de nós consideramos seriamente o suicídio. O medo de rejeição e julgamento é o que leva as pessoas ao limite da saúde mental.”

Dudtschak decidiu trazer as pessoas do trabalho para sua jornada. Dois meses após se abrir para a família, ela contou a verdade ao CEO do Royal Bank of Canadá e ao executivo-chefe de recursos humanos. E, para sua surpresa, a resposta foi extraordinariamente positiva. O CEO da empresa lhe mandou uma mensagem dizendo: “Não consigo acreditar em sua coragem. Tenho muito a aprender com você. O RBC está com você nisso”.

O passo seguinte foi “sair do armário” diante dos 80 mil funcionários do RBC. Junto com o RH, Dudtschak criou um vídeo com a participação do CEO. O vídeo gerou uma resposta inesperada: funcionários da empresa com problemas de vulnerabilidade, abusos e discriminação começaram a lhe mandar mensagens contando suas histórias.

“Há uma lição de liderança aí”, disse Dudtschak à Rotman Management. “Ao mostrar vulnerabilidade, você convida as pessoas à vulnerabilidade. O que vemos das pessoas no trabalho é só a ponta do iceberg. Há seres humanos inteiros lá embaixo e, em muitos casos – se não todos –, há traumas ou lutas que eles aprenderam a suprimir.”

__Leia mais: [Um novo ponto de retorno](https://www.revistahsm.com.br/post/um-novo-ponto-de-retorno)__

Compartilhar:

Artigos relacionados

Há um fio entre Ada Lovelace e o CESAR

Fora do tempo e do espaço, talvez fosse improvável imaginar qualquer linha que me ligasse a Ada Lovelace. Mais improvável ainda seria incluir, nesse mesmo

Empreendedorismo
Embora talvez estejamos longe de ver essa habilidade presente nos currículos formais, é ela que faz líderes conscientes e empreendedores inquietos
3 min de leitura
Marketing Business Driven
Leia esta crônica e se conscientize do espaço cada vez maior que as big techs ocupam em nossas vidas
3 min de leitura
Empreendedorismo
Falta de governança, nepotismo e desvios: como as empresas familiares repetem os erros da vilã de 'Vale Tudo'

Sergio Simões

7 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Já notou que estamos tendo estas sensações, mesmo no aumento da produção?

Leandro Mattos

7 min de leitura
Empreendedorismo
Fragilidades de gestão às vezes ficam silenciosas durante crescimentos, mas acabam impedindo um potencial escondido.

Bruno Padredi

5 min de leitura
Empreendedorismo
51,5% da população, só 18% dos negócios. Como as mulheres periféricas estão virando esse jogo?

Ana Fontes

5 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A inteligência artificial está reconfigurando decisões empresariais e estruturas de poder. Sem governança estratégica, essa tecnologia pode colidir com os compromissos ambientais, sociais e éticos das organizações. Liderar com consciência é a nova fronteira da sustentabilidade corporativa.

Marcelo Murilo

7 min de leitura
ESG
Projeto de mentoria de inclusão tem colaborado com o desenvolvimento da carreira de pessoas com deficiência na Eurofarma

Carolina Ignarra

6 min de leitura
Saúde mental, Gestão de pessoas
Como as empresas podem usar inteligência artificial e dados para se enquadrar na NR-1, aproveitando o adiamento das punições para 2026
0 min de leitura
ESG
Construímos um universo de possibilidades. Mas a pergunta é: a vida humana está realmente melhor hoje do que 30 anos atrás? Enquanto brasileiros — e guardiões de um dos maiores biomas preservados do planeta — somos chamados a desafiar as retóricas de crescimento e consumo atuais. Se bem endereçados, tais desafios podem nos representar uma vantagem competitiva e um fôlego para o planeta

Filippe Moura

6 min de leitura