Liderança, Comunidades: CEOs do Amanhã

Lideranças radicais: contra os novos monopólios de tecnologia

Inspirações não faltam para convidar você a acreditar na construção de outras formas de produção que fogem do modelo de concentração tecnológica e de renda
Agente de transformação digital na Petrobrás, economista de formação e profissional de inovação e transformação digital. Pesquisador curioso em temas ligados a futurologia, economia, design, tecnologia e ficção no grupo Antenna, do Atelier do Futuro.

Compartilhar:

O espírito atual do tempo está sendo marcado por um grande desejo por transformações profundas, mudanças essas que impactem o rumo da humanidade permanentemente e nos livrem de (ou adiem) um apocalipse. Movimentos como [capitalismo consciente](https://mitsloanreview.com.br/post/o-capitalismo-pode-salvar-o-mundo), expansão de consciência, “the great reset”, dentre outros, têm ganhado visibilidade e também aumentado as tensões com àqueles que negam a notória falência do capitalismo do século XX.

Sem dúvidas, esse sentimento cresceu com a pandemia global de covid-19 ao longo de todo o ano de 2020 e temas como futurismo, futurologia e “f[oresight](https://mitsloanreview.com.br/post/as-revolucoes-simultaneas)” têm ganhado cada vez mais espaço de discussão em empresas e outras organizações. Afinal de contas, se você não escutou a expressão “novo normal” ao longo do ano, não viveu 2020 direito.

De modo geral, os diversos [relatórios de tendência](https://mitsloanreview.com.br/post/fjord-trends-2020-essas-tendencias-podem-ser-fundamentais-no-seu-negocio) acerca do “novo normal” prescrevem o uso cada vez mais intensivo das tecnologias digitais, impactando nossas relações de consumo e de trabalho. Como já sabemos, as tecnologias digitais têm provocado transformações sociais rapidamente e reconfigurado as condições de mercado em escalas sem precedentes.

Nesse contexto, as organizações estão correndo para atualizar seus modelos de negócio e suas estruturas para enfrentar os desafios que emergem a cada dia. Mas será que existe algo realmente novo nisso tudo daqui para frente?

## Monopólios constroem desigualdades

Desde o início da minha carreira, me encantei com as possibilidades de criação e disrupção das novas tecnologias e, também por isso, decidi direcionar a minha carreira para este universo. Por muito tempo, idealizei trabalhar em grandes empresas de tecnologia porque acreditava que o [caminho para reduzir desigualdades](https://www.revistahsm.com.br/post/wickbold-combater-a-desigualdade-aproveitar-a-oportunidade) e gerar prosperidade e abundância passava por pela aceleração e democratização das tecnologias digitais e emergentes.

Até que continuo acreditando nisso, mas será que estamos trilhando este caminho? Nossas organizações e instituições estão usando os recursos tecnológicos para gerar prosperidade e abundância? Tenho me feito bastante essas perguntas recentemente e repensado meu papel como um profissional de transformação digital nesse panorama.

Na verdade, estamos enfrentando um panorama econômico bastante crítico ao longo dos últimos anos, caracterizado por um fenômeno denominado estagdesigualdade: estagnação do crescimento econômico e aumento da concentração de renda.

As tecnologias digitais foram fundamentais para desmonetizar serviços e reduzir custos empresariais, o que transformou mercados e até quebrou monopólios. Mas, por outro lado, também criou outros monopólios, fragilizou relações de trabalho e aumentou a riqueza dos mais ricos, mesmo em momentos de crise como a que vivemos agora devido à pandemia, aumentando as tensões sociais já tão estressadas há algum tempo.

No artigo ”[Market Power, Inequality, and Financial Instability](https://www.federalreserve.gov/econres/feds/market-power-inequality-and-financial-instability.htm)”, publicado em agosto de 2020, dois economistas do Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, concluíram que o aumento do poder de mercado de grandes empresas ao longo dos últimos 40 anos é o grande responsável pelo aumento da desigualdade de renda no país.
Os economistas recomendam ainda que políticas de redistribuição de renda sejam utilizadas para moderar a desigualdade e prevenir um (novo) colapso financeiro. Ao longo dos últimos anos e, principalmente em 2020, o poder exercido pelas [big techs têm sido alvo de investigações](https://mitsloanreview.com.br/post/o-ponto-cego-do-dilema-das-redes) e questionamentos nos EUA e na Europa, por conta de armazenamento inadequado de dados e invasão de privacidade.

Mais recentemente, a agência reguladora do livre mercado norte-americana abriu processo judicial contra o Facebook por práticas anticompetitivas e solicitou a separação do Whatsapp e do Instagram da empresa.

## Concentração de tecnologia e renda

Mesmo com todas as facilidades trazidas pelas tecnologias digitais, continuamos construindo (e desejando) monopólios. Com a internet, os limites geográficos foram quebrados e os [modelos de negócio passaram a ser avaliados de acordo com seu grau de escalabilidade](https://www.revistahsm.com.br/post/cooperativismo-high-tech). Isto significa que os grandes investidores buscam negócios com alto potencial de retorno e a baixo custo, considerando a abrangência estendida do ambiente virtual e as economias de escopo adquiridas.

Por outro lado, isto também tem significado a proliferação de negócios baseados em concentrar em um único lugar, uma plataforma (marketplace), transações comerciais diversas. Vimos isso acontecer com o transporte particular por aplicativo, serviços de delivery, e todo tipo de bens de consumo que podem ser comprados com um clique na “loja de tudo”.

Nas representações de futuro que temos feito, me parece que não conseguimos imaginar outras perspectivas que não a perpetuação ou a construção de monopólios com o uso das tecnologias digitais emergentes. Se fala muito sobre o uso da inteligência artificial como vantagem competitiva para as organizações e dos seus impactos nas relações de trabalho, como uma extensão da configuração das relações capitalistas de hoje para daqui alguns anos.

Até mesmo no campo da ficção especulativa, que tem sido objeto de estudo de futurólogos para na construção de novas representações, caímos em muitos casos na mesma armadilha. Já percebeu como em muitas das narrativas famosas de ficção o problema gira em torno de uma grande corporação ou de governos totalitários que concentram poder de forma desproporcional?

## Ações de lideranças radicais

Não seria o momento de direcionarmos nossas energias para desenvolver modelos de negócio e de representação distribuídos, com mecanismos que não incentivem concentração (e que reduzam a necessidade de intermediários)?

Para isso, precisamos de lideranças radicais. Sim, lideranças radicais com coragem para tomar ações radicais nessa direção. Precisamos também nos cercar de referências que abram nossa visão acerca das possibilidades de funcionamento de todas as coisas. Como já nos alertou [Chimamanda Adichie](https://www.revistahsm.com.br/post/sororidade-e-pratica-coletiva), o perigo da história única é passarmos a acreditar que só há um caminho possível. Será mesmo que as relações sociais postas pelo capitalismo são as únicas possíveis?

Conseguimos imaginar outros modos de produção, a partir de tecnologias emergentes como o [blockchain](https://mitsloanreview.com.br/post/blockchain-e-modelos-de-negocio) e a [inteligência artificial](https://mitsloanreview.com.br/post/consciencia-artificial-um-universo-dentro-da-maquina), tão estudadas por diversos profissionais de tecnologia da informação, inovação e produtos? Me inspiro, por exemplo, na obra de Octavia Butler, escritora afro-americana de ficção, que especula sobre as relações entre humanos e possíveis povos alienígenas, com organizações sociais completamente diferentes, nos fazendo refletir sobre o nosso próprio pacto social.

Me inspiro também em lideranças brasileiras e reais como Alexander Albuquerque, fundador e CEO do Banco Maré, e Taynaah Reis, fundadora e CEO da Moeda Seeds, que estão facilitando o acesso a serviços financeiros e ao crédito por meio de [criptomoedas](https://mitsloanreview.com.br/post/o-dinheiro-ja-nao-e-o-mesmo). Ou a Revolusolar, que está constituindo a primeira cooperativa de energia solar em uma favela no Brasil. Referências não faltam e, a partir delas, precisamos exercitar a construção de novos mundos com as ferramentas que já temos disponíveis hoje e as que estão emergindo. Vamos juntos?

*Gostou do artigo do Daniel Torquato? Sabia mais sobre os principais conteúdo do Brasil sobre liderança, negócios e carreira assinando gratuitamente [nossas newsletters ](https://www.revistahsm.com.br/newsletter)e escutando [nossos podcasts](https://www.revistahsm.com.br/podcasts) na sua plataforma de streaming favorita.*

Compartilhar:

Artigos relacionados

Mercado de RevOps desponta e se destaca com crescimento acima da média 

O Revenue Operations (RevOps) está em franca expansão global, com estimativa de que 75% das empresas o adotarão até 2025. No Brasil, empresas líderes, como a 8D Hubify, já ultrapassaram as expectativas, mais que dobrando o faturamento e triplicando o lucro ao integrar marketing, vendas e sucesso do cliente. A Inteligência Artificial é peça-chave nessa transformação, automatizando interações para maior personalização e eficiência.

Uso de PDI tem sido negligenciado nas companhias

Apesar de ser uma ferramenta essencial para o desenvolvimento de colaboradores, o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) vem sendo negligenciado por empresas no Brasil. Pesquisa da Mereo mostra que apenas 60% das companhias avaliadas possuem PDIs cadastrados, com queda no engajamento de 2022 para 2023.

Regulamentação da IA: Como empresas podem conciliar responsabilidades éticas e inovação? 

A inteligência artificial (IA) está revolucionando o mundo dos negócios, mas seu avanço rápido exige uma discussão sobre regulamentação. Enquanto a Europa avança com regras para garantir benefícios éticos, os EUA priorizam a liberdade econômica. No Brasil, startups e empresas se mobilizam para aproveitar as vantagens competitivas da IA, mas aguardam um marco legal claro.

Governança estratégica: a gestão de riscos psicossociais integrada à performance corporativa

A gestão de riscos psicossociais ganha espaço nos conselhos, impulsionada por perdas estimadas em US$ 3 trilhões ao ano. No Brasil, a atualização da NR1 exige que empresas avaliem e gerenciem sistematicamente esses riscos. Essa mudança reflete o reconhecimento de que funcionários saudáveis são mais produtivos, com estudos mostrando retornos de até R$ 4 para cada R$ 1 investido

Empreendedorismo
A importância de uma cultura organizacional forte para atingir uma transformação de visão e valores reais dentro de uma empresa

Renata Baccarat

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Em meio aos mitos sobre IA no RH, empresas que proíbem seu uso enfrentam um paradoxo: funcionários já utilizam ferramentas como ChatGPT por conta própria. Casos práticos mostram que, quando bem implementada, a tecnologia revoluciona desde o onboarding até a gestão de performance.

Harold Schultz

3 min de leitura
Gestão de Pessoas
Diferente da avaliação anual tradicional, o modelo de feedback contínuo permite um fluxo constante de comunicação entre líderes e colaboradores, fortalecendo o aprendizado, o alinhamento de metas e a resposta rápida a mudanças.

Maria Augusta Orofino

3 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A Inteligência Artificial, impulsionada pelo uso massivo e acessível, avança exponencialmente, destacando-se como uma ferramenta inclusiva e transformadora para o futuro da gestão de pessoas e dos negócios

Marcelo Nóbrega

4 min de leitura
Liderança
Ao promover autonomia e resultados, líderes se fortalecem, reduzindo estresse e superando o paternalismo para desenvolver equipes mais alinhadas, realizadas e eficazes.

Rubens Pimentel

3 min de leitura
Empreendedorismo, Diversidade, Uncategorized
A entrega do Communiqué pelo W20 destaca o compromisso global com a igualdade de gênero, enfatizando a valorização e o fortalecimento da Economia do Cuidado para promover uma sociedade mais justa e produtiva para as mulheres em todo o mundo

Ana Fontes

3 min de leitura
Diversidade
No ambiente corporativo atual, integrar diferentes gerações dentro de uma organização pode ser o diferencial estratégico que define o sucesso. A diversidade de experiências, perspectivas e habilidades entre gerações não apenas enriquece a cultura organizacional, mas também impulsiona inovação e crescimento sustentável.

Marcelo Murilo

21 min de leitura
Finanças
Casos de fraude contábil na Enron e Americanas S.A. revelam falhas em governança corporativa e controles internos, destacando a importância de transparência e auditorias eficazes para a integridade empresarial

Marco Milani

3 min de leitura
Liderança
Valorizar o bem-estar e a saúde emocional dos colaboradores é essencial para um ambiente de trabalho saudável e para impulsionar resultados sólidos, com lideranças empáticas e conectadas sendo fundamentais para o crescimento sustentável das empresas.

Ana Letícia Caressato

6 min de leitura
Empreendedorismo
A agência dos agentes em sistemas complexos atua como força motriz na transformação organizacional, conectando indivíduos, tecnologias e ambientes em arranjos dinâmicos que moldam as interações sociais e catalisam mudanças de forma inovadora e colaborativa.

Manoel Pimentel

3 min de leitura