Estratégia e Execução

Nasce o executivo do cliente

Sob a sigla CCO, o novo cargo sênior vem se disseminando entre as empresas que buscam crescimento saudável e simboliza as mudanças da área.

Compartilhar:

Provavelmente em 2003, foi criado, em uma empresa dos Estados Unidos, o primeiro cargo de executivo-chefe do cliente (CCO, na sigla em inglês). Hoje, eles ainda são poucos: há 408 CCOs em atividade no mundo todo – cinco deles na América Latina. O Brasil já tem diretores do cliente, mas faltam-nos dados. É significativo, contudo, que o cargo venha se disseminando especialmente em organizações que buscam crescimento sustentável com base em estratégias centradas no cliente, e que, entre as cem maiores empresas dos EUA listadas pela revista Fortune, 22 já tenham um CCO. Isso mostra que a área de serviço ao cliente começa a ganhar a atenção do CEO, como concorda Curtis Bingham, fundador e diretor-executivo do CCO Council, sediado em Seattle, nos EUA, nesta entrevista a HSM Management.

> **Saiba mais sobre – Curtis Bingham**
>
> **Quem é**: Fundador, em 2009, do Chief Customer Officer Council e diretor-executivo  da entidade. 
>
> **Especialidades:** Estratégia de clientes, engajamento de clientes, gestão da experiência do cliente, fidelização de clientes, crescimento centrado no cliente; atua como consultor e palestrante.
>
> **E****xperiência:** Já trabalhou com mais de 200 CCOs.

**Quais são as atribuições de um CCO?** 

Seu papel ainda não é padronizado; cada empresa define um modelo com base em suas necessidades. Mas as principais atribuições são monitorar a satisfação e a lealdade dos clientes, aperfeiçoando a experiência com a marca, e traçar estratégias para aumentar a lucratividade por meio desse relacionamento. Um bom CCO consegue balancear os interesses do consumidor, melhorando sua satisfação, com as da empresa, colaborando para o crescimento dos negócios. Outras áreas, como marketing, comunicação e vendas, devem poder usar as informações obtidas pelo CCO para gerar melhores resultados.

**A quem o CCO se reporta?**

Idealmente ao CEO, mas na prática eu o vejo reportar-se também ao responsável pelo marketing, por operações ou pela área comercial. Em minha visão, para ter sucesso, ele não pode estar mais que um nível abaixo do CEO. 

**Como é a estrutura que o CCO comanda?** 

Há pelo menos dois modelos. Em um, o CCO pode gerir estruturas reunidas em um departamento de relacionamento com o consumidor, como call center, pós-venda, comunicação com os clientes. 

O outro modelo é ter uma estrutura pequena sob sua liderança, com um desafio adicional: criar formas de motivar e influenciar outros departamentos a ter melhor percepção das necessidades e dos desejos do consumidor.

**Toda empresa precisa de CCO?** 

Não, porém a existência do cargo envia uma mensagem poderosa à organização, aos concorrentes e aos consumidores sobre centrar-se  em clientes. 

**Como é a carreira do CCO?** 

Há uma estabilidade média de 34 meses no cargo – ainda pouca em relação a outras posições seniores mais maduras. Isso lhe dá vulnerabilidade. Por exemplo, na recente recessão de 2008, muitos CCOs perderam o emprego porque não conseguiram comprovar o retorno sobre o investimento [ROI, na sigla em inglês]. As contratações começaram a subir novamente em 2010. No entanto, em 2014, tivemos uma boa notícia: dos 89 CCOs que deixaram o cargo, a maioria foi promovida internamente, transferida lateralmente para assumir um papel relevante ou contratada por outra empresa. 

**Até onde vai o poder do CCO para alterar processos dentro da empresa?**

Ele precisa ter autoridade, nem que seja uma “autoridade tomada por empréstimo”. Como? Cito o exemplo de Jasmine Green, CCO da Nationwide, empresa de seguros e serviços financeiros dos EUA. Ao apresentá-la aos demais executivos, o CEO, Steve Rasmussen, disse: “Essa é Jasmine e ela fala por mim a partir de agora”. O CEO transferiu seu poder à CCO.

**O sr. pode eleger uma habilidade-chave para o CCO?** 

Basicamente, o poder de influenciar os outros. Ele consegue mudar as coisas dentro de uma empresa à medida que os departamentos forem influenciados por ele e enxergarem os processos do ponto de vista do consumidor. 

**Um CCO sozinho resolve a insatisfação do consumidor?** 

Não. Todo CCO tem de reconhecer isso: ele depende da colaboração de diversas áreas, como produção, entrega, pós-venda, suporte e comunicação. E, por mais competente que seja, um CCO não faz milagre. Cito o caso da [telecom] Comcast, famosa por seu lastimável serviço ao cliente. Recentemente, ela contratou um CCO para ajudar a mudar a cultura interna e incluir o cliente nas decisões. Os atendentes estão sendo retreinados e os processos, ajustados, mas a insatisfação continua. Reconstruir a relação de confiança leva tempo. 

**Que lições um CCO e a empresa dele têm de aprender?** O mais importante é gerar o comprometimento de todos os executivos do primeiro escalão com a causa do cliente. Se os colegas não estiverem convencidos da importância disso, até o melhor CCO terá suas iniciativas sabotadas. 

Outro fator imperativo é criar métricas para medir a eficácia das iniciativas centradas no cliente; se nada é medido, não há como saber se os esforços estão surtindo efeito. O CCO tem de ser capaz de comprovar seu ROI em todas as oportunidades. Por último, eu diria que a equipe destacada para interagir com os clientes deve ser selecionada com base na atitude e no interesse em ajudar. Fica muito mais difícil prepará-la adequadamente se não houver essa predisposição natural. 

**Qual deve ser a primeira iniciativa de um CCO?** 

Ele começa detectando e atacando os principais motivos de descontentamento dos clientes, mede a evolução disso e a comunica a toda a organização. 

**Qual será o futuro do cargo?** 

Antes eu acreditava que, uma vez que a empresa evoluísse para a cultura do cliente, gravaria isso em seu DNA e esse executivo não seria mais necessário. Mudei de opinião. Da mesma forma que não fica sem um CFO quando está indo bem financeiramente, uma empresa não deve ficar sem um CCO quando tornar-se centrada no cliente. Isso porque o mercado muda, o consumidor muda e a própria companhia muda – é preciso alguém que tenha esse foco permanente e claro. Com os consumidores mais impacientes, estou convencido de que o papel do CCO vai ganhar importância crescente.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Quando a IA desafia o ESG: o dilema das lideranças na era algorítmica

A inteligência artificial está reconfigurando decisões empresariais e estruturas de poder. Sem governança estratégica, essa tecnologia pode colidir com os compromissos ambientais, sociais e éticos das organizações. Liderar com consciência é a nova fronteira da sustentabilidade corporativa.

Gestão de Pessoas
O aprendizado está mudando, e a forma de reconhecer habilidades também! Micro-credenciais, certificados e badges digitais ajudam a validar competências de forma flexível e alinhada às demandas do mercado. Mas qual a diferença entre eles e como podem impulsionar carreiras e instituições de ensino?

Carolina Ferrés

9 min de leitura
Inovação
O papel do design nem sempre recebe o mérito necessário. Há ainda quem pense que se trata de uma área do conhecimento que é complexa em termos estéticos, mas esse pensamento acaba perdendo a riqueza de detalhes que é compreender as capacidades cognoscíveis que nós possuímos.

Rafael Ferrari

8 min de leitura
Inovação
Depois de quatro dias de evento, Rafael Ferrari, colunista e correspondente nos trouxe suas reflexões sobre o evento. O que esperar dos próximos dias?

Rafael Ferrari

12 min de leitura
ESG
Este artigo convida os profissionais a reimaginarem a fofoca — não como um tabu, mas como uma estratégia de comunicação refinada que reflete a necessidade humana fundamental de se conectar, compreender e navegar em paisagens sociais complexas.

Rafael Ferrari

7 min de leitura
ESG
Prever o futuro vai além de dados: pesquisa revela que 42% dos brasileiros veem a diversidade de pensamento como chave para antecipar tendências, enquanto 57% comprovam que equipes plurais são mais produtivas. No SXSW 2025, Rohit Bhargava mostrou que o verdadeiro diferencial competitivo está em combinar tecnologia com o que é 'unicamente humano'.

Dilma Campos

7 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Para líderes e empreendedores, a mensagem é clara: invista em amplitude, não apenas em profundidade. Cultive a curiosidade, abrace a interdisciplinaridade e esteja sempre pronto para aprender. O futuro não pertence aos que sabem tudo, mas aos que estão dispostos a aprender tudo.

Rafael Ferrari e Marcel Nobre

5 min de leitura
ESG
A missão incessante de Brené Brown para tirar o melhor da vulnerabilidade e empatia humana continua a ecoar por aqueles que tentam entender seu caminho. Dessa vez, vergonha, culpa e narrativas são pontos cruciais para o entendimento de seu pensamento.

Rafael Ferrari

0 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A palestra de Amy Webb foi um chamado à ação. As tecnologias que moldarão o futuro – sistemas multiagentes, biologia generativa e inteligência viva – estão avançando rapidamente, e precisamos estar atentos para garantir que sejam usadas de forma ética e sustentável. Como Webb destacou, o futuro não é algo que simplesmente acontece; é algo que construímos coletivamente.

Glaucia Guarcello

5 min de leitura
Tecnologias exponenciais
O avanço do AI emocional está revolucionando a interação humano-computador, trazendo desafios éticos e de design para cada vez mais intensificar a relação híbrida que veem se criando cotidianamente.

Glaucia Guarcello

7 min de leitura
Tecnologias exponenciais
No SXSW 2025, Meredith Whittaker alertou sobre o crescente controle de dados por grandes empresas e governos. A criptografia é a única proteção real, mas enfrenta desafios diante da vigilância em massa e da pressão por backdoors. Em um mundo onde IA e agentes digitais ampliam a exposição, entender o que está em jogo nunca foi tão urgente.

Marcel Nobre

5 min de leitura