Desenvolvimento pessoal

Pare de tentar equilibrar vida pessoal e profissional

Vida só existe uma. E o trabalho se insere nela, não ao contrário. Alinhe seus critérios de sucesso profissional e valores pessoais para facilitar nas tomadas de decisão
Antonio Werneck é fundador e CEO da Makesense Ltda. Foi CEO, entre outras, da Reckitt Benckiser, Santher e Bombril, além de conselheiro da Cia. Muller de Bebidas e J. Macêdo.

Compartilhar:

Quando trabalhava em Londres como executivo de uma grande empresa de produtos de limpeza, seguia em uma promissora carreira internacional. Em um belo dia, minha esposa, também executiva de multinacional, trouxe a notícia de que lhe haviam oferecido um cargo de diretoria em Paris. O que fazer? A decisão claramente impactava a vida do casal, não só do ponto de vista profissional, mas igualmente pessoal.

Como fazer quando se tem duas carreiras em jogo? E ainda, vida profissional ou vida pessoal? Muitas pessoas se colocam diante dessa questão e sofrem, temendo os impactos de uma “decisão errada” em sua trajetória profissional.

Pena, pois talvez ainda não tenham entendido verdadeiramente que o trabalho se insere na vida *latu sensu*, e não o contrário.

Fácil falar, mas na hora de decidir, tudo se complica, não?

Ao longo da minha vida profissional vi muitos colegas workaholics confessarem que não viram seus filhos crescer. E sempre que uma mulher bem-sucedida, executiva ou empresária, era entrevistada, vi outras (mais jovens) perguntarem: “como você conseguiu conciliar ser mãe e ter uma carreira tão incrível?”.

Acho que o problema se coloca de forma equivocada, pois o abordamos como uma dicotomia, em que dois polos opostos, dois mundos, lutam para coexistir em um mesmo espaço físico.

Isso é, ao meu ver, de uma falida lógica newtoniana. Há que se mudar o olhar, adotando uma abordagem “quântica” onde um mundo de infinitas possibilidades já existe e o observador (protagonista) é quem define a realidade que deseja vivenciar.

Há dois pré-requisitos para isso: ter essa consciência e ter a coragem de encarar as consequências que uma escolha acarreta.

Consciência, pois há que se saber com profunda honestidade o que realmente se deseja da vida, a longo prazo. Isso impõe uma definição clara daquilo que realmente importa.

Coragem, pois em toda escolha algo tem que ceder e há sempre uma percepção de risco: muitas vezes há “um salto no escuro” sem que se saiba exatamente para onde a decisão levará.

Mas se alguém tem que ceder, sempre haverá perda, certo?

Errado. Afirmo que isso é uma ilusão, pois a perda só parece ser mais palpável do que os ganhos potenciais.

Na construção de uma carreira profissional de sucesso é muito comum nos fecharmos em critérios, tais como ganhos financeiros, status, prestígio e reconhecimento social. Todos critérios válidos, mas derivam de uma ótica do ego, onde a essência da alma não é computada. Assim, a estrada da carreira logo se torna uma trilha estreita e, mais adiante, uma verdadeira corda-bamba, impondo uma verdadeira habilidade de equilibrista.

No entanto, se a pessoa tiver claro aquilo que realmente lhe importa, as escolhas devem ser feitas colocando-se diante de uma palete de critérios mais ampla, adotando uma visão mais profunda diante das opções que se apresentam no caminho. É difícil, certo, ter essa perspectiva quando ainda se é jovem e inexperiente, mas há mentores, coaches ou “bons amigos” (aqueles que lhe dizem o que você precisa ouvir, ao invés do que você quer escutar) e até bons líderes, para ajudar.

Assim, o dilema da escolha se reduz a dois desafios: o do autoconhecimento e da clareza dos valores que nos conduzem ao longo da vida. Não há certo ou errado, apenas opções que nos levam a lugares diferentes, ainda que não se saiba exatamente aonde o caminho conduz. O importante é ter a convicção de que há coerência entre a escolha feita e nossos valores mais íntimos e profundos.

Se aceitarmos que nossas escolhas devem ser pautadas por critérios claramente pré-definidos, a dúvida, que é a distância que separa aquilo que você pensa daquilo que você sente, rapidamente desaparece (pois, não há dúvida quando você pensa e sente a mesma coisa!).

Londres: o que fiz, então? Inicialmente, tentei conciliar a oportunidade da minha esposa com minha empresa, mas não haviam opções em Paris. Como eu não aceitava a ideia de ficar longe da família e me deslocando nos fins de semana, a decisão era óbvia (ainda que emocionalmente difícil): renunciei ao cargo após 12 anos e deixei uma empresa que me havia dado incríveis oportunidades, e me mudei para Paris a procura de emprego.

Carreira ou família? Uma ilusão!

Preservei aquilo que me era profundamente caro (família) e continuei minha carreira em outras multinacionais. Acabei contratado por outra empresa multinacional que me deu uma experiência relevante para o passo seguinte, quando retornamos ao Brasil, anos mais tarde.

Conclusão: quando se sabe o que realmente importa, as decisões ficam menos difíceis e, ao longo do tempo (da vida), nada se perde, pois há inúmeras maneiras de se chegar àquilo que almejamos, seja na profissão ou na vida pessoal.

Por isso digo, esqueça o equilíbrio entre vida pessoal e profissional!

Só existe “vida” e, se seus critérios de sucesso profissional e valores pessoais estiverem alinhados, há grande chance de você escapar da armadilha em que tantos caem.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Organização

A difícil arte de premiar sem capitular

Desde Alfred Nobel, o ato de reconhecer os feitos dos seres humanos não é uma tarefa trivial, mas quando bem-feita costuma resultar em ganho reputacional para que premia e para quem é premiado

ESG
Adotar o 'Best Before' no Brasil pode reduzir o desperdício de alimentos, mas demanda conscientização e mudanças na cadeia logística para funcionar

Lucas Infante

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
No SXSW 2025, a robótica ganhou destaque como tecnologia transformadora, com aplicações que vão da saúde e criatividade à exploração espacial, mas ainda enfrenta desafios de escalabilidade e adaptação ao mundo real.

Renate Fuchs

6 min de leitura
Inovação
No SXSW 2025, Flavio Pripas, General Partner da Staged Ventures, reflete sobre IA como ferramenta para conexões humanas, inovação responsável e um futuro de abundância tecnológica.

Flávio Pripas

5 min de leitura
ESG
Home office + algoritmos = epidemia de solidão? Pesquisa Hibou revela que 57% dos brasileiros produzem mais em times multidisciplinares - no SXSW, Harvard e Deloitte apontam o caminho: reconexão intencional (5-3-1) e curiosidade vulnerável como antídotos para a atrofia social pós-Covid

Ligia Mello

6 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo de incertezas, os conselhos de administração precisam ser estratégicos, transparentes e ágeis, atuando em parceria com CEOs para enfrentar desafios como ESG, governança de dados e dilemas éticos da IA

Sérgio Simões

6 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Os cuidados necessários para o uso de IA vão muito além de dados e cada vez mais iremos precisar entender o real uso destas ferramentas para nos ajudar, e não dificultar nossa vida.

Eduardo Freire

7 min de leitura
Liderança
A Inteligência Artificial está transformando o mercado de trabalho, mas em vez de substituir humanos, deve ser vista como uma aliada que amplia competências e libera tempo para atividades criativas e estratégicas, valorizando a inteligência única do ser humano.

Jussara Dutra

4 min de leitura
Gestão de Pessoas
A história familiar molda silenciosamente as decisões dos líderes, influenciando desde a comunicação até a gestão de conflitos. Reconhecer esses padrões é essencial para criar lideranças mais conscientes e organizações mais saudáveis.

Vanda Lohn

5 min de leitura
Empreendedorismo
Afinal, o SXSW é um evento de quem vai, mas também de quem se permite aprender com ele de qualquer lugar do mundo – e, mais importante, transformar esses insights em ações que realmente façam sentido aqui no Brasil.

Dilma Campos

6 min de leitura
Uncategorized
O futuro das experiências de marca está na fusão entre nostalgia e inovação: 78% dos brasileiros têm memórias afetivas com campanhas (Bombril, Parmalat, Coca-Cola), mas resistem à IA (62% desconfiam) - o desafio é equilibrar personalização tecnológica com emoções coletivas que criam laços duradouros

Dilma Campos

7 min de leitura