Uncategorized

Que Terror!

Não temos ideia de como, quando e aonde ele vai nos atacar
Psicanalista e psiquiatra, doutor em psicanálise e em medicina. Autor de vários livros, especialmente sobre o tratamento das mudanças subjetivas na pós-modernidade, recebeu o Prêmio Jabuti em 2013. É criador e apresentador do Programa TerraDois, da TV Cultura, eleito o melhor programa da TV brasileira em 2017 pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).

Compartilhar:

Estamos sendo duramente apresentados a uma das formas do incompleto das nossas vidas, na figura desse vírus avassalador. Estamos em perigo! Freud diferenciava – em um texto escrito há exatos 100 anos, Além do princípio do prazer – três formas distintas de reagir ao perigo: Angústia, Medo e Terror. 

Cito-o: “Angústia” designa um estado de expectativa do perigo e preparação para ele, ainda que seja desconhecido; “Medo” requer um determinado objeto, ante o qual nos amedrontamos; “Terror” se denomina o estado em que ficamos a correr de um perigo sem estarmos para ele preparados: o terror enfatiza o fator surpresa.

A atual pandemia nos aterroriza. É como se vivêssemos um combate de guerrilha. Nosso inimigo é pequenininho, sabemos da sua existência, mas não temos ideia de como, quando e aonde ele vai nos atacar. Ele nos surpreende dolorosamente.

Não é correto diagnosticar os efeitos psíquicos dessa pandemia como uma histeria. Ela é um terror. As reações a esse terror é que podem assumir matizes variáveis, entre outros: histéricos, obsessivos, perversos, paranoicos, psicóticos. Em uma situação dessas, cada pessoa escarafuncha seus sintomas de base e os expressa.

O histérico pode dramatizar excessivamente esse momento, ou fazer o contrário, ficar indiferente (La belle indifférence). O obsessivo encontrará justificativa para suas manias de limpeza, de distância, de rituais, ou pode hipertrofiar a arrogância do “comigo ninguém pode”, do “eu sou imbatível”. O perverso terá dificuldade de disfarçar seu prazer sádico. O paranoico consolidará suas teorias persecutórias. O psicótico se verá tomado de sentimentos desagregadores. Em ocasiões desestabilizadoras, como dito, a pessoa recua e hipertrofia seus sintomas mais habituais. É um mau tratamento do terror. 

O que podemos almejar? Um duplo movimento: de um lado, no que é passível de compreensão, ganhar terreno sobre o terror invasivo transformando-o em um medo racional e objetivo. É o trabalho que médicos e profissionais de saúde estão fazendo. Que ninguém pense que do terror virá uma grande alegria. Bobagem. Se vier o medo, já teremos um caminho mais trilhável. De outro, uma vez que o incompleto e a surpresa não vão desaparecer, é de se esperar um aumento da solidariedade humana, no momento em que um vírus desmascara nossa fragilidade constitutiva comum. O “eu preciso de você” é universal e não local.

O que pode nos preocupar? Que esse momento de confiança no laço social seja abalado pelo desprezo de uma civilização que nos maltrata com suas respostas ruins, no limite, com a possibilidade da fome e da morte. Aí, se isso ocorrer, o terror se consolidará.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Calendário

Não, o ano ainda não acabou!

Em meio à letargia de fim de ano, um chamado à consciência: os últimos dias de 2024 são uma oportunidade valiosa de ressignificar trajetórias e construir propósito.

Gestão de Pessoas
Conheça o conceito de Inteligência Cultural e compreenda os três pilares que vão te ajudar a trazer clareza e compreensão para sua comunicação interpessoal (e talvez internacional)

Angelina Bejgrowicz

4 min de leitura
Liderança
Entenda como construir um ambiente organizacional que prioriza segurança psicológica, engajamento e o desenvolvimento genuíno das equipes.

Athila Machado

6 min de leitura
Empreendedorismo
Após a pandemia, a Geração Z que ingressa no mercado de trabalho aderiu ao movimento do "quiet quitting", realizando apenas o mínimo necessário em seus empregos por falta de satisfação. Pesquisa da Mckinsey mostra que 25% da Geração Z se sentiram mais ansiosos no trabalho, quase o dobro das gerações anteriores. Ambientes tóxicos, falta de reconhecimento e não se sentirem valorizados são alguns dos principais motivos.

Samir Iásbeck

4 min de leitura
Empreendedorismo
Otimizar processos para gerar empregos de melhor qualidade e remuneração, desenvolver produtos e serviços acessíveis para a população de baixa renda e investir em tecnologias disruptivas que possibilitem a criação de novos modelos de negócios inclusivos são peças-chave nessa remontagem da sociedade no mundo

Hilton Menezes

4 min de leitura
Finanças
Em um mercado cada vez mais competitivo, a inovação se destaca como fator crucial para o crescimento empresarial. Porém, transformar ideias inovadoras em realidade requer compreender as principais fontes de fomento disponíveis no Brasil, como BNDES, FINEP e Embrapii, além de adotar uma abordagem estratégica na elaboração de projetos robustos.

Eline Casalosa

4 min de leitura
Empreendedorismo
A importância de uma cultura organizacional forte para atingir uma transformação de visão e valores reais dentro de uma empresa

Renata Baccarat

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Em meio aos mitos sobre IA no RH, empresas que proíbem seu uso enfrentam um paradoxo: funcionários já utilizam ferramentas como ChatGPT por conta própria. Casos práticos mostram que, quando bem implementada, a tecnologia revoluciona desde o onboarding até a gestão de performance.

Harold Schultz

3 min de leitura
Gestão de Pessoas
Diferente da avaliação anual tradicional, o modelo de feedback contínuo permite um fluxo constante de comunicação entre líderes e colaboradores, fortalecendo o aprendizado, o alinhamento de metas e a resposta rápida a mudanças.

Maria Augusta Orofino

3 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A Inteligência Artificial, impulsionada pelo uso massivo e acessível, avança exponencialmente, destacando-se como uma ferramenta inclusiva e transformadora para o futuro da gestão de pessoas e dos negócios

Marcelo Nóbrega

4 min de leitura
Liderança
Ao promover autonomia e resultados, líderes se fortalecem, reduzindo estresse e superando o paternalismo para desenvolver equipes mais alinhadas, realizadas e eficazes.

Rubens Pimentel

3 min de leitura