O último South by Southwest (SXSW), um dos maiores festivais de inovação do mundo, trouxe luz a um novo conceito: a saúde social — termo que, segundo a cientista social Kasley Killam, se refere à qualidade das conexões e relacionamentos das pessoas dentro e fora do ambiente de trabalho. A ideia ganha força no Brasil com a implementação da nova Norma Regulamentadora nº 1 (NR1), que começa a valer em todo o território nacional a partir de 25 de maio de 2025, com impactos diretos sobre a saúde mental e emocional dos trabalhadores, especialmente das pessoas com deficiência, parte fundamental da saúde social.
Emitida pelo Ministério do Trabalho e Previdência, a NR1 estabelece diretrizes sobre segurança e saúde no trabalho, e foi atualizada com foco na prevenção de riscos psicossociais. Entre as exigências, destacam-se a obrigatoriedade de implementação do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) e do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), instrumentos que passam a integrar a rotina das empresas de forma sistemática.
Ao contrário do que ocorria até então, a saúde mental dos trabalhadores passa a ser objeto formal de atenção das organizações. A NR1 exige que sejam avaliados riscos como assédio moral, sobrecarga emocional, discriminação e capacitismo. Isso significa que situações como falta de acessibilidade, ausência de suporte, isolamento de profissionais com deficiência ou invisibilização de suas competências não podem mais ser tratadas apenas como questões culturais, mas como riscos à integridade psicossocial dos colaboradores. É um benefício à inclusão.
O cronograma de implementação da NR1 prevê três fases:
- Fase de preparação (dez/2024): diagnóstico inicial, planejamento de ações e capacitação de equipes;
- Fase de implementação (jan a abr/2025): execução das mudanças, ajustes e treinamentos;
- Fase de consolidação (a partir de maio/2025): monitoramento contínuo e melhorias.
Empresas que não cumprirem o prazo podem sofrer penalidades administrativas, financeiras e até ter suas atividades suspensas, além de impactos na imagem e reputação.
No caso da inclusão de pessoas com deficiência, a urgência da regulamentação se justifica. De acordo com a pesquisa “Radar da Inclusão: mapeando a empregabilidade de Pessoas com Deficiência”, realizada em 2023, 84% dos profissionais com deficiência afirmaram ter sua saúde mental afetada por ações capacitistas no ambiente corporativo. Entre os relatos mais frequentes estão comentários ofensivos (75%), discriminação por superiores (64%), desqualificação (51%) e falta de promoção (49%).
Dessas pessoas, apenas 35% relataram os episódios à empresa. Dentre os que não denunciaram, os principais motivos foram medo de retaliação ou demissão (38%) e descrença de que algo mudaria (29%).
Com a NR1, as empresas precisarão ir além da diversidade por conveniência. Será necessário comprovar, por meio de indicadores e ações, que o ambiente de trabalho está estruturado para acolher, desenvolver e preservar a saúde integral de todos os colaboradores. Isso inclui capacitação de lideranças, avaliação constante dos fatores psicossociais, revisão de metas e adaptação de funções com base na realidade de cada profissional. Mais que nunca, aqueles investimentos na cultura de inclusão, em ações para aumentar a inclusão além da contratação, vão se justificar. Quem não fez está atrasado.
Os investimentos em DE&I passam a ser essenciais para a conformidade legal e a sustentabilidade dos negócios. Serão também argumentos imbatíveis para comprovar à fiscalização a qualidade dessa inclusão, além da quantidade.
A NR1 marca, portanto, o início de uma nova era no mercado de trabalho brasileiro — uma era em que cuidar da saúde social das pessoas é não só desejável, mas obrigatório. Ao promover ambientes justos, empáticos e acessíveis, as empresas aumentam sua capacidade de inovação, atraem e retêm talentos diversos, e constroem um clima organizacional mais saudável e produtivo.