Estratégia e Execução

Tudo tem de ficar à vista

Compartilhar:

Mesmo que pareça um caos, o novo design organizacional é disciplinado. Mas exige transparência máxima | POR PEDRO WAENGERTNER
—————————————————————————————————————————–

Trabalhar de forma ágil pode parecer algo mais desorganizado ecaótico à primeira vista. Isso não poderia estar mais longe da realidade. Trabalhar dessa maneira exige muito mais disciplina ecapacitação do time do que os métodos tradicionais. A principalrazão é a extrema transparência que tal forma de trabalho exige.Geralmente, duas coisas estão à vista de todos em uma estrutura como essa: o andamento do trabalho e as metas a serem atingidas. Ter as metas e o progresso na parede é a regra nesse tipo de organização. Isso faz com que o time não tire os olhos do resultado e seja muito mais produtivo. Não é raro as pessoas de baixa performance serem pressionadas pela própria equipe para melhorar a sua contribuição ao todo. A ferramenta de acompanhamento do progresso mais comum é o Kanban, que teve origem na Toyota, nos anos 1960. Trata-se de uma ferramenta visual para acompanhar oprogresso. Ela geralmente mostra tudo que precisa ser feito, o que efetivamente está sendo feito e o que está pronto em cada _sprint_. Com times distribuídos e necessidades cada vez mais complexas, grande parte das empresas utiliza softwares para acompanhamento das tarefas e armazenamento das informações relativas aos projetos. Esses softwares permitem análises em tempo real das atividades e identificação de gargalos.

#### TIRANDO OS OBSTÁCULOS DO CAMINHO

A liderança é fundamental para implementar qualquer tipo de estrutura que utilize métodos diferentes de trabalho. Não se tra- ta apenas da mudança do método de trabalho, mas principalmente da forma de pensar desse grupo de pessoas. Há pouco tempo, fui chamado para conhecer a estrutura de esquadrões de uma empresa que tinha recebido o  conselho  de uma consultoria para trabalhar desse jeito. Chegando lá, encontrei as pessoas organizadas em grupos, sentadas em uma grande sala comum.As semelhanças com a estrutura de squads terminavam por aí. Conversando com alguns dos líderes, só percebi medo, pressão da diretoria e pouca flexibilidade para errar. Também entendi que o método não estava sendo efetivamente executado. Faltava autonomia e sobrava ingerência dos altos executivos da empresa sobre cada teste que seria realizado. A tolerância ao erro, fundamental quando se opta por um método ágil de trabalho, estava longe de ser um arealidade. Sentando com os times, questionei sobre seus objetivos.Não estavam claros. Eles não entendiam o motivo da mudança no método de trabalho. Voltando para a diretoria, pedi que me explicassem os motivos para que os times se organizassem daquela forma. O diretor me apresentou um denso relatório, feito por uma consultoria, mostrando que as empresas mais inovadoras do mundo trabalhavam assim e que, se eles quisessem inovar, também deveriam atuar desse modo. Questionei se algum dos diretores tinha trabalhado em algum dos esquadrões ou acompanhado as atividades no dia a dia, mas nenhum deles tinha se aproximado dos times nesse processo. A frustração era geral. Os diretores não entendiam por que os resultados não apareciam, e os integrantes dos squads estavam inseguros e se achando incompetentes. Expliquei para a diretoria que o trabalho deles era crítico naquele momento de mudança e que os resultados dessa nova forma de trabalhar não vinham do dia pra noite. Era fundamental a experimentação  e o erro para que todos pudessem entender o que funciona no contexto daquela empresa, especificamente. A liderança, em um processo ágil, é um dos maiores fatores para determinar o sucesso das iniciativas. Não se delega para outras pessoas uma mudança dessa magnitude. Os líderes precisam estar nas trincheiras, dando exemplo e se relacionando com os times. Precisam sair das suas salas, fazer perguntas e adaptar o processo sempre que necessário, caso não esteja funcionando. E não se faz isso olhando relatórios. No modelo ágil, o líder precisa garantir que:

* A metodologia esteja clara para todos os envolvidos.
* Todo o time esteja capacitado para executar suas atividades e entender o porquê das mudanças;
* Exista um processo claro para melhoria do método.
* As pedras no caminho sejam removidas, deixando  o  time livre para realizar o seu trabalho de forma efetiva.
* Haja um grande alinhamento entre os líderes dos squads.

Uma das primeiras dificuldades na implementação desse modelo é o embate com a maneira de pensar dos profissionais envolvidos no projeto. Durante anos, esses profissionais foram ensinados a trabalhar de determinada maneira, seguindo deter- minados parâmetros. Estão condicionados a pensar apenas nas próprias atividades. A correlação entre o que fazem e os resultados da companhia nunca foi tão direta. O modo de interagir com seus colegas também muda consideravelmente. Em vez da tradicional política corporativa e de conversas de corredor, os profissionais precisam resolver problemas conjuntamente. Parece algo óbvio, mas não é. E pode gerar muita ansiedade entre os participantes. De um dia para o outro, as pessoas, que tinham claramente as suas atividades estabelecidas, passam a trabalhar em um am- biente repleto de complexidade e ambiguidade. Lembra-me daqueles documentários em que o animal é criado em cativeiro a vida toda e, um belo dia, os cientistas vão até a natureza e abrem a gaiola. Em vez de sair correndo para o mato, várioscontinuam dentro da gaiola. Esta é basicamente a sensação da maior parte das pessoas envolvidas em transições como essa.Em vez de ale- gria e vontade de inovar, os primeiros sentimentos são o medo e a insegurança. Para lidar com essa transição, além de estabelecermos expectativas realistas em relação aos resultados, é fundamental que ajudemos as pessoas na condução de suas rotinas diárias. Os líderes devem deixar o trabalho mais claro, no início, com atividades simples e objetivas. Com o passar do tempo, após alguns _sprints_, os times naturalmente passarão a ser mais criativos e buscar novas soluções.

* * *

  ![Pedro1](https://s3.amazonaws.com/paco-dev/2018/10/Pedro1-321×380.jpg)Pedro Waengertner é empreendedor serial, sócio-fundador da aceleradora de startups Ace, professor da ESPM-SP e autor de _A estratégia da inovação radical_(ed. Gente), no qual este artigo se baseia.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Organização

A difícil arte de premiar sem capitular

Desde Alfred Nobel, o ato de reconhecer os feitos dos seres humanos não é uma tarefa trivial, mas quando bem-feita costuma resultar em ganho reputacional para que premia e para quem é premiado

Inovação
O SXSW 2025 transformou Austin em um laboratório de mobilidade, unindo debates, testes e experiências práticas com veículos autônomos, eVTOLs e micromobilidade, mostrando que o futuro do transporte é imersivo, elétrico e cada vez mais integrado à tecnologia.

Renate Fuchs

4 min de leitura
ESG
Em um mundo de conhecimento volátil, os extreme learners surgem como protagonistas: autodidatas que transformam aprendizado contínuo em vantagem competitiva, combinando autonomia, mentalidade de crescimento e adaptação ágil às mudanças do mercado

Cris Sabbag

7 min de leitura
Gestão de Pessoas
Geração Beta, conflitos ou sistema defasado? O verdadeiro choque não está entre gerações, mas entre um modelo de trabalho do século XX e profissionais do século XXI que exigem propósito, diversidade e adaptação urgent

Rafael Bertoni

0 min de leitura
Empreendedorismo
88% dos profissionais confiam mais em líderes que interagem (Edelman), mas 53% abandonam perfis que não respondem. No LinkedIn, conteúdo sem engajamento é prato frio - mesmo com 1 bilhão de usuários à mesa

Bruna Lopes de Barros

0 min de leitura
ESG
Mais que cumprir cotas, o desafio em 2025 é combater o capacitismo e criar trajetórias reais de carreira para pessoas com deficiência – apenas 0,1% ocupam cargos de liderança, enquanto 63% nunca foram promovidos, revelando a urgência de ações estratégicas além da contratação

Carolina Ignarra

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
O SXSW revelou o maior erro na discussão sobre IA: focar nos grãos de poeira (medos e detalhes técnicos) em vez do horizonte (humanização e estratégia integrada). O futuro exige telescópios, não lupas – empresas que enxergarem a IA como amplificadora (não substituta) da experiência humana liderarão a disrupção

Fernanda Nascimento

5 min de leitura
Liderança
Liderar é mais do que inspirar pelo exemplo: é sobre comunicação clara, decisões assertivas e desenvolvimento de talentos para construir equipes produtivas e alinhada

Rubens Pimentel

4 min de leitura
ESG
A saúde mental no ambiente corporativo é essencial para a produtividade e o bem-estar dos colaboradores, exigindo ações como conscientização, apoio psicológico e promoção de um ambiente de trabalho saudável e inclusivo.

Nayara Teixeira

7 min de leitura
Empreendedorismo
Selecionar startups vai além do pitch: maturidade, fit com o hub e impacto ESG são critérios-chave para construir ecossistemas de inovação que gerem valor real

Guilherme Lopes e Sofia Szenczi

9 min de leitura
Empreendedorismo
Processos Inteligentes impulsionam eficiência, inovação e crescimento sustentável; descubra como empresas podem liderar na era da hiperautomação.

Tiago Amor

6 min de leitura