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Um algoritmo para medir a cultura organizacional

Em tempos em que até modelos de negócio dependem de cultura organizacional, esta se tornou uma das principais amigas – ou inimigas – das empresas
Louis Burlamaqui é CEO da Taigéta Tech, especialista em cultura organizacional e autor. Carla Kuchenbecker é matemática, cientista de dados e CTO da Taigéta Tech.

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Foi no início da década de 1980 que a temática se tornou objeto de investigação científica. Na época, o excelente desempenho das empresas japonesas e a motivação dos trabalhadores, interligada ao envolvimento deles com os valores e a filosofia das organizações, eram considerados como fatores responsáveis pelo sucesso de diversas corporações nipônicas frente às norte-americanas.

Pesquisadores procuraram, então, buscar modelos e teorias que pudessem explicar o bom desempenho das empresas japonesas. As primeiras pesquisas comparavam as estruturas formais destas com as organizações ocidentais.

Hoje, o maior volume de pesquisas sobre cultura organizacional se concentra no paradigma funcionalista. No entanto, acreditamos que isso não seja mais suficiente ante o volume crescente de mudanças sociais. A complexidade de interações e influências dentro de uma organização exige uma visão bem mais holística de cultura.

## Uma metodologia, um algoritmo
Em 2020, após alguns anos de estudos, trouxemos ao mercado um modelo próprio de pesquisa que utiliza algoritmos para transformar fenômenos sociais em dados numéricos que traduzem comportamentos. Esse modelo se fundamenta em dois autores bastante conhecidos no mundo da cultura organizal: Edgar Schein e Geert Hofstede.

Resumidamente, Schein diz que cultura organizacional é o conjunto de pressu-
postos básicos que um grupo inventou, descobriu ou desenvolveu, ao aprender como lidar com problemas de adaptação externa e de integração interna.

Já Hofstede define cultura como uma programação coletiva do pensamento que distingue os membros de um grupo de outros, ou as diferenças entre as pessoas, e apresenta o célebre diagrama da cebola, que trabalha com valores e práticas. Os valores, parte mais interna da cebola, representam as manifestações invisíveis da cultura; eles sustentam a cultura nas organizações. Já as práticas organizacionais englobam todas as atividades vinculadas ao interesse da organização ou dos funcionários, fundamentadas em ritos, cerimônias, histórias, mitos, normas etc.

Nosso algoritmo pesquisa os comportamentos coletivos percebidos e os relaciona com oito vetores culturais em suas polaridades positiva e negativa: segurança, ordem, autoridade, resultado, acolhimento, propósito, aprendizado e prazer. Isso reflete quatro modelos de cultura conforme o que priorizam: a regra, o mercado, o relacionamento, a inovação. (Toda organização tende a ter os quatro modelos, mas um costuma preponderar.) O algoritmo permite mapear os comportamentos que devem ser incentivados e aqueles que são “contaminações” e precisam ser tratados para que a cultura evolua e agregue valor e sustentabilidade ao negócio.

A pesquisa com algoritmo tem gerado índices de adesão dos funcionários acima de 90%. No caso da Mart Minas, maior empresa de atacarejo de Minas Gerais e 11ª no ranking nacional, 100% dos 8 mil funcionários de mais de 50 lojas aderiram ao processo. Em 20 dias, o estudo estava feito.

São mapeadas não só a cultura da empresa, mas também o mindset cultural das principais lideranças e as diversas subculturas presentes – um erro constante na gestão de cultura é não levar em conta o fato de que uma área financeira tem características distintas das de um setor de vendas, por exemplo. Isso proporciona um diagnóstico integrado que possibilita agir com precisão cirúrgica: funções e disfunções são reveladas em números. Vale dizer que o algoritmo “limpa a base”, eliminando eventuais tentativas de sabotagem nas respostas; a margem de erro fica insignificante.

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## Plano de ação e aplicações
Depois de quantificar os comportamentos, e tendo identificado o modelo de cultura ideal para o negócio, é possível começar a redesenhar a identidade organizacional. Isso pode ser feito por meio de um Plano de Desenvolvimento da Cultura Organizacional (PDCO). Os planos de ação de cultura são diferentes de ações de desdobramento de um plano estratégico. Um PDCO é feito em quatro movimentos que envolvem identidade organizacional, modelo de liderança, alinhamento estrutural e gestão da cultura com foco em aprendizagem, comunicação e follow-up. Um erro das organizações é tratar cultura como branding e plano de comunicação; cultura é pura gestão, precisa de metodologia, estratégia com pessoas e padrões coletivos sociais. A seguir mostramos dois cases de PDCOs.

“Cultura é mais importante que estratégia”
É o que dizem, em pesquisa, 66% dos líderes do c-level e boards

Passado o auge da incerteza pandêmica, a PwC realizou um estudo global sobre a cultura nas empresas em 2021 e pediu para 3,2 mil pessoas de mais de 40 países que olhassem para as suas experiências durante esse momento de crise em busca de lições aprendidas.

O resultado foi que, para a maioria dos entrevistados, o elemento que mais influenciou a conquista de bons resultados nos negócios naquele período foi ter uma cultura forte. De acordo com as informações, as empresas que se mostraram mais ágeis e resilientes no auge da pandemia foram aquelas que mais investiram na cultura organizacional. E também foram as organizações mais propensas a obter aumento de receita e incremento da satisfação de clientes e de funcionários. Tal impacto fez com que 66% dos executivos C-level e conselheiros considerassem a cultura mais importante para o desempenho que a estratégia ou o modelo operacional da organização.

Visão da liderança – O valor da cultura como diferencial de negócio é ainda mais acentuado junto às lideranças. Dos líderes seniores que participaram do estudo, 69% consideraram que ela foi responsável por boa parte do sucesso de suas organizações em um período em que foi preciso fazer grandes mudanças e adaptações.

Frente aos desafios contínuos de transformação digital, de inovação, dos novos formatos de trabalho e da necessidade de retenção dos talentos, ter uma cultura forte pode ser uma vantagem competitiva. Para 72% dos entrevistados que fazem parte da alta direção, a cultura corporativa colabora para que processos de mudança sejam bem-sucedidos.

No entanto, o estudo mostrou que há uma lacuna no campo de diversidade, equidade e inclusão (DEI), provocada por um desalinhamento de percepções entre colaboradores e líderes. Enquanto as lideranças empresariais acreditam que representam a cultura, os valores e o propósito da organização, muitos dos profissionais entrevistados dizem que os locais de trabalho são pouco inclusivos, com pouco espaço para opiniões divergentes e delicadas, e não acolhe pessoas com necessidades diferentes.

Facilitadores culturais – A pesquisa global da PwC indicou que a cultura se torna uma vantagem competitiva e influencia a capacidade de adaptação da empresa a partir do momento em que pelo menos quatro dos principais facilitadores de mudança cultural são ativados na empresa. O grupo é formado por nove elementos: (1) o exemplo vem de cima; (2) tecnologia e ferramentas; (3) incentivos, remuneração e benefícios; (4) treinamento e desenvolvimento; (5) comunicação formal; (6) redes de profissionais; (7) redes de engajamento; (8) feedback coletado e aplicado; e (9) sinais visíveis vindos das lideranças.

Entre as recomendações para que uma organização potencialize a cultura como diferencial de negócio, o primeiro passo é avaliar se a ela está ajudando ou dificultando a capacidade de gerar resultados. Deve-se verificar, no processo de análise, quais características e comportamentos devem ser trabalhados para sustentar os objetivos estratégicos. Feito o diagnóstico, deve-se adotar um processo proativo, gerenciando a cultura de forma intencional, atuando sobre comportamentos fundamentais para estabelecer novos paradigmas na organização.

(Redação HSM Management)

## Case ArcelorMittal Sistemas
Em 2020, a empresa de tecnologia ArcelorMittal Sistemas, que faz parte da maior siderúrgica do mundo, a ArcelorMittal, contratou nossa análise com algoritmo de cultura. Como diz a diretora-presidente da empresa e head de demandas de tecnologia da informação em serviços compartilhados, Kelly Christian Camelo Teixeira, a organização estava buscando ser mais ágil, mais conectada e inovadora. Haviam começado a trabalhar com as metodologias ágeis em 2018, mas sentiam parados nos ritos, sem conseguir gerar avanços e inovações na velocidade necessária. Questionaram: O que será que está travando a equipe? A cultura?

A empresa iniciou uma investigação com o algoritmo de cultura em julho de 2020. O mapeamento foi realizado com 84% dos funcionários por meio de um processo automatizado. Os resultados mostraram a existência de um conjunto de culturas na ArcelorMittal Sistemas, deram clareza ao que puxava aquela equipe para baixo, ao que impedia o seu desenvolvimento e ressaltaram as qualidades que precisavam ser estimuladas.

Com base no resultado, a empresa redesenhou a identidade organizacional levando em conta particularidades funcionais. E cada setor-chave traçou metas de cultura com indicadores e planos de ação integrados. (A reformulação do plano estratégico a partir da adoção da metodologia de OKRs ajudou.)

Para diminuir a força do comportamento identificado que puxava os colaboradores para baixo – e, assim, travava as ações inovadoras –, a empresa criou uma comunidade de práticas interna, a AgileMinds, para identificar gargalos e fomentar o mindset ágil. Uma das inovações foi a criação de um podcast, de cuja curadoria os funcionários participam. Eles selecionam, todos os meses, temas de interesse, e convidam colegas ou alguém de fora para participar.

Para aumentar a autonomia, como era desejável, foram desenvolvidas ações junto aos gestores e um trabalho processual com os subordinados.

Tudo isso estava invisível e veio à tona. “A pesquisa do algoritmo foi como jogar luz no invisível”, define Teixeira.

Após um ano de reformulação da cultura, a ArcelorMittal Sistemas realizou nova pesquisa de cultura para medir sua evolução. No segundo estudo, foi constatado que todos os números e metas de cultura avançaram.

## Case Banco Semear
Empresa do grupo Seculus, o Banco Semear também abraçou o algoritmo de
cultura para redefinir sua identidade organizacional. A head de recursos huma-
nos do banco, Lílian Lúcia Leão de Azevedo Pessoa, conta o que a equipe percebia: apesar de os cargos de liderança estarem alinhados, a empresa não caminhava para o mesmo lugar. Os resultados não vinham, e não era por falta de vontade.

O resultado indicou que, apesar de a instituição prezar muito pelo relacionamento, faltava turbinar o fator inovação. Isso levou o Semear a fazer uma revisão da visão, missão e valores do banco. A partir daí, a instituição delineou o que pretendia desenvolver e o que precisava ser feito em cada uma das áreas.

TEMOS UM DIAGNÓSTICO BASEADO EM DADOS sobre a cultura organizacional brasileira? Tendo aplicado nosso algoritmo a mais de 15 mil pessoas, conseguimos dizer que, em nossa amostra, os modelos culturais voltados para a regra e competitividade são até 16 pontos percentuais mais presentes do que o modelo de cultura da inovação {esses e outros dados podem ser checados nos gráficos deste artigo}.

Conseguimos dizer também que a razão pela qual há tantos propósitos e valores desconectados de culturas é a falta de dados. A cultura deve se traduzir em dados para ser relevante e fazer sentido. E para que as melhores decisões sejam tomadas.

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