Liderança

Basta de gestores! Precisamos de líderes

Gestão e liderança são completamente diferentes. É preciso distinguir esses dois conceitos para que não haja equívocos. Mas, para isso, também deve-se fazer uma distinção entre recursos e humanos
Antonio Werneck é fundador e CEO da Makesense Ltda. Foi CEO, entre outras, da Reckitt Benckiser, Santher e Bombril, além de conselheiro da Cia. Muller de Bebidas e J. Macêdo.

Compartilhar:

Há, como se sabe, uma enorme diferença entre gestão e liderança. Entender essa distinção é fundamental para que um líder verdadeiro possa criar organizações prósperas e longevas. Não distinguir esses conceitos pode levar a grandes equívocos. Mas será que todos entendem, de fato, essa distinção?

Quando alguém começa a ter responsabilidade pela condução de uma equipe, já não bastam mais os conhecimentos técnicos ou mesmo habilidades de comunicação, persuasão e influência. Nesse momento, abrem-se as portas de uma longa jornada de aprendizagem, onde o exercício de liderança se torna uma combinação entre técnica e “arte”.

Técnica, pois há um arsenal de conhecimentos em micro desenvolvimento organizacional que podem ser adquiridos em livros, seminários, cursos, workshops e treinamentos gerenciais.

Arte, pois a assimilação e aplicação desse conhecimento se dá de forma empírica e, muitas vezes, intuitiva, em que o espaço entre uma decisão certa ou errada se torna uma zona cinzenta, quando não nebulosa.

E é nessa combinação entre técnica e arte que se definirá um gestor ou um líder.
Para entender isso, contudo, há que se fazer uma distinção entre dois outros conceitos: recursos e humanos.

Pessoalmente, nunca gostei do termo “recursos humanos”. Além de remeter à uma época em que o trabalho (humano) era apenas um meio de produção, como capital, tecnologia, propriedade intelectual etc., para mim, ele encapsula uma visão muito estreita do que o ser humano representa no processo de geração de riqueza em uma empresa.

Longe de querer entrar em questões ideológicas ou tayloristas, afirmo que recursos são inertes, tais como matérias-primas, estoques, máquinas, equipamentos, fluxo de caixa, ativos e passivos. Recursos, portanto, devem ser geridos. Apenas isso.

Já os humanos são de outra natureza: volátil, sensível, frágil e, muitas vezes, imprevisível. São os humanos que ativam os recursos inertes, sem os quais nada seria produzido e nenhuma riqueza gerada. Humanos, portanto, devem ser “liderados” e não “geridos”.

A diferença não é semântica. O líder reconhece e vê o humano não como recurso, mas como elemento complexo e multifacetado – individual e coletivamente – na condução de qualquer organização.

E aqui reside a chave de uma questão mais profunda: qual a cosmovisão subjacente, consciente ou não, que define um líder e o diferencia de um gestor? Esse, me parece, é o ponto fulcral dessa questão.

A maneira como ele ou ela vê as pessoas de seu time definirá se é um líder ou apenas… um gestor. Um lidera pessoas; o outro gerencia recursos.

Não há que se subverter a lógica econômica que rege a existência e o funcionamento de uma empresa com fins lucrativos; há, sim, que se explicitar a forma como aqueles que as lideram olham para o mundo *lato sensu* e para as pessoas, especificamente. O líder, portanto, transcende o gestor. Ele vai além.

Há executivos e acionistas que entendem que a força de trabalho só responde à uma lógica do *homo economicus*, onde apenas o incentivo financeiro é que produz respostas satisfatórias. Nada poderia ser mais estreito e ultrapassado, ainda que muitos modelos organizacionais se construíram nesse paradigma.

Líderes reconhecem seu time como sendo constituído por *homo sapiens* e que, como eles mesmos, é infinitamente mais complexo e multidimensional.

Se a organização se move apenas pelo lucro, bastam gestores de *homo economicus* e sistemas de incentivos financeiros de curto e longo prazos bem montados.

Se, contudo, a organização (e seu líder) entender verdadeiramente que seu contrato social implica no reconhecimento de que (i) a empresa é uma célula que compõe o tecido de uma cadeia de valor: (ii) que várias empresas de um setor constituem, por sua vez, um órgão cuja função econômico-social e compõem um ecossistema na economia; e (iii) que todos os ecossistemas econômico-sociais somados formam o organismo socioeconômico da nação, é preciso ir mais além, e já não bastam gestores: é preciso líderes que têm que agir como homo sapiens, e reconhecer seus colaboradores como tal.

Por isso, digo: basta de gestores! Precisamos de líderes, se quisermos construir organizações mais saudáveis e longevas, uma economia mais resiliente e, por que não, uma sociedade mais justa.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Organização

A difícil arte de premiar sem capitular

Desde Alfred Nobel, o ato de reconhecer os feitos dos seres humanos não é uma tarefa trivial, mas quando bem-feita costuma resultar em ganho reputacional para que premia e para quem é premiado

ESG
No mundo corporativo, onde a transparência é imperativa, a Washingmania expõe a desconexão entre discurso e prática. Ser autêntico não é mais uma opção, mas uma necessidade estratégica para líderes que desejam prosperar e construir confiança real.

Marcelo Murilo

8 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo onde as empresas têm mais ferramentas do que nunca para inovar, por que parecem tão frágeis diante da mudança? A resposta pode estar na desconexão entre estratégia, gestão, cultura e inovação — um erro que custa bilhões e mina a capacidade crítica das organizações

Átila Persici

0 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A ascensão da DeepSeek desafia a supremacia dos modelos ocidentais de inteligência artificial, mas seu avanço não representa um triunfo da democratização tecnológica. Embora promova acessibilidade, a IA chinesa segue alinhada aos interesses estratégicos do governo de Pequim, ampliando o debate sobre viés e controle da informação. No cenário global, a disputa entre gigantes como OpenAI, Google e agora a DeepSeek não se trata de ética ou inclusão, mas sim de hegemonia tecnológica. Sem uma governança global eficaz, a IA continuará sendo um instrumento de poder nas mãos de poucos.

Carine Roos

5 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A revolução da Inteligência Artificial está remodelando o mercado de trabalho, impulsionando a necessidade de upskilling e reskilling como estratégias essenciais para a competitividade profissional. Empresas como a SAP já investem pesadamente na requalificação de talentos, enquanto pesquisas indicam que a maioria dos trabalhadores enxerga a IA como uma aliada, não uma ameaça.

Daniel Campos Neto

6 min de leitura
Marketing
Empresas que compreendem essa transformação colhem benefícios significativos, pois os consumidores valorizam tanto a experiência quanto os produtos e serviços oferecidos. A Inteligência Artificial (IA) e a automação desempenham um papel fundamental nesse processo, permitindo a resolução ágil de demandas repetitivas por meio de chatbots e assistentes virtuais, enquanto profissionais se concentram em interações mais complexas e empáticas.

Gustavo Nascimento

4 min de leitura
Empreendedorismo
Pela primeira vez, o LinkedIn ultrapassa o Google e já é o segundo principal canal das empresas brasileiras. E o seu negócio, está pronto para essa nova era da comunicação?

Bruna Lopes de Barros

5 min de leitura
ESG
O etarismo continua sendo um desafio silencioso no ambiente corporativo, afetando tanto profissionais experientes quanto jovens talentos. Mais do que uma questão de idade, essa barreira limita a inovação e prejudica a cultura organizacional. Pesquisas indicam que equipes intergeracionais são mais criativas e produtivas, tornando essencial que empresas invistam na diversidade etária como um ativo estratégico.

Cleide Cavalcante

4 min de leitura
Empreendedorismo
A automação e a inteligência artificial aumentam a eficiência e reduzem a sobrecarga, permitindo que advogados se concentrem em estratégias e no atendimento personalizado. No entanto, competências humanas como julgamento crítico, empatia e ética seguem insubstituíveis.

Cesar Orlando

5 min de leitura
ESG
Em um mundo onde múltiplas gerações coexistem no mercado, a chave para a inovação está na troca entre experiência e renovação. O desafio não é apenas entender as diferenças, mas transformá-las em oportunidades. Ao acolher novas perspectivas e desaprender o que for necessário, criamos ambientes mais criativos, resilientes e preparados para o futuro. Afinal, o sucesso não pertence a uma única geração, mas à soma de todas elas.

Alain S. Levi

6 min de leitura
Carreira
O medo pode paralisar e limitar, mas também pode ser um convite para a ação. No mundo do trabalho, ele se manifesta na insegurança profissional, no receio do fracasso e na resistência à mudança. A liderança tem papel fundamental nesse cenário, influenciando diretamente a motivação e o bem-estar dos profissionais. Encarar os desafios com autoconhecimento, preparação e movimento é a chave para transformar o medo em crescimento. Afinal, viver de verdade é aceitar riscos, aprender com os erros e seguir em frente, com confiança e propósito.

Viviane Ribeiro Gago

4 min de leitura