ESG
4 min de leitura

Dor crônica e produtividade: O desafio diário no ambiente de trabalho e na vida pessoal

No texto deste mês do colunista Djalma Scartezini, o COO da Egalite escreve sobre os desafios profundos, tanto à saúde mental quanto à produtividade no trabalho, que a dor crônica proporciona. Destacando que empresas e gestores precisam adotar políticas de inclusão que levem em conta as limitações físicas e os altos custos associados ao tratamento, garantindo uma verdadeira equidade no ambiente corporativo.
É sócio e COO da Egalite, conselheiro do Instituto EY e da Handtalk, psicólogo, comunicador e docente dos MBAs de Recursos Humanos e Desenvolvimento de Gestores da FGV, professor da Fundação Dom Cabral, HSM University, Escola de Comunicação ABERJE e da Pós-graduação em Cuidados Paliativos do Hospital Sírio-Libanês. É CEO da REIS - Rede Empresarial de Inclusão Social. Representa o Brasil anualmente na conferência internacional da OIT em Genebra sobre inclusão da pessoa com deficiência e o futuro do trabalho.

Compartilhar:

Conviver com dor crônica por mais de 40 anos é um desafio que afeta não apenas o desempenho no trabalho, mas também a saúde mental e a qualidade de vida como um todo. No meu papel como psicólogo, executivo de RH, CEO da REIS e consultor reconhecido globalmente pela OIT/ONU por minha atuação na inclusão de pessoas com deficiência, a experiência pessoal com dor física moldou profundamente minha compreensão sobre produtividade e bem-estar.

Estudos recentes, como o publicado na *Revista Brasileira de Saúde Ocupacional*, demonstram que a dor física afeta significativamente a produtividade de trabalhadores com deficiências e dores crônicas. O artigo discute a esquizofrenia, mas suas conclusões se aplicam a qualquer condição física debilitante: a dificuldade em manter o foco e a capacidade reduzida de realizar tarefas complexas são apenas alguns dos desafios. Eu mesmo, como alguém que lida diariamente com a dor, vejo meu desempenho flutuar dependendo da intensidade da dor em determinado momento. Acho importante refletirmos juntos sobre o quanto a dor física é negligenciada e expressões capacitistas como “você é um exemplo de superação, você é um guerreiro” escondem na verdade o medo de pessoas sem deficiência, gestores e colegas de trabalho lidarem com o fato que não somos super-heróis.

Da mesma forma, a literatura em inglês publicada no Journal of Occupational Rehabilitation aponta como a dor crônica impõe barreiras à participação ativa no mercado de trabalho. As adaptações no ambiente de trabalho são essenciais, mas, mesmo com recursos de acessibilidade e ergonomia, apoio psicossocial, há uma limitação intrínseca na produtividade de quem convive com dor intensa.

Saúde Mental e Pessoas com Deficiência

Outro aspecto crítico, muitas vezes negligenciado, é o impacto da dor crônica na saúde mental. A pressão para manter altos níveis de produtividade, combinada com o sofrimento físico e por consequência, emocional de maneira constante, pode desencadear episódios de ansiedade e depressão. No meu caso, houve momentos em que a dor se tornou não apenas um obstáculo físico, mas também um fator que minava minha confiança e resiliência mental. Viver com níveis de dor, como dizem os médicos, de 0 a 10, perto de 10 o tempo todo é algo lancinante e por vezes tira a perspectiva e confiança no trabalho e na própria vida do foco. Ao reduzir a dor, eu reconstruo quase diariamente o foco, o ritmo, as entregas, a produtividade e a fé na própria vida em si.

A literatura reforça essa relação: o estudo da Revista Brasileira de Saúde Ocupacional explora como a saúde mental se deteriora à medida que as demandas do ambiente de trabalho se tornam insustentáveis para quem lida com condições crônicas. No contexto internacional, os dados da Disability and Rehabilitation Journal demonstram que trabalhadores com dor crônica têm mais probabilidade de desenvolver problemas psicológicos, exacerbando a dificuldade de gerenciar o próprio tempo e tarefas.

O Custo Adicional de Viver com Deficiência

A realidade de viver com deficiência não se restringe apenas à gestão da dor e da produtividade no trabalho; ela também envolve um custo de vida significativamente mais alto em comparação com pessoas sem deficiência. Estudos, como o relatório da Leonard Cheshire Disability, mostram que as despesas associadas a tratamentos terapêuticos, como fisioterapia, medicamentos, e equipamentos adaptados, elevam em até 50% o custo de vida de uma pessoa com deficiência. Além disso, um estudo do Scope no Reino Unido também revela que esse grupo gasta, em média, mais de £583 por mês (cerca de R$ 4.258,00) em serviços essenciais e terapias.

No meu caso, conviver com dor por mais de quatro décadas significa também arcar com os custos financeiros contínuos de terapias e tratamentos especializados, como fisioterapia, hidroterapia, massagens e suporte psicológico. Essa sobrecarga econômica torna a busca por equilíbrio entre saúde e produtividade ainda mais desafiadora. Empresas e gestores devem, portanto, considerar não apenas a adaptação no ambiente de trabalho, mas também a necessidade de suporte adicional para cobrir esses custos elevados, promovendo uma inclusão real e efetiva. Algumas empresas oferecem, dentro dos escritórios, fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas entre outros.

Adaptabilidade e Ações Necessárias

Ao longo dos anos, adotei uma abordagem que mistura estratégias de adaptação física, como mobiliário adequado e ergonômico, e técnicas de gerenciamento de estresse, como alongamentos e exercícios físicos. Contudo, esses métodos, por mais eficazes que sejam, oferecem apenas alívio temporário. O verdadeiro desafio está na conscientização e educação de gestores e equipes sobre a complexidade de viver com dor crônica. Um ambiente de trabalho acolhedor, aliado a uma compreensão profunda das limitações impostas pela dor, é essencial para garantir a inclusão e a participação plena de trabalhadores como eu e tantos outros.

O artigo do Journal of Occupational Rehabilitation, sugere que políticas de inclusão que envolvam não apenas ajustes físicos, mas também apoio emocional e mental, são cruciais para melhorar a qualidade de vida e a produtividade. Isso reflete minha própria experiência: a combinação de suporte multidisciplinar é o que me permite seguir em frente, apesar dos desafios diários.

Reflexões Finais

A dor crônica é uma realidade complexa e multifacetada. A experiência de viver com dor afeta não apenas a produtividade no trabalho, mas também a saúde mental e a qualidade de vida em todos os aspectos. Tanto a literatura nacional quanto a internacional oferecem uma base sólida para entender e abordar esses desafios, mas ainda há muito a ser feito. A minha própria jornada, de mais de quatro décadas convivendo com dor, continua a ser uma mistura de aprendizado, resiliência e, acima de tudo, a busca constante por soluções que promovam o bem-estar e a inclusão.

Compartilhar:

É sócio e COO da Egalite, conselheiro do Instituto EY e da Handtalk, psicólogo, comunicador e docente dos MBAs de Recursos Humanos e Desenvolvimento de Gestores da FGV, professor da Fundação Dom Cabral, HSM University, Escola de Comunicação ABERJE e da Pós-graduação em Cuidados Paliativos do Hospital Sírio-Libanês. É CEO da REIS - Rede Empresarial de Inclusão Social. Representa o Brasil anualmente na conferência internacional da OIT em Genebra sobre inclusão da pessoa com deficiência e o futuro do trabalho.

Artigos relacionados

Há um fio entre Ada Lovelace e o CESAR

Fora do tempo e do espaço, talvez fosse improvável imaginar qualquer linha que me ligasse a Ada Lovelace. Mais improvável ainda seria incluir, nesse mesmo

Marketing
Entenda por que 90% dos lançamentos fracassam quando ignoram a economia comportamental. O Nobel Daniel Kahneman revela como produtos são criados pela lógica, mas comprados pela emoção.

Priscila Alcântara

8 min de leitura
Liderança
Relatórios do ATD 2025 revelam: empresas skills-based se adaptam 40% mais rápido. O segredo? Trilhas de aprendizagem que falam a língua do negócio.

Caroline Verre

4 min de leitura
Liderança
Por em prática nunca é um trabalho fácil, mas sempre é um reaprendizado. Hora de expor isso e fazer o que realmente importa.

Caroline Verre

5 min de leitura
Inovação
Segundo a Gartner, ferramentas low-code e no-code já respondem por 70% das análises de dados corporativos. Entenda como elas estão democratizando a inteligência estratégica e por que sua empresa não pode ficar de fora dessa revolução.

Lucas Oller

6 min de leitura
ESG
No ATD 2025, Harvard revelou: 95% dos empregadores valorizam microcertificações. Mesmo assim, o reskilling que realmente transforma exige 3 princípios urgentes. Descubra como evitar o 'caos das credenciais' e construir trilhas que movem negócios e carreiras.

Poliana Abreu

6 min de leitura
Empreendedorismo
33 mil empresas japonesas ultrapassaram 100 anos com um segredo ignorado no Ocidente: compaixão gera mais longevidade que lucro máximo.

Poliana Abreu

6 min de leitura
Liderança
70% dos líderes não enxergam seus pontos cegos e as empresas pagam o preço. O antídoto? Autenticidade radical e 'Key People Impact' no lugar do controle tóxico

Poliana Abreu

7 min de leitura
Liderança
15 lições de liderança que Simone Biles ensinou no ATD 2025 sobre resiliência, autenticidade e como transformar pressão em excelência.

Caroline Verre

8 min de leitura
Liderança
Conheça 6 abordagens práticas para que sua aprendizagem se reconfigure da melhor forma

Carol Olinda

4 min de leitura
Cultura organizacional, Estratégia e execução
Lembra-se das Leis de Larman? As organizações tendem a se otimizar para não mudar; então, você precisa fazer esforços extras para escapar dessa armadilha. Os exemplos e as boas práticas deste artigo vão ajudar

Norberto Tomasini

4 min de leitura